Table of Contents Table of Contents
Previous Page  71 / 119 Next Page
Information
Show Menu
Previous Page 71 / 119 Next Page
Page Background

S71

A n a i s d o I HM T

implementação compreendessem as suas finalidades e

usos (

ibidem

, 2016).

Essa dinâmica permitiu levantar e discutir, ainda, a rela-

ção dos técnicos responsáveis pelo sistema nos seus dois

polos, o DEMAS e as áreas técnicas, trazendo contro-

vérsias na relação entre esses vários

actantes

. Na medida

em que os encontros foram acontecendo a elaboração

de pareceres mais claros e a apreensão da importância

de um bom material informativo produzia melhorias no

processo de implementação da ferramenta e-Car.

O entendimento da centralidade das atividades de for-

mação continuada dos técnicos envolvidos na imple-

mentação de programas para a sua evolução e sucesso

é discutida por alguns autores no campo da avaliação

(Hartz, 1997; Clavier, Vibert, Potvin, 2012; Figuei-

et al

.; 2014; 2016). Na análise da evolução de in-

tervenções complexas, que ao mesmo tempo que so-

frem influência do contexto, influenciam e provocam

mudanças no ambiente onde se inserem, as atividades

educativas, especialmente com abordagens participati-

vas e dinâmicas, favorecem a troca de experiências e

inovações, discussão das dificuldades e orientação para

reformulação das ações.

Alinhado a esta perspetiva, o DEMAS propôs e integrou

importantes processos de formação no seu quadro téc-

nico, incluindo atividades como: o apoio ao Programa

de Mestrado Profissional emAvaliação e Saúde; a reali-

zação do Curso de Especialização emAvaliação em Saú-

de e um conjunto de oficinas de treinamento em M&A,

dividido em três módulos de 20 horas cada. Buscou-se,

com essas estratégias a construção de capacidade para a

implementação e perceção da importância do sistema

para a translação do conhecimento dentre as diversas

áreas estratégicas e de gestão da saúde e do SUS.

Os

actantes

, suas interações

e subjetivações nas práticas do e-Car

A implementação de intervenções compreende sempre

uma intrigante interação entre

actantes

humanos e não-

-humanos, que pode ser observada no caso do sistema

e-Car e seus usuários. A relação por vezes antagónica,

de aproximação e afastamento com a ferramenta, de-

veu-se a distintas razões: seja pela dificuldade no preen-

chimento, outras vezes pela dificuldade de captação e

entrega das informações exigidas e por momentos polí-

ticos em que a ferramenta foi descontinuada.

Ao longo desse processo, múltiplas subjetivações foram

implicadas na relação técnicos-DEMAS-e-Car. Proces-

sos de subjetivação incluem as diversas maneiras pelas

quais os indivíduos se constituem como sujeitos e atuam

nos jogos de poder buscando resistência.Tais processos

só valem na medida em que, quando acontecem, esca-

pam tanto aos saberes constituídos como aos poderes

dominantes (Deleuze, 2004).

Como exemplo de resistências institucionais pode

observar-se, no acompanhamento da chegada dos pa-

receres ao e-Car/DEMAS, por vezes a dificuldade de

tradução do texto em alguns documentos. Estes apre-

sentavam-se, nessa observação, construídos como co-

lagens, peças burocráticas, sem especial preocupação

com a compreensão do próximo leitor, que poderia ser

um gestor e/ou um tomador de decisão para o SUS.

Cabia aos responsáveis no DEMAS receber este mate-

rial, a sua leitura e a avaliação da condição técnica para o

texto constar como documento do e-Car. O fluxo dessa

atividade compreendia, na sequência, o contacto com o

responsável na área técnica e a solicitação para revisão.

Essa era uma situação percebida como um constrangi-

mento. Noutras ocasiões era solicitada reunião na área

técnica que apresentou dificuldade no preenchimento

do relatório, visando a melhoria do texto ou esclare-

cimentos pelo não envio do relatório conforme o cro-

nograma.

“é preciso melhorar o preenchimento do e-Car e criar

esta cultura de escrever dentro de um padrão acessível

na estrutura da escrita, conforme foi indicada.”

(Inf 1)

“Pegou-se como exemplo um monitoramento do REM

que foi assinalado como cancelado; o responsável parou

de monitorar e não deu justificativa do cancelamento

no relatório. Foi comunicado por email a necessidade de

uma justificativa. ...Quem é o responsável da secreta-

ria? Liga-se para ele.”

(Inf 2)

Sabe-se que para uma realidade existir não se pode

recorrer apenas à ciência ou inserção de um sistema,

como o e-Car; é necessário ação e trabalho. Exige-se

ato de vontade. Esta vontade está por vezes ligada a uma

motivação pessoal e/ou coletiva; outras vezes o agente

desta vontade é o direito moderno através das regula-

ções. Este esforço de manutenção de uma realidade é

múltiplo e em rede, envolve inúmeras pactuações mes-

mo que improváveis e invisíveis. “É ao nível de cada ten-

tativa que se avaliam a capacidade de resistência ou, ao

contrário, a submissão a um controle” (Deleuze, 1990).

A relação dos responsáveis nas secretarias pelo envio

dos relatórios era percebida, por alguns técnicos, como

obrigação de fazê-lo, sem envolvimento e/ou implica-

ção.

“Nas reuniões de Gestão, de quatro em quatro meses, o

pessoal nutre o e-Car porque sabem que serão cobrados dos

gestores”

(Inf 3).

Percebeu-se nas oficinas a ocorrência de uma complexa

relação dos usos da ferramenta com os humanos que a

preenchiam. Ora como um meio de controle e vigilân-

cia do fazer técnico das secretarias; ora como inibido-