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HEPATITE DELTA
CRISTINA VIEIRA BRANCO (C. BRANCO)
CAROLINA ALPALHÃO MANTERO DE MENDONÇA ALVES (C. ALVES)
CELSO VLADIMIRO CUNHA (C. CUNHA)
Unidade de Ensino e Investigação de Microbiologia Médica, Instituto de Higiene e Medicina Tropical
(IHMT), Universidade Nova de Lisboa. Rua da Junqueira, 100, 1349-008 Lisboa, Portugal. Telefone:
213652600.
:
ccunha@ihmt.unl.pt(C. Cunha).
Centro de Malária e Outras Doenças Tropicais (CMDT) / IHMT.
O vírus da hepatite delta (VHD) é o agente
patogénico humano mais pequeno conhecido e é
considerado um vírus satélite do vírus da hepatite
B (VHB). O invólucro do VHD é constituído pelos
antigénios de superfície do VHB (HBsAg),
necessários para formação de viriões e propagação
da infeção. As caraterísticas peculiares do genoma
do VHD, uma molécula de RNA circular, de cadeia
simples, com 1.7 Kb, e o seu modo de replicação
assemelham-se às encontradas em viróides de
plantas, sendo o único representante de um novo
género designado por
Deltavirus
(Hughes
et al.
,
2011).
O VHD infeta exclusivamente hepatócitos
humanos e é responsável pela forma mais severa de
hepatite viral. No entanto, o quadro clínico de uma
infeção por VHD pode variar, incluindo casos
assintomáticos e hepatites fulminantes. Do ponto
de vista histológico, os danos provocados pelos
dois vírus são virtualmente indistinguíveis e
consistem, sobretudo, em necrose hepatocelular e
inflamação. Parece consensual que a hepatite delta
representa, em larga medida, uma patologia
mediada pelo sistema imune. Embora a gravidade
do quadro clínico dependa de diversos fatores,
incluindo a associação entre diferentes genótipos
de VHD e VHB, parece claro que a infeção com
VHD de um indivíduo com hepatite B crónica
agrava os sintomas da doença e aumenta o risco de
progressão para carcinoma hepatocelular em cerca
de 10 vezes (Niro e Smedile, 2012). À semelhança
do que acontece com o VHB, o VHD pode ser
transmitido por via parentérica. A transmissão
vertical intrafamiliar e o contacto sexual
desprotegido são também vias comuns de infeção.
Atualmente, não existe terapia antiviral
específica e eficaz contra a hepatite D. O
interferão-α peguilado é, hoje em dia, o tratamento
mais comum e revela alguma eficácia em doses
elevadas e administração prolongada. No entanto,
os efeitos secundários observados assumem, por
vezes, um caráter de relevante gravidade e as taxas
de eliminação do RNA viral são frequentemente
reduzidas (17-43%). Diversas estratégias de
inibição da replicação viral baseadas na utilização
de análogos de nucleótidos têm sido testadas com
sucesso variável, mas sempre muito limitado e
frequentemente associado ao surgimento de
variantes resistentes ao fármaco utilizado. Neste
contexto, uma vez que ambos os vírus partilham o
mesmo invólucro, constituído por HBsAg, a
prevenção da infeção, através da vacinação contra
o VHB, é considerada a alternativa mais
aconselhável. Deste modo, a descoberta de alvos
potenciais para novas terapias, bem como o
desenvolvimento de uma vacina eficaz na
prevenção da infeção por VHD em indivíduos
cronicamente infetados por VHB constituem, hoje
em dia, um desafio a que urge responder.
De acordo com a OMS, a prevalência global de
infeção pelo VHD situa-se entre os 15 a 20 milhões
de pessoas, isto é, cerca de 5% a 7% dos portadores
crónicos de VHB. O VHD encontra-se
disseminado por todo o mundo, embora apresente
uma distribuição não uniforme. São conhecidas
algumas zonas endémicas que incluem países da
bacia do Mediterrâneo, Médio Oriente, Ásia
Central, Extremo Oriente, África e América do Sul.
Nos últimos 20 anos, o padrão epidemiológico da
hepatite D tem sofrido alterações. A
implementação de medidas de prevenção, como a
vacinação contra o VHB e campanhas que visam a
promoção de alterações de comportamentos de
risco, têm contribuído para redução do número de
novas infeções. Na Europa Ocidental, em finais dos
anos 90, verificou-se uma diminuição considerável
da prevalência, de cerca de 20% para 5 a 10% em
portadores de VHB. No entanto, mais
recentemente, este número parece ter aumentado,
atingindo 8 a 12%. Este incremento é atribuído à
corrente migratória de indivíduos provenientes de
países endémicos do Norte de África e Europa de
Leste bem como ao elevado número de utilizadores
de drogas injetáveis. Registe-se, por exemplo, o