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A n a i s d o I HM T
abordagem está associada a literatura mais vasta no
âmbito dos estudos de ciência e tecnologia, registan-
do-se o desenvolvimento de metodologias participa-
tivas para avaliar os potenciais impactos sociais e éti-
cos de tecnologias em função dos valores específicos
dos indivíduos e comunidades [9].
Uma avaliação participativa do impacto de determi-
nada aplicação está relacionada com o reconhecimen-
to de que as racionalidades políticas e científicas são
incapazes de prever todas as potenciais implicações
da ciência e tecnologia (C&T), justificando o despo-
letar daquilo que Sheila Jasanoff designa como “tec-
nologias de humildade”. De acordo com a autora, a
humildade contrasta com
hubris
da ciência moderna,
centrada num dualismo epistemológico entre leigos
e peritos, e as tecnologias de humildade “requerem
não só os mecanismos formais de participação mas
também um ambiente intelectual no qual os cidadãos
são encorajados a trazer o seu conhecimento e ca-
pacidades nos processos de resolução de problemas
comuns” [33: 227].
5.
Assegurar que a equiparação
financeira e outros mecanismos
de cofinanciamento não prejudicam
as oportunidades para a participação
equitativa de todos os parceiros
Em 1990, a Comissão para a Investigação em Saúde para
o Desenvolvimento (HRfD) divulgou um relatório em
que apontava que apenas 5% dos 30 biliões de dólares gas-
tos anualmente na investigação em saúde eram dedicados
aos problemas de saúde dos países em desenvolvimento,
sugerindo a possibilidade desse investimento ter vindo a
diminuir devido aos problemas económicos desses países
[34: 36].
As disparidades económicas entre o Norte e o Sul global
exigem o desenvolvimento de mecanismos de cofinancia-
mento equitativos que possibilitem um impacto visível
nas comunidades dos países em
desenvolvimento. Um exemplo
recente diz respeito a um méto-
do de financiamento desenvol-
vido pelo Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento
que tem em conta os custos e
benefícios das intervenções em
diversos setores e avalia de for-
ma sistemática os seus impactos.
Esse mecanismo tem vindo a ser
testado nas áreas doVHI, saúde e
proteção social em alguns países
subsarianos [35].
De acordo com Edejer, as disparidades de financiamen-
to na investigação em saúde entre Norte/Sul fazem com
que muitas das boas intenções patentes nas parcerias
Norte/Sul não se traduzam na partilha equitativa de
valores e agendas. Para que as colaborações Norte/Sul
possam ser mutuamente benéficas, é necessário, segundo
a autora, que os resultados das parcerias não sejam avalia-
dos apenas tendo em conta os seus méritos científicos. É
necessário desenvolver uma
“abordagem pedagógica para criar uma relação de traba-
lho sustentável e mutuamente benéfica que, para além de
avançar o conhecimento científico, também lide com as
desigualdades e coloque em primeiro lugar as prioridades
locais, desenvolvendo capacitação com uma perspetiva a
longo prazo e preservando a dignidade dos povos locais,
assegurando que os benefícios da investigação irão verda-
deiramente melhorar as suas condições.” [36:319].
A Comissão Europeia - reconhecendo que o modelo clás-
sico de doador-beneficiário, característico do financia-
mento da I&D em África, ignora as verdadeiras necessi-
dades dos países em desenvolvimento - lançou em 2009
o projeto ERAfrica. Este projeto visa o estabelecimento
de parcerias equitativas através da criação de consensos
acerca de áreas chave a serem financiadas e que façam face
às prioridades Europeias e Africanas. Através do diálogo,
chegou-se a um consenso acerca de três áreas a financiar:
energia renovável; investigação entre duas áreas discipli-
nares e novas ideias dos investigadores [37]. Devido ao
sucesso desta iniciativa, os parceiros do ERAfrica esperam
que uma segunda chamada para propostas seja anunciada
no futuro próximo [38].
Com base num workshop organizado em 2010 em Pretó-
ria pela OCDE e pelaAgência Japonesa para a Ciência e a
Tecnologia com investigadores de países desenvolvidos e
em desenvolvimento, chegou-se à conclusão que as par-
cerias Norte/Sul são frequentemente “assimétricas”. Para
colmatar esta situação, os participantes sugeriram que
para balançar os inputs e a partilha dos resultados devia ser
feita, durante as fases iniciais da colaboração, uma identifi-
cação explícita de todas as contribuições que os parceiros
saúde das populações pobres [43: 54]. De forma a promover um processo de
desenvolvimento sistemático que inclua a ciência e a sociedade, Acharya defende a
disseminação de um processo ramificado que sumarizamos na tabela 3.
Tabela 3 - Desenvolvimento sistemático da Ciência e Sociedade segundo Acharya
(adaptado de [43: 59-61]
Seleção de prioridades tecnológicas tendo em conta os objetivos do crescimento económico e
de saúde pública
Melhoria da infraestrutura física, como estradas, água, eletricidade e sistemas de comunicação
Promoção de aprendizagem e comunicação entre setores
Coordenação da formação académica com as necessidades da indústria e de saúde pública
Aumento da comercialização da investigação para permitir a transferência tecnológica das
instituições de investigação para firmas privadas
Fortalecimento do ambiente legal e regulatório para apoiar o investimento em C&T
Desenvolvimento de instituições financeiras para suportar a inovação estratégica
O Instituto de Investigação para o Desenvolvimento (IRD) de França também reconhece
que a investigação científica é benéfica para os objetivos de desenvolvimento, e que este
pode ser alcançado através de um reforço de ações de capacitação. O Serviço de
Tabela 3:
Desenvolvimento sistemático da Ciência e Sociedade segundoAcharya (adaptado de [43: 59-61])