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Artigo Original
ra do pensamento por compor “caixinhas” para serem
preenchidas de forma automática, numa formatação
específica, que para alguns se mostrava desinteressan-
te, desinteressada, sem outra importância que não fosse
controle. Esta compreensão começava a ser modificada
no decorrer dos processos educativos, como apontado
pelos participantes da última oficina relacionada ao sis-
tema, que viria a ser substituído ou sofrer profundas
mudanças no curto prazo.
Desta maneira, pode pensar-se que faz parte da cultura
institucionalizada a perceção de um fazer obrigatório
vinculado a punições e a mecanismos de judicialização,
ligados a mecanismos de controle e, por consequência,
de resistência. Como mostram os estudos sobre a socie-
dade disciplinar e a utilização das ferramentas de con-
trole, existe um “exercício cotidiano da vigilância, num
panoptismo em que a penetração dos olhares entrecru-
zados” fazem parte da institucionalização dos fazeres
(Foucault, 1987). As resistências à ferramenta e-Car
apareceram o tempo todo, a cada mês, nos momentos
em que os técnicos do DEMAS acolhiam os relatórios.
A ocorrência de troca de técnicos das secretarias mos-
trou-se por vezes um problema de continuidade no
encaminhamento dos pareceres técnicos para o e-Car.
Muitas vezes trouxe uma questão de “retreinamento”
do novo ocupante da função de responsável. No entan-
to, nada comparado com os acontecimentos e mudan-
ças do governo nos últimos tempos, fator gerador de
insegurança e incertezas constantes.
Concomitante às mudanças do cenário político brasilei-
ro, também ocorria uma espécie de falta de confiança
dos técnicos e/ou menor valia da importância e vera-
cidade da ferramenta (se esta permaneceria ou não na
nova gestão) e medos extras: de estar sendo vigiado e
controlado com possibilidade de punição.
Em que pese a relação por vezes conflituosa entre os
envolvidos com o e-Car e a ferramenta em si, os resul-
tados da avaliação do sistema e-Car na SVS (Ubarana,
2017), embora reconheça problemas, como a não inte-
roperabilidade do e-Car com outros sistemas de infor-
mação, aponta importantes conquistas. Porém, como
observam Oliveira
et al.
(2014), as causas e condições
envolvidas no sucesso e sustentabilidade de uma ação
com a envergadura do sistema e-Car, como um sistema
de Monitoramento e Avaliação, requer o enraizamento
de uma decisão política aliada a adoção como objetivo
de governo, para além do necessário planejamento e
desenvolvimento das ferramentas.
Entre as forças identificadas na experiência do sistema,
pode-se destacar: a utilização do e-Car na elaboração
dos relatórios de várias secretarias do MS; o acompa-
nhamento das informações disponibilizadas pelo e-Car
por parte do Colegiado de Gestão do MS; algumas
secretarias e órgão do MS, como a SVS e Comité da
População Negra, acompanhando e discutindo sema-
nalmente as informações do e-Car relacionadas com os
objetivos estratégicos e resultados sob sua competência;
e órgãos públicos utilizam-no em diferentes ocasiões:
Tribunal de Contas da União (TCU); Controladoria-
-Geral da União (CGU); Casa Civil; Fundação Nacional
de Saúde (FUNASA); Instituto Nacional de Colonização
e Reforma Agrária (INCRA).
Como fragilidades apontam-se: o tempo insuficiente
para implicação positiva dos atuantes à nova proposta de
ferramenta e a resistência ao novo; resistência à ideia de
retrabalho pela sobreposição com outras ferramentas;
falhas no cronograma idealizado; mudanças políticas pro-
duzindo hiatos na execução do depósito de informações
no instrumento e usos, baixando a confiança a cada vazio;
a perceção por alguns que se tratava de uma ferramenta
de controle das secretarias.
Como cenário de futuro, compreende-se a natureza di-
nâmica da gestão e a necessidade de acompanhar as de-
mandas do momento, que justificam as mudanças em
qualquer sistema ou ferramenta de ação, sendo preciso
ter consciência da ideia de que nenhuma ferramenta está
pronta. Ela é intermediada por uma latência de trabalho.
Assim sendo a estratégia reflexiva sobre as ferramentas
mantém uma tensão permanente que faz existir uma es-
tabilidade estratégica e apropriação do trabalho de todos
os envolvidos. Todo este movimento de reflexividade
tensional leva às reformulações e isto pode ser de uti-
lidade para o planejamento e para o preenchimento do
relatório.
No desenvolvimento das atividades referidas para o siste-
ma e-Car, as avaliações colaborativas, envolvendo acade-
mia e governo, mostram na sua relação uma tensão aglu-
tinadora. Mais do que um problema, essa tensão é uma
das principais funções do M&A, pois permite o apren-
dizado e traz a consciência reflexiva do pensar a prática.
Olhar os campos de força, de poder e domínio permi-
te compreender como eles influenciarão a prática. Eles
constituem-se em desfechos éticos com menor custo,
combinando a ideia de desenvolvimento da saúde com o
cuidado e com os usos dos recursos. Para tanto é impor-
tante notar que esses polos não se excluem, embora em
várias situações pareçam estar em conflito.
Considerações finais
A implantação do e-Car teve sua arquitetura, customiza-
ção e divulgação a desenrolar-se lentamente. A pesquisa
evidenciou a ocorrência de momentos de vazio no uso do
sistema e-Car devidos, principalmente, às mudanças na
estrutura de governo, com descontinuidade na sua estru-
tura e manutenção, fragilizando a confiança dos técnicos
e/ou menor valia da importância, veracidade da ferra-