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A n a i s d o I HM T
onde eu possa encontrar a melhor descrição e as melhores fi-
guras coloridas reproduzidas de serpentes peçonhentas de seu
país). (Carta de 31/10/1903).
“Je vous serais même très reconnaissant si vous pouvez me procurer tout
de suite ces figures ou dessins. Je les ferai reproduire en indiquant bien
entendre que je les dois à votre obligeante intervention.”
(Ficaria muito
grato se o senhor pudesse obter imediatamente as figuras ou
desenhos.Vou reproduzi-los indicando que os devo a sua grata
intervenção).
(Carta de 31/10/1903).
−
Uma possível explicação pelo facto de não terem sido loca-
lizados no Instituto Pasteur de Paris documentos referentes ao
curso que Vital Brazil realizou no ano de 1904 nesse instituto.
Ao que parece, ele participou do curso seguindo as orientações
de Calmette como aluno ouvinte:
“Le Dr Roux s’intéresse vivement à vous et vous réservera certainement
une place au cours s’il y en trouve une vacante. Malheureusement tout
est retenu et vous pouvez seulement espérer que quelqu’un des inscrits ne
vienne pas le 14.”
(Dr. Roux está muito interessado no senhor e
lhe reservará certamente um lugar no curso, se encontrar uma
vaga. Infelizmente, tudo está ocupado e o senhor pode apenas
esperar que algum dos inscritos não venha no dia 14).
(Carta de
29/10/1904).
Mais je vous indique un moyen de tourner la difficulté:vous pouvez tou-
jours suivre le cours comme auditeur libre et aller ensuite faire des exer-
cices pratiques à l’hôpital Boucicault avec la permission du Dr Letrelle.”
(Mas eu lhe indico um meio de superar a dificuldade: o senhor
pode acompanhar o curso como ouvinte livre e ir em seguida
fazer os exercícios práticos no hospital Boucicault com a per-
missão do Dr. Letrelle).
(Carta de 29/10/1904).
−
O envio de um álbum por parte deVital Brazil à Calmette.
“Le Dr Florence et Vasconcellos m’ont fait parvenir en votre nom le
magnifique album du Butantan. Je tiens à vous en remercier de tout
coeur. Cet hommage venant de vous, pour la partie que j’ai prise à
l’étude des venins et de la sérothérapie antivenimeuse, m’est infini-
ment précieux.”
(O Dr. Florence eVasconcellos me enviaram em
seu nome o magnífico álbum do Butantan. Quero lhe agrade-
cer de todo coração. Esta homenagem vinda do senhor, pela
parte que eu contribuí no estudo dos venenos e da sorotera-
pia antipeçonhenta, me é infinitamente preciosa).
(Carta de
26/1/1912).
−
Apesar de tratar-se de assunto alheio ao envenenamento ofí-
dico, este trecho apresenta mais uma evidência da relação cien-
tífica entre os pesquisadores. Nele Calmette divulga resultados
de suas pesquisas de forma sucinta, com poucas palavras, suge-
rindo queVital Brazil soubesse exatamente o que estava sendo
discutido.
“En ce qui concerne le bacille deVarigny, je ne crois pas qu’on puisse
compter sur ce microbe dans la lutte contre la peste pour diverses raisons
que je vous expliquerai : Il réussit bien à détruire les souris,mais mal les
rats.”
(Em relação ao bacilo de Varigny, não creio que se possa
contar com esse micróbio na luta contra a peste por diversas
razões que vou lhe explicar: ele é bem-sucedido para destruir os
camundongos, mas não os ratos).
(Carta de 29/10/1904).
Ao verificar a obra de Albert Calmette datada de 1907 [14],
percebe-se a contribuição de Vital Brazil, já anunciada na carta
datada de 31/10/1903, nas páginas 160 (figura 85 – Extração de
veneno de uma
Lachesis
, no Instituto Soroterápico de São Paulo
– Brasil) e 262 (citação de obra deVital Brazil [15]).Ainda ao ana-
lisar essa obra de Calmette, é possível verificar nas páginas 261 a
264 sua posição diante da teoria de especificidade e polivalência
dos soros antipeçonhentos. Calmette passa a ser menos categó-
rico com respeito a sua teoria de que seu soro antipeçonhento
possuía ação neutralizante sobre todos os venenos; contudo não
concorda com a lei da especificidade estrita, reconhecendo, en-
tretanto, a vantagem dos institutos regionais para o preparo de
soros específicos ou polivalentes. Ele cita os institutos de Bombay
e o de Kasaudi nas Índias inglesas, o de Sidney na Austrália, o de
São Paulo no Brasil e o da Filadélfia nos Estados Unidos, tanto
na página 264 quanto na página 260, sendo que na última cita
ainda seus criadores, e assimmais uma vez o nome deVital Brazil
aparece ao lado do de G. Lamb e Semple (Índias inglesas), Mac.
Farland (Austrália) eTidswell (Estados Unidos) [16].
Em 1928, Calmette, então vice-diretor do Instituto Pasteur de
Paris, tem
a chance de mais uma vez expressar seu apreço a Vital Brazil
e ao seu trabalho, dessa vez de forma pública. Em função de
uma homenagem prestada ao cientista brasileiro, publicada em
O Jornal do Rio de Janeiro em 24 de novembro de 1928, Cal-
mette envia a seguinte carta:
A obra científica de Vital Brazil é absolutamente de primeira
ordem. Os seus trabalhos sobre venenos e sobre as sorotera-
pias antivenenosas salvaram milhares de existências. Sinto-me
particularmente feliz ao associar-me à homenagem que vos pro-
pondes lhe prestar e o Instituto Pasteur de Paris, unanimemente
partilha os sentimentos de alta estima e admiração que me ligam
ao nosso ilustre colega e amigo (Albert Calmette).
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Não há dúvidas, portanto, da admiração e do reconhecimento
por parte do pesquisador francês do Instituto Pasteur, Albert
Calmette, um dos descobridores da soroterapia antipeçonhenta
em 1894, pelo trabalho do cientista brasileiroVital Brazil, cria-
dor dos institutos Butantan e Vital Brazil, e autor da teoria da
especificidade dos soros antipeçonhentos.
Os primórdios e o desenvolvimento
da soroterapia anti-peçonhenta
Em 2014 comemoraram-se os 120 Anos da Soroterapia Antio-
fídica, descoberta que contou com o aporte de conhecimento
de quatro grandes cientistas: Césaire Phisalix, Gabriel Bertrand,
Albert Calmette (França) eVital Brazil (Brasil). Porém, deve-se
2 - Albert Calmette acreditava que o soro antipeçonhento que produzia era capaz
de proteger o indivíduo contra diversos tipos de veneno. Vital Brazil discordava
ao afirmar que o soro é específico de acordo com o género da serpente agressora.