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Artigo Original
A Rede de EscolasTécnicas
em Saúde (RETS-CPLP)
Durante as reformas liberalizantes das últimas décadas, os Es-
tados nacionais, e as políticas de educação e de saúde particu-
larmente, foram reconfiguradas em todo o mundo, provocando
tensões entre as heranças históricas de desigualdades políticas,
sociais e culturais dos países e as receitas homogeneizantes para
fazer frente aos desafios da globalização [14].
Na CPLP isso pode ser especialmente observado no campo da
educação de técnicos em saúde, incluindo elementos de regula-
ção das relações de trabalho e das políticas de educação, os quais
estão estritamente vinculados aos princípios e características das
políticas nacionais e regionais de saúde [15].
Os trabalhadores e profissionais técnicos em saúde representam
a porção mais significativa do pessoal vinculado aos serviços de
saúde. Porém, apesar do papel fundamental que os técnicos em
saúde exercem, a pouca visibilidade da categoria e a falta de reco-
nhecimento profissional são uma constante. [16].
Apesar de existirem EscolasTécnicas de Saúde (ETS) e institui-
ções similares vinculadas direta ou indiretamente à formação de
técnicos em saúde em todos os países da CPLP, ainda há, no âm-
bito da Comunidade, muita assimetria e desigualdade na oferta
de formações desses
trabalhadores.Asescolas do Brasil e de Por-
tugal, já na época de elaboração do PECS, formavam profissio-
nais em diversas especialidades. CaboVerde, Angola e Moçam-
bique também ofereciam diversos cursos de formação técnica,
muitas vezes em cooperação com Portugal. Já Guiné Bissau, São
Tomé e Príncipe eTimor Leste possuíam um escopo mais restri-
to de formação, focado principalmente nas áreas de enfermagem
e de laboratórios.
O facto de a formação dos trabalhadores técnicos em saúde estar
sendo, cada vez mais, determinada por imperativos de mercado
traz outros desafios importantes, tais como o aprofundamento
das desigualdades nacionais e regionais e a ampliação do grau de
instrumentalização, fragmentação e especialização da formação
oferecida. Este cenário torna-se incompatível com uma atuação
profissional orientada para o enfrentamento dos determinantes
sociais da saúde e da construção dos sistemas universais de saúde
que estes países necessitam.
A falta de professores qualificados para a formação dos traba-
lhadores técnicos em áreas especializadas afeta a qualidade e a
quantidade dos quadros formados. Ademais, as fragilidades na
qualificação pedagógica dos professores existentes resultam na
dificuldade para a elaboração dos projetos político-pedagógicos
das instituições dedicadas à formação de técnicos, além da ina-
dequação dos currículos face às necessidades de formação dos
sistemas nacionais de saúde. Somam-se a essas questões dificulda-
des relacionadas à infraestrutura das escolas, principalmente no
que diz respeito às bibliotecas, às redes de informática, ao acesso
a internet e a disponibilidade de laboratórios para realização de
atividades práticas.
Além dos problemas apontados acima, apesar de inúmeros es-
forços para mudança desta realidade, a formação técnica não
se apresentava como sistema coordenado. Ao longo dos anos
colocaram-se em andamento cursos conforme demandas pon-
tuais, fortemente determinadas pela disponibilidade de recursos
de cooperação internacional. Outro ponto que compromete o
desenvolvimento qualitativo da formação técnica em saúde é a
ausência de normalização e padronização em questões de base,
cujo resultado é a manutenção de obstáculos reais que se esten-
dem aos mais variados aspectos formativos.
A RETS-CPLP foi criada em novembro de 2009, durante a 2ª
Reunião Geral da Rede Internacional de Educação de Técnicos
em Saúde (RETS), tendo se configurado como uma de suas sub-
-redes. Naquela ocasião, foi realizada a 1ª Reunião Ordinária da
RETS-CPLP e aprovado seu primeiro plano de trabalho (2010-
2012). Na reunião também ficou estabelecido que a coordenação
da Rede ficaria a cargo da Escola Politécnica de Saúde Joaquim
Venâncio (EPSJV/Fiocruz), função reiterada nas reuniões de ava-
liação e repactuações seguintes, ocorridas em2013, 2014 e 2016.
Atualmente, a RETS-CPLP, reúne quase 40 instituições de for-
mação da CPLP, bem como representantes de órgãos governa-
mentais responsáveis pela ordenação dessa formação nos respec-
tivos países.
Segundo seu regimento, aprovado na 2ª Reunião Ordinária (no-
vembro de 2013 – Recife, Pernambuco, Brasil), a RETS-CPLP
tem por objetivo “fortalecer a área de formação de trabalhadores
técnicos em saúde nos Estados membros da Comunidade, por
meio da troca de experiências e desenvolvimento de conheci-
mento, que permitam ampliar e melhorar as atividades de en-
sino, investigação e desenvolvimento tecnológico, conduzindo à
melhoria dos sistemas nacionais de saúde e a sua imprescindível
adequação às necessidades de suas populações, e à integração re-
gional”. Suas funções e atividades incluem, de forma resumida:
(1) a promoção da cooperação técnico-científica e pedagógica
entre as instituições membros para a elaboração de propostas
educacionais, projetos de currículo, planos de cursos, material
didático, metodologias e formação docente em áreas conside-
radas prioritárias; (2) o monitoramento, sistematização e com-
partilhamento permanentemente de informações e experiências
relacionadas com a área de formação dos trabalhadores técnicos
da saúde e sua interface com a organização do trabalho em saú-
de; (3) o fomento e o desenvolvimento de estudos na interface
das áreas de saúde, educação e trabalho, que resultem em novos
conhecimentos sobre a educação dos trabalhadores técnicos em
saúde, sua inserção no mercado de trabalho e sua mobilidade em
âmbito nacional, regional e global; e (4) o fortalecimento da in-
fraestrutura física e de equipamentos das ETS.
Entre as diversas atividades realizadas [17] nos sete anos de exis-
tência da RETS-CPLP, sempre orientadas pelo princípio da coo-
peração estruturante [2], vale destacar a realização de um curso
itinerante de Especialização em Educação Profissional em Saúde
(Ceeps) para os PALOP, realizado pela equipa de pós graduação
da EPSJV/Fiocruz e construído coletivamente com membros
dos países participantes, considerando a realidade concreta da
educação e do trabalho em saúde de cada território. No curso,
realizado de março de 2001 a dezembro de 2012, formaram-se