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missionários para Cumura, trabalharem na leprosaria e aí abrir

uma missão católica [18]. O convite foi acolhido e chegaram a

Bissau os três primeiros missionários franciscanos italianos a 6

de maio de 1955, indo trabalhar de imediato na Aldeia dos Le-

prosos. Esta primeira caravana de missionários (fig. 1) integrou

o Pe.Artur Ferrazetta (em religião: Pe. Settimio) que foi o supe-

rior da Missão e dois missionários-enfermeiros com experiência

em cuidar doentes com lepra –

Fr.

José Andreatta (em religião:

Fr. Sebastião) e

Fr.

João Cardin (em religião: Fr. Epifânio), o pri-

meiro com 22 anos e o segundo com 4 anos de trabalho em

leprosarias do Tibete, ambos expulsos em 1951 pelo partido

comunista chinês de Mao-Tsé-Tung [19, 20].

Mais tarde chegaram novos reforços de missionários francis-

canos tornando possível lançar uma assistência sanitária sob a

forma de brigadas móveis, a tabancas mais afastadas, vigian-

do, tratando e encaminhando doentes com lepra, a partir da

leprosaria.

A leprosaria era uma aldeia de 18 pobres palhotas (fig. 2), com

paredes de adobe, sem pavimento, isolada no meio do mato e

chegando-se até ela por uma estrada de terra, desde Cumura

Pepel, conhecida por muitos, pela estrada da morte. Cubam-

bono, antigo doente, descreve a leprosaria quando chegou na

década de 1950, "quando cheguei, existia só uma casa pequena,

onde é hoje a administração. Era a única casa de construção de-

finitiva, coberta com telhas e era onde fazíamos os curativos das

feridas.As

casas à volta eram cobertas de palha, havia nove casas

de cada lado de uma estrada" (E.1).

A cozinha era desprovida de mesas e talheres. As panelas eram

feitas de

bidons

de gasóleo cortados ao meio. O fogão?Três pe-

dras no meio da cozinha, sobre as quais se apoiava o

bidon

de

arroz para cozer.A fonte mais próxima estava a um quilómetro

da leprosaria e a água era transportada para o hospital em carros

de bois. Os doentes que podiam cuidavam da terra produzindo

alimentos e tratavam de gado, assegurando o alimento.

Era uma aldeia com 205 leprosos, desfigurados no rosto,

mutilados nos membros, sem mãos, sem dedos, com os

pés totalmente deformados e o corpo carregado de feridas

nauseabundas. Viviam cerca de 12 doentes por palhota, de

4 quartos e corredor central. Os doentes caminhavam sem

sandálias, com os pés almofadados com algodão e enfaixados

em ligaduras de gaze, para impedir que o pó ou a lama en-

trassem nas chagas. Todas as manhãs os leprosos iam tomar

a medicação, fazer a lavagem e os curativos das suas feridas

(fig. 3), "a única coisa que Fr

.

Epifânio exigia, era que na

hora da medicação estivesse toda a gente presente. Todos

tomavam os medicamentos na sua presença... Fr. Epifânio

fazia a chamada com uma lista e chamava um por um” (E.1).

O diretor do hospital, Dr. Mário Ludgero Veiga, restringiu

os movimentos dos internados, ninguém podia andar livre-

mente fora do hospital, contaminando a sociedade com a sua

deformidade, "não permitia que nenhum doente saísse aqui

da zona do hospital, nem que fosse para ir lá acima a casa dos

padres. Não aceitava!" (E.2). Fr. Ernesto, missionário fran-

ciscano chegado à Guiné em 1967, relembrava os tempos de

controlo apertado dos doentes da lepra:

Naquela altura havia muitos leprosos. A leprosaria não era

um hospital, era uma aldeia onde isolavam os doentes que

traziam e viviam como em qualquer aldeia,mas não podiam

sair da zona de Cumura. Ficavam sempre internados, porque

a doença deles era muito avançada. Era aqui em Cumura,

no espaço da leprosaria, da aldeia, que eram "arrumados"

todos os leprosos graves da Guiné, que vinham de todas as

regiões. Eram arrumados lá ao fundo, eram isolados e eram

impedidos de sair, de ir a Bissau... só podiam andar por

aqui! (E.3).

Além da assistência sanitária diária dos doentes na leprosa-

Fig. 1:

Os três primeiros missionários franciscanos que chegaram à Guiné

com destino a Cumura: Fr. Cardin, Fr,Andreatta e Pe. Ferrazzetta [21]

Fig. 2:

Panorâmica da aldeia de leprosos de Cumura, em 1954 [21]

Doenças, agentes patogénicos, atores, instituições e visões da medicina tropical