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investigação biomédica, da FCM, situada naquele

que foi o espaço do IBCP. Espero que a história se

repita nos sucessos e não nos erros dos quais

destaco a ausência de colaboração entre as

instituições que levou a um isolamento

progressivo, com grave prejuízo para cada

instituição e para o País.

As iniciativas de criação de instituições ligadas ao

ensino da medicina nas regiões tropicais são

anteriores ao movimento que levou à fundação do

IHMT. Lembro, com toda a justiça, a criação da

Escola Médica de Goa, fundada em 1884, aliás

precedida pelo ensino da medicina, em 1542, no

Colégio de S. Paulo da mesma cidade.

Existe igualmente uma outra iniciativa em Angola,

porventura menos conhecida, que gostaria de

lembrar. Em 1763 nasceu no Rio de Janeiro,

Joaquim Pinto de Azeredo, supostamente filho de

um cirurgião-mor do Exército. Apesar de não haver

ensino

universitário

no

Brasil

adquiriu

conhecimentos suficientemente diferenciados que

lhe permitiram ser admitido na prestigiada Escola

Médica de Leiden, na Holanda, onde se licenciou

em 1788. Regressado a Lisboa foi nomeado, em

1790, pela Rainha D. Maria I, físico-mor do Reino

de Angola, com a missão de “abrir uma Escola

Médica para os que quiserem empregar no

exercício e prática dela”. Esta iniciativa, que durou

poucos anos, por falta de apoio local incluindo a

deficiente preparação dos estudantes, como

descreve em carta enviada para Lisboa e datada de

1792, ficou assinalada pela publicação das suas

detalhadas lições de Anatomia, incluindo uma

notável oração de sapiência proferida em 1791 e,

também, em 1799, já em Lisboa, pela publicação

do livro “Ensino de Algumas Enfermidades de

Angola”.

Joaquim Pinto de Azeredo era um médico culto e

bem preparado e era também um professor

cuidadoso e atento às necessidades dos seus alunos

como o provam os magníficos textos que nos

deixou. Contudo, as circunstâncias nacionais e

locais impediram-no de ser bem-sucedido.

É interessante assinalar como teve de passar mais

um século para que a medicina portuguesa se

voltasse a organizar, formalmente, para o estudo

das patologias tropicais. Provavelmente, esta

minha digressão superficial poderá ser injusta e

terá havido porventura outros médicos notáveis que

se ocuparam desta matéria no século XIX, devem,

no entanto, ser honrosas e isoladas excepções.

Aliás, a falta de organização local persistiu e só

criámos estudos superiores em Angola e em

Moçambique na segunda metade do século XX.

Infelizmente, e apesar de uma plêiade significativa

de mulheres e homens com características notáveis

que Portugal gerou, nestes dois últimos séculos,

raramente os portugueses têm sido capazes de se

organizar à volta de projetos conjuntos e com

continuidade.

Espero que a NOVA na área da medicina e da

saúde pública, bem como noutras áreas já

identificadas, possa ser uma dessas exceções e

competir no mundo globalizado.

É urgente, aproveitar as boas lições do passado,

consolidar projetos já existentes e construir novas

iniciativas de ensino e de investigação ao serviço

da medicina e saúde pública das populações do

continente africano.

O papel das universidades e das instituições

médicas e de saúde nos Países Africanos de Língua

Oficial Portuguesa é essencial para o

desenvolvimento social e económico. O continente

africano enfrenta problemas de “brain drain” como

mais nenhum outro, mas será em África que se irá

verificar o maior crescimento da raça humana na

segunda metade século XXI, se forem resolvidas as

questões que impedem o seu progresso.

As redes que se constroem entre instituições

começampor contatos e relações entre pessoas que

se respeitam pela sua atuação profissional e social,

é isso que estaremos a fazer na NOVA não só

internamente, mas também com os nossos

parceiros da comunidade lusófona e europeia.

Termino com uma citação de José Pinto de

Azeredo dedicada aos seus alunos:

“Eu tenho usado nas minhas descrições de poucos

nomes, e dos mais triviais para evitar fastio e

dificuldades. Trago as opiniões de alguns autores

não com a intenção de os criticar nem de os

condenar; pelo contrário, antes a minha

condescendência se faz perigosa em algumas

partes. Eu peso a autoridade dos homens e respeito

a imagem da verdade. Conheço alguns fatos

interessantes e esclareço os seus efeitos. Descubro

outros aparentes e permito-me demonstrar o

engano.

Aproveitai-vos das minhas fadigas e do tempo que

convosco gasto que sempre tirareis nobres

vantagens em todo o género de literatura, e em todo

o estado da vida.”

Reitero mais uma vez, as minhas sinceras

felicitações ao novo Doutor da NOVA, Dr. Luís

Sambo.

(Lisboa, 10 de Dezembro de 2012)