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A EPIDEMIADE VIH/SIDA EM PORTUGAL E NOS PAÍSES AFRICANOS DE LÍNGUA
OFICIAL PORTUGUESA
SANDRA FEIJÓ RIBEIRO VIDEIRA E CASTRO (S. VIDEIRA E CASTRO) *
AIDA MARIA DA CONCEIÇÃO ESTEVES SIMÕES (A. ESTEVES) *
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RICARDO MANUEL SOARES PARREIRA (R. PARREIRA) *
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JOÃO MÁRIO BRÁS PIEDADE (J. PIEDADE) *
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* Grupo de Virologia, Unidade de Ensino e Investigação de Microbiologia Médica, Instituto de Higiene e
Medicina Tropical (IHMT), Universidade Nova de Lisboa. Rua da Junqueira, 100, 1349-008 Lisboa,
Portugal. Telefone: 213652600.
:
JP@ihmt.unl.pt(J. Piedade).
** Unidade de Parasitologia e Microbiologia Médicas (UPMM) / IHMT.
Três décadas após o reconhecimento dos
primeiros casos de sida e do isolamento do VIH-1
e VIH-2, a epidemia associada à infeção pelo VIH
ainda constitui um dos desafios de maior relevância
em saúde pública.
Os VIHs foram introduzidos na espécie humana
por eventos de transmissão de carácter zoonótico,
tendo a transmissão cruzada de vírus da
imunodeficiência símia, respetivamente, de
chimpanzés (
Pan troglodytes troglodytes
) e de
mangabeis fuliginosos (
Cercocebus atys
), ocorrido
em várias ocasiões distintas. Enquanto o VIH-1 é
responsável pela pandemia, o VIH-2 encontra-se
praticamente confinado à Guiné-Bissau e países
circundantes da África Ocidental. O VIH-2 é
menos patogénico e transmissível, podendo isto
estar na origem da sua muito menor prevalência e
distribuição geográfica limitada. Portugal é o único
país fora do continente africano com expressão
significativa de infeção por VIH-2 (Santos e
Soares, 2010).
Segundo estimativas da OMS, o número total de
indivíduos infetados com o VIH, em dezembro de
2011, era 34,2 milhões. Foi estimado que, nesse
ano, tivessem ocorrido cerca de 2,5 milhões novas
infeções, uma redução de 20% comparando com
2001, e que 1,7 milhões de indivíduos morreram
por causas relacionadas com a sida, uma redução
de 24% desde o pico em 2005. A população de
infetados
com
o
VIH
concentra-se,
fundamentalmente, na região da África subsariana.
Esta continua a ser a região mais afetada, com23,5
milhões de indivíduos infetados (cerca de 69% do
total, em apenas 12% da população mundial) e uma
prevalência estimada de infeção na população
adulta de 5% (UNAIDS, 2012). Atualmente, pode
observar-se uma grande diversidade de sub-
epidemias no âmbito dos países africanos de língua
oficial portuguesa (PALOPs). Os dados
epidemiológicos
disponíveis
indicam
que
Moçambique é um dos países com maior taxa de
prevalência estimada da infeção pelo VIH na
população adulta (11,5%), seguido da Guiné-
Bissau, Angola e São Tomé e Príncipe, com
prevalências moderadas de 2,5%, 2,0% e 1,5%,
respetivamente. Por último, Cabo Verde apresenta
uma prevalência baixa, no contexto africano,
inferior a 1%. Na população adulta portuguesa, a
prevalência estimada é de 0,6%, a terceira mais
elevada da Europa Ocidental (UNAIDS, 2012).
Apesar dos fortes laços históricos, sociais e
económicos, a infeção por VIH/sida afeta os
PALOPs e Portugal de forma muito distinta. A
exposição heterossexual continua a ser o principal
modo de transmissão do VIH, mas a taxas muito
distintas (80% e 42,9% dos casos notificados de
VIH/sida, respetivamente). Por outro lado, os
comportamentos associados à utilização de drogas
por via endovenosa, importantes para transmissão
do VIH em Portugal, são relativamente recentes
nos PALOPs sendo, por isso, um fator secundário
(CPLP/UNAIDS, 2010). Em Portugal, tem vindo a
observar-se um aumento da via heterossexual e
diminuição da transmissão através do consumo de
drogas por via endovenosa, ainda assim
significativa (38,7% de todas as notificações)
(INSA, 2012).
A elevada diversidade genética é uma
característica fundamental do VIH e pode
apresentar
importantes
implicações
na
transmissibilidade,
patogénese,
diagnóstico
laboratorial, monitorização da infeção, sucesso da
terapia antirretroviral e produção de vacinas. Os
fatores que contribuem para esta variabilidade
acentuada conduzem, no seu conjunto, à rápida
formação de micropopulações virais distintas,
geneticamente relacionadas entre si, conhecidas
globalmente como “quasiespécies”, as quais
representam a “matéria-prima” fundamental para a
evolução do VIH. Com base na análise
filogenética, o VIH-1 foi classificado em quatro
grupos principais (M, N, O e P). O grupo M,