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A n a i s d o I HM T

e o concomitante envolvimento da comunidade

médica na especialização, à qual Portugal não se

alheou, a avaliar pela posição defendida pelos

deputados [32]:

“Nos ultimos dois annos, as nações, coloniza-

doras, caminhando na corrente scientífica do

que a etiologia e a transmissão das doenças,

dependentes em muitos casos de seres vivos

que obedecem a leis geraes de distribuição no

globo, variam com as condições climatericas,

comprehenderam a necessidade da criação de

escolas especiaes para estudo e ensino da hygie-

ne e pathologia coloniaes. Os medicos, distinc-

tamente habilitados para o exercicio da cli-nica,

na Europa, não podem, sem aprendizagem nada

conveniente para os habitantes das colonias,

tratar de doentes nas regiões tropicaes. Cabe á

Inglaterra a gloria de primeiro ter reconhecido

as vantagens do ensino de pathologia exotica

e a de ter criado as duas primeiras escolas de

medicina colonial. Os resultados scientificos

obtidos nestas escolas foram brilhantissimos e o

seu exito excedeu a expectativa. Os seus trabalhos, a sua

iniciativa teem contribuido poderosamente para esclare-

cer a etiologia e transmissão das doenças tropicaes e os

variados phenomenos do impaludismo. O ensino da me-

dicina tropical foi ainda assegurado nas Universidades de

Aberdeon e de Edimbourg. Reconhecidas as vantagens de

tal ensino, rapidamente passou a ser ministrado em outras

nações colonizadoras: a Allemanha criou em Hamburgo

um instituto de pathologia exotica e de hygiene naval; na

Belgica, na Hollanda, nos Estados Unidos do Norte o en-

sino especial foi instituído”.

O Ministro dos Negócios da Marinha e do Ultramar, António

Teixeira de Sousa (1857-1917), fez eco desta proposta e pro-

pôs a criação Escola de MedicinaTropical de Lisboa. O Rei D.

Carlos I decretou a criação simultânea da Escola de Medicina

Tropical e do Hospital Colonial, em Lisboa [24,37,38,39,40,

41], sob proposta da Câmara de deputados à semelhança do

que acontecera com a escola londrina, que se instalou no

Albert

Dock Seamen’s Hospital.

A proposta de criação destas instituições não faria recurso da

subscrição pública, como acontecera em Inglaterra e em França

[32] mas de uma forma modesta, adequar um edifício pertença

da Marinha para o ensino da medicina tropical e para a instalação

A especificidade das doenças tropicais ou das patologias das

grandes metrópoles exacerbadas ou alteradas por influência do

clima nos trópicos, obrigava a uma confluência de vários do-

mínios de intervenção no quadro do conhecimento médicos,

desde os cognitivos (protagonizados com o desenvolvimento da

biologia, da bacteriologia, da parasitologia, da entomologia, etc)

aos sociais, que envolviam as instituições, a prática e identidade

profissionais, e a existência de lobbies nos quais os grandes im-

périos europeus se envolveram [33].

O surgimento de uma nova especialidade médica era inevitável,

servia os interesses da estrutura de poder imperialista do séc.

XIX e tornou-se uma das ferramentas dos Impérios europeus.

Todos os oficiais médicos eram vistos como técnicos especiali-

zados para operar em qualquer parte do mundo e a medicina

tropical tornava a saúde pública menos dispendiosa.

Vivia-se um tempo de procura de consolidação do tecido co-

lonial pelas potências europeias e a saúde estava no cerne de

qualquer política externa, contribuindo assim para a emer-

gência da medicina tropical [16,34]. O mote do imperialis-

mo construtivo, inevitavelmente associado à figura de Joseph

Chamberlain (1836-1914) [20,22], tem expressão prática na

abertura das Escolas de Medicina Tropical de em Inglaterra,

como instituições de treino e investigação especializada, ao

serviço da coroa imperial. Em 1898, foi criada a Escola de

Medicina Tropical de Liverpool [35]; seis meses depois, a de

Londres, em 1899 [36]; depois de 1900, os Institutos Pasteur

ultramarinos [27]; as escolas de Hamburgo e Paris, em 1901;

as de New Orleans e Portugal, em 1902

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; a de Bruxelas, em

1906, e, a de Amsterdão, em 1912.

O apoio dos poderes imperiais a este tipo de instituições en-

volvia a criação dos serviços médicos coloniais pelo Estado

Fig.2 –

Fotografia da Escola de MedicinaTropical de Lisboa (fonte:Arquivo Museu IHMT)

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O ensino e a investigação no âmbito da medicina tropical portuguesa re-

montam a 1887 e à Escola Naval. O ensino da medicina tropical na escola

naval foi promovido por Barros Gomes (lei de 25/8/1887). Aqui se leccio-

navam algumas disciplinas de medicina tropical para estudantes do curso

de medicina geral e como especialidade para os médicos navais. Também

se faziam alguns testes de diagnóstico num pequeno laboratório desta ins-

tituição. No entanto, a medicina tropical só conheceu foros de autonomia

em 1902 quando a Escola de Medicina Tropical de Lisboa foi fundada, à

semelhança das suas congéneres europeias.