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A OMS definiu, em 2012, a sua estratégia para a investi-
gação em saúde, guiada por três princípios fundamentais
– qualidade, impacto e inclusão (que contempla a parti-
cipação da sociedade civil e comunidade nos processos
de investigação em saúde). Essa estratégia subdivide-se
depois em 5 objetivos interrelacionados – Organização;
Prioridades; Capacidade; Standards e Tradução. No que
diz respeito ao objetivo da tradução, este está diretamente
relacionado com a relevância da investigação para as comu-
nidades, no sentido em que visa “fortalecer os laços entre a
investigação, política e prática” [2:11].Algumas ações suge-
ridas para levar a cabo uma melhor tradução incluem, por
exemplo, modelos efetivos de transferência de tecnologia;
o desenvolvimento de sumários de investigação disponí-
veis para políticos, profissionais de saúde e o público em
geral e melhores formas de ter acesso aos resultados da in-
vestigação através de práticas de acesso livre, por exemplo.
A aplicação de standards e normas no domínio da investi-
gação em saúde também tem o potencial de maximizar o
envolvimento da comunidade, gerando maior apoio e con-
fiança do público na saúde e investigação médica [2:27].
Viergever et al. (2010) desenvolveram um modelo para
identificar as prioridades de investigação em saúde de co-
munidades específicas. De acordo com os autores,
“A definição de prioridades para a investigação em saúde é
essencial para
maximizar o impacto dos investimentos,
o que é especialmente relevante em
ambientes de
baixos recursos. A criação de prioridades na investigação
em saúde
é considerada como uma dimensão cha-
ve dos esforços necessários para fortalecer os sistemas na-
cionais de investigação” [3:1]
Os nove princípios promovidos porViergever et al. estão
divididos em três áreas fundamentais: trabalho preparató-
rio (que inclui uma análise do contexto local; a utilização
de uma abordagem sistemática; a inclusão; a recolha de
informação; o planeamento necessário para a implemen-
tação); decisão sobre prioridades (seleção de critérios re-
levantes; métodos para a decisão acerca de prioridades) e
ações a levar a cabo após as prioridades terem sido defini-
das (avaliação e transparência) [3:3].
De acordo com Bradley (2008), a cooperação não deve ser
entendida enquanto uma panaceia para os problemas que
afetam as instituições do Sul Global. De facto, e segundo a
autora, a motivação para as parcerias é fundamentalmente
económica, pois é a forma das instituições dos países em
desenvolvimento terem acesso a financiamento. A agenda
destas parcerias é habitualmente controlada pelas institui-
ções do Norte, e aspetos como as barreiras de linguagem,
complexas estruturas de gestão, acesso desigual a recursos
financeiros, bibliotecas, redes de investigação e oportuni-
dades de publicação dificultam cooperações equitativas e
verdadeiramente benéficas para as comunidades [4: 674].
De facto,
“apesar das parcerias Norte-Sul poderem aumentar os re-
cursos e aptidões individuais e institucionais, não são uma
panaceia para todos os desafios
associados à criação de
capacidade e à criação de conhecimento para permitir o
desenvolvimento (…) as parcerias Norte-Sul não são ne-
cessariamente a melhor forma para levar a cabo investi-
gação baseada nos princípios do Sul.” [4:674]
Um dos aspetos que prejudicam estas colaborações, dimi-
nuindo os seus impactos positivos nas comunidades, são
as questões burocráticas. Justice (1987) levou a cabo um
estudo etnográfico no Nepal acerca do desenvolvimento
de cuidados primários, e considera que as verdadeiras ne-
cessidades da população são ignoradas devido às exigências
burocráticas. As perspetivas burocráticas dos administra-
dores e responsáveis pelo planeamento contrastam com as
da população, sendo necessário implementar de forma ro-
busta as metodologias e expertise das ciências sociais para
analisar de forma qualitativa os reais problemas e anseios
das comunidades. Como afirma a autora: “Enquanto a es-
trutura e cultura das burocracias de saúde se mantiverem
inalteradas, a informação social e cultural acerca das popu-
lações terá um impacto reduzido” [5:1306].
Para que o impacto positivo sobre as comunidades possa
ser maximizado, é fundamental que as colaborações inci-
dam sobre as prioridades de investigação locais. Nas últi-
mas 3 décadas a questão da definição das prioridades de
investigação nacionais e internacionais tem assumido gran-
de relevo, reconhecendo-se a necessidade de desenvolver
estratégias e métodos que permitam que este seja um pro-
cesso participativo, abrangendo todos os
stakeholders
(e não
apenas técnicos, corporações e funcionários governamen-
tais) [6] na definição de prioridades.
Existem várias metodologias para definir as prioridades de
investigação em saúde, como ferramentas desenvolvidas ao
nível nacional e tambémmetodologias como aAbordagem
da Matriz Combinada (CAM), metodologias fornecidas
pelo COHRED, a Iniciativa de Investigação em Saúde e
Nutrição Infantil (CHNRI) [7], o modelo de Investigação
Essencial em Saúde Nacional (ENHR), e o método Delphi
[8].
De acordo comTomlinson et al. (2011), diferentes abor-
dagens acabam por gerar resultados distintos, indicando
o caráter performativo das metodologias [9] e ilustrando
também a existência de diferentes estilos sociopolíticos de
definição de prioridades, que se distinguem ao nível da do-
cumentação e legitimidade, envolvimento de
stakeholders
, e
diferentes formas de liderança [7].
Na sexagésima Assembleia Mundial da Saúde, a OMS pe-
diu aos estados membros para “desenvolverem e forta-
lecerem um mecanismo participativo (…) para todos
os
stakeholders
de forma a priorizar a agenda de investi-
gação em saúde com base em mudanças dinâmicas dos
sistemas de saúde (…) e tópicos emergentes relaciona-
dos com a saúde” [10:69], e o CIOMS (Conselho para
as Organizações Internacionais de Ciências Médicas),