S73
A n a i s d o I HM T
menta, e dúvidas sobre a sustentabilidade do seu uso.
Como efeito dos hiatos na construção e condensamen-
to da ferramenta, por vezes ocorreu desinteresse no
preenchimento e elaboração de relatórios que trouxes-
sem maior sentido à informação disponibilizada e inte-
resse na sua translação, pelo uso esperado por técnicos,
gerentes, gestores.
Evidenciou-se entre os
actantes
divergências na relação
do humano com não-humano no caso dos usos do e-Car
(uma ferramenta não humana, performada num
softwa-
re
), numa relação de aproximação e afastamento com a
ferramenta. Essa relação foi notada por vezes pela difi-
culdade de preenchimento, outras pela dificuldade de
perceção da sua importância nos usos e translação do
conhecimento informado.
Tais subjetivações foram produzidas no atravessamento
da ferramenta como instrumento de controle na rela-
ção com os humanos submetidos a ela, conforme per-
cebido por alguns técnicos: ora como um meio de con-
trole e vigilância do fazer técnico das secretarias, ora
como inibidora do pensamento por serem preenchidas
de forma automática, numa formatação específica.
Algumas perceções foram sendo ressignificadas a partir
da realização das oficinas informativas e reflexivas sobre
o preenchimento e usos do
e-Car.Asdiscussões críticas
facilitadas nas oficinas trouxeram a possibilidade de um
alinhamento conceitual e textual; contribuiu na cons-
trução de um corpo de técnicos (humanos) mais impli-
cados com as informações enviadas para a ferramenta
(não-humana) e-Car.
Foi importante perceber como o setor técnico na práti-
ca dos seus ofícios subestimava a importância das infor-
mações investidas no e-Car, muitas vezes falhando no
preenchimento do sistema. Isso mostrou uma subutili-
zação de um serviço que tinha como ideal e potencial
uma excelência no atendimento de informações para
ações do governo na construção de estratégias e polí-
ticas públicas.
Parece necessário oficinas de continuidade do processo
de reflexividade a fim de criar uma cultura capaz de
lidar com fenómenos em movimento, construindo uma
aprendizagem institucional que requer sair da comodi-
dade e caminhar tateando um terreno que não é firme,
mas que pode ser promissor.
Um sistema de monitoramento, avaliação e de trans-
lação do conhecimento como foi a proposta do e-Car
requer contínuo esforço de pactuação para que se torne
enredado o suficiente e tomado como realidade. Esta
modelação da realidade é o lugar onde a prática do mo-
nitoramento e avaliação faz sentido de facto.
Bibliografia
1. Barreto AR (2001). Gestão do Conhecimento Mecanismos para Estabelecer
a Ação Participativa em uma Organização. CENADEM-Infoimagem, São Paulo,
Brasil.
2. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria-Executiva. Departamento de Monitora-
mento e Avaliação do SUS (2014a). Planejamento estratégico do Ministério da Saú-
de, 2011-2015: resultados e perspetivas (4ª. Ed). Editora do Ministério da Saúde,
Brasília, Brasil.
3. Brasil (2014b).Tribunal de Contas da União (TCU). Diagnóstico do perfil e da
maturidade dos Sistemas de Avaliação dos Programas Governamentais. Consul-
tado em 25 de maio de 2016. In:
http://portal.tcu.gov.br/lumis/portal/file/fileDownload.jsp?fileId=8A8182A24E990B11014EACCB2BB12024.
4. Brasil. Serviço Federal de Processamento de Dados (SERPRO). e-Car – Con-
trole, Acompanhamento e Avaliação de Resultados, 2011. Consultado em 13 de
novembro de 2015. In:
http://www4.serpro.gov.br/imprensa/publicacoes/tema-1/tematec/2010/artigos-tematec-tema-201/e-car-2013-controle-acompa-
nhamento-e-avaliacao-de-resultados. Consultado em 13-11-15
5. Brasil. Ministério da Saúde/DEMAS. Fiocruz-LASER/ENSP (2016). Relatório
da Oficina para discussão e alinhamento dos critérios de classificação do status e
situação das metas. mimeo.
6. Callon M, Latour B (1986). Les paradoxes de la modernité. Comment concevoir
les innovations? Clés pour l’analyse sociotechnicque. Prospective Sante 36: 13-29.
7. Clavier C,Vibert S, Potvin, L (2012). A theory-based model of translation prac-
tices in public health participatory research. Sociol Health Illn 34(5): 791-805.
8. Canada. Instituts de recherche en santé du Canada (CIRSC) (2012). Guia de
planejamento da aplicação dos conhecimentos nos IPSC: abordagens integradas e
de fim de subvenção. Consultado em 23 de maio de 2016. In:
www.irsc-cihr.gc.ca9. Costa R (2004). Sociedade de controle. Sao Paulo Perspec 18(1): 161-167.
10. Couto PC (2017).Avaliação dos usos e influências do conhecimento prove-
niente de pesquisas financiadas pelo Ministér
io da Saúde sobre a subagenda
Alimentação e Nutrição. MasterThesis. Escola Nacional de Saúde Pública Sergio
Arouca, Rio de Janeiro, Brasil.
11. Davallon J. (2007).A mediação: a comunicação em processo?
Prisma.com.4:
3-36.
12. Deleuze G (2004). Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia (1º vol). Editora 34,
São Paulo, Brasil.
13. Deleuze G (1990). Pourparlers. Les Éditions de Minuit, Paris, France.
14. Faria CAP (2005). A política da avaliação de políticas públicas. Revista da Ava-
liação de Políticas Públicas 20(59): 97-109.
15. Feinstein O (2002). Use of evaluations and evaluations of their use. Eval 8:433-
9.
16. Figueiró AC, Hartz Z, Samico I, Cesse EAP (2012). Usos e influência da avalia-
ção em saúde em dois estudos sobre o Programa Nacional de Controle da Dengue.
Cad. Saude Publica 28(11): 2095-2105.
17. FigueiróAC, Samico I, Felisberto E, Hartz Z. Formação de avaliadores e o estu-
do das intervenções inovadoras em saúde: o caso do ProgramaAcademia da Cidade.
In: Hartz Z, Potvin L, Bodstein R (2014). Avaliação em promoção da saúde: Uma
antologia comentada da parceria entre o Brasil e a Cátedra de abordagens comu-
nitárias e iniquidades em saúde(CACIS), da Universidade de Montreal de 2002 a
2012. CONASS, Brasília-DF, Brasil.
18. Figueiró AC, Oliveira SRA, Hartz Z.
et al
(2016). A tool for exploring the
dynamics of innovative interventions for public health: the critical event card. Int J
Public Health 62(2): 177-186.
19. Foucault M (1987).Vigiar e Punir: nascimento da prisão.Vozes. Petrópolis,
Brasil.
20. Hartz ZMA, Contandriopoulos AP. Do quê ao pra quê da meta-avaliação em
saúde. In: Hartz ZMA,Vieira-da-Silva LM, Felisberto E (2008). Meta-avaliação da
atenção básica em Saúde: teoria e prática. Editora Fiocruz, Rio de Janeiro, Brasil.
21. Hartz ZMA (1997). Avaliação em saúde: dos modelos conceituais à prática na
análise da implantação de programas. Editora Fiocruz, Rio de Janeiro, Brasil.
22. Hsieh HF, Shannon SE (2005).Three Approaches to Qualitative Content Analy-
sis. Qual Health Res 15(9): 1277-1288.
23. Jannuzzi PM (2013). Sistema de monitoramento e avaliação de programas so-
ciais: revisitando mitos e recolocando premissas para sua maior efetividade na ges-
tão. Revista Brasileira de Monitoramento e Avaliação 1: 4-27.
24. Latour B (2005). Reassembling the social: an introduction to Actor-Network-
-Theory. University Press, Oxford, UK.