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1. As redes de investigação
e a translação do conhecimento
Há uma variedade de redes, de atividade industrial (ou
clus-
ters
), redes sociais ou humanas, não-governamentais e redes
de pesquisa. Estas últimas referem-se a uma estrutura orga-
nizacional em que as pessoas ou instituições e outras entida-
des interagem (Cressman
et al
2009a). Dentro da rede, os
membros estabelecem interligações múltiplas (formais e/
ou informais) num ambiente com diversas possibilidades de
atividades interrelacionadas, quer existam ou não financia-
mentos associados (Cressman
et al
2009b).
No que se refere à geografia da ciência, esta enfrenta uma
mudança fundamental. Em todas as regiões do globo emer-
gem redes de colaboração de pesquisa, que estão num pro-
cesso de expansão (Adams 2012).
Estas estruturas de intercâmbio incluem tanto as organiza-
ções como os indivíduos e são favorecedoras da construção
de relacionamentos, da partilha de tarefas e da cooperação
mútua na resolução de problemas de interesse comum, for-
talecendo a capacidade de fazer pesquisa (IDRC 2006).
A compreensão desta estrutura complexa de atividades mul-
tifacetadas é crucial para o desenvolvimento de um quadro
de avaliação (Cressman
et al
2009a), cujos resultados permi-
tirão que as instituições aumentem a sua capacidade de im-
plementar a pesquisa, de coordenar parcerias e comunicar
os resultados, de fazer a gestão e distribuição de recursos,
permitindo-lhes melhorar o desempenho e fazer a transla-
ção do conhecimento, tendo em vista o aumento da sua no-
toriedade (IDRC 2006).
Inovação
Existe evidência de que as redes desempenham um papel im-
portante em termos de inovação, considerada aliás uma das
principais razões para que as redes de investigação tenham
surgido (Freeman 1991; Robertson
et al
2011). Particular-
mente nos sectores onde o conhecimento se está a desenvol-
ver de forma rápida, como é o caso da saúde, é sabido que
uma intensa atividade de redes inter-organizacionais pode
promover a inovação, embora seja referida uma falta de estu-
dos que integrem simultaneamente a dimensão longitudinal e
a componente de avaliação (Scarbrough
et al
2014).
Novos conhecimentos e a importância
da sua translação
O sucesso das redes de investigação está ligado à produção
de novos conhecimentos e à sua translação para os utilizado-
res, aqueles que podem usar os resultados da investigação,
nomeadamente para apoiar a tomada de decisões políticas,
os programas de saúde e as práticas nos serviços de saúde.
Na nossa análise prévia da evolução da produção do conhe-
cimento sobre desigualdades na saúde é reconhecida a im-
portância de desenvolver estratégias de conhecimento ade-
quado, quer para Portugal quer para o Brasil (Craveiro
et
al
2015). Em vez disso, há uma lacuna em termos de meca-
nismos de translação dos conhecimentos das pesquisas para
a tomada de decisões políticas, nomeadamente na área das
determinantes sociais da saúde e a interligação com as polí-
ticas de formação e distribuição equitativa dos profissionais
de saúde.
Isto significa que a produção de novos conhecimentos sem
aplicabilidade na prática não tem impacto sobre a saúde
(CIHR, 2012). Mas a translação do conhecimento não é sim-
plesmente o reconhecimento de novas informações, implica
a adoção de conhecimento prático e mudança de comporta-
mento (Roy
et al
2003).
A translação de conhecimentos diz respeito ao ponto de en-
contro entre dois processos fundamentalmente diferentes:
investigação e ação (Bennett and Jessani, 2011). E signifi-
ca mais do que disseminação de resultados, na medida em
que a translação de conhecimento é um processo dinâmico
e interativo que exige a participação ativa de pesquisadores
e de utilizadores da investigação (CIRH). Existe uma multi-
plicidade de outros termos que têm sido usados para referir
estes mesmos processos:
implementation science
, utilização de
investigação, comunicação, difusão de inovações, educação
continuada, desenvolvimento profissional contínuo, gestão
do conhecimento, etc. Na verdade, trata-se de uma área vas-
tíssima, sendo reportada a utilização de cerca de 90 termos
(Bennett and Jessani, 2011).
Uma das questões essenciais prende-se com saber porque
devemos apostar na pesquisa dos processos de translação do
conhecimento. As razões são variadas, mas resumimos as se-
guintes: cerca de um terço dos pacientes não recebem tra-
tamentos de eficácia comprovada; um quarto dos pacientes
recebe o cuidado que não é necessário ou é potencialmente
prejudicial; até três quartos dos pacientes não recebem a in-
formação de que necessitam para a tomada de decisão; até
metade dos médicos não obtém evidência necessária para a
tomada de decisão. Ou seja, como nos lembram Berghman
e Potvin (2005) é bem conhecido o “know-do gap” entre o
conhecimento científico e a sua translação para a melhoria da
qualidade de vida das populações.
2. Princípios da translação
do conhecimento
A translação do conhecimento apresenta um conjunto de ca-
racterísticas principais, que resumimos de seguida: a) envol-
ve todas as etapas da produção de novos conhecimentos e/
ou produtos, serviços e ferramentas benéficos para o público;
b) precisa de comunicação multidireccional; c) é “circular”, na
medida em que o fim conduz ao início; d) é um processo ite-
rativo; e) é interdisciplinar e pressupõe uma colaboração en-
tre todas as partes envolvidas; f) pode envolver prestadores de
cuidados de saúde, o público em geral, o governo, ONG’s, o
sector voluntário e o sector privado; g) inclui muitas ativida-
Gestão, meta-avaliação e redes de conhecimento