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Neste texto, se evidencia questões como identidade violada,
estigma, isolamento social, rejeição familiar, marginalização
social. A fala do sujeito retrata a responsabilidade pública
pela violação de direitos provocada como efeito da política
de saúde eugenista e higienista adotada pelo Estado que, ao
empreender os ‘muros sociais’, provocou prejuízos irrepa-
ráveis na vida de toda a família. Por outro lado, muitos pais
foram acusados de abandono pelos filhos, por estes desco-
nhecerem os motivos de terem sido internados. Assim, o
silêncio ou negação de sua história se tornou autodefesa de
muitos deles [14].
Para concluir
Como vimos, os objetivos para o progresso da nação e a figu-
ra da criança vulnerável e adaptável, legitimou a saúde públi-
ca brasileira para uma intervenção coercitiva e disciplinado-
ra. Isso influenciou as práticas assistenciais nos preventórios,
onde os internos eram submetidos a um rigoroso controlo
e tratamento. Porém, este ‘tratamento’ nos preventórios era
reforçado pela prática do trabalho infantil que traduziu outra
forma de violação dos direitos humanos pelo Estado. Inte-
ressante observar a contradição entre o que previa a política
pública de assistência à criança e o discurso dos sujeitos que
a vivenciaram.
A separação dos filhos de doentes de lepra foi justificada sob
o argumento da proteção sanitária e social. Em outras pala-
vras, para que as crianças não contraíssem a doença e nem
a transmitissem em seu meio social. Porém, por terem sido
compulsoriamente afastados dos pais, em muitas vezes, logo
após o seu nascimento, esta medida representou uma políti-
ca pública marcada por diferentes formas de violência. No
processo de separação, os destinos que estes filhos tiveram
foram distintos, mas em quase todos os casos, gerou impacto
sobre sua identidade, origens e a história.
Compreendendo a relevância da pesquisa qualitativa para as
ciências humanas, foi privilegiado nesta pesquisa o método
da história oral. E dessa forma, o discurso dos atores sociais
permitiu a compreensão de fenómenos sociais que escapam
à observação fria e distante do pesquisador. Isso porque a
história oral não deve ser pensada como um fim em si mes-
ma, mas como um meio de conhecimento [12, 15]. E através
da voz dos sujeitos que foram isolados [16], identificamos
que um dos principais fatores que gerou prejuízos, sobre-
tudo, no processo de (re)socialização destes, foi o estigma e
o preconceito produzidos a respeito da doença, o doente e
sua família.A resistência da sociedade em aceitar o “leproso”
e seus filhos ocorria, principalmente, devido ao receio do
contágio de uma doença que, ainda hoje, é pouco divulgada
e combatida. De modo semelhante, o modelo de assistência
preventorial, condicionou as oportunidades de progresso
social das crianças. Com o caráter moralista, religioso e cí-
vico, a educação nos preventórios tinha foco no aprendizado
dos bons costumes e no exercício do trabalho como meio de
prevenção da delinquência social. Sem formação profissio-
nal, muitas meninas se tornavam empregadas domésticas e
alguns meninos, faziam trabalhos agrícolas.
Ao investigar tal história, vimos que, sob o mito da “pro-
teção social”, as ações empreendidas contribuíram mais
para o progresso nacional do que para o desenvolvimento
integral destes sujeitos. Os depoimentos orais e os docu-
mentos analisados, ultrapassam os objetivos da pesquisa e
revelam o valor da narrativa contida nas vozes da infância
da lepra no Brasil. Uma narrativa que traduziu a indese-
jável trajetória social vivida por órfãos gerados a partir
de uma política de saúde pública, que se tornou real e
concreta através dos instrumentos de disciplinarização e
tutela.
Agradecimentos
À Laurinda Rosa Maciel e aos meus amores Lorenzo e Lu-
ciano Souza.
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Doenças, agentes patogénicos, atores, instituições e visões da medicina tropical