115
O ESTADO DE SAÚDE DOS IMIGRANTES E SEUS DETERMINANTES:
RESULTADOS DE UM ESTUDO REALIZADO NA ZONA METROPOLITANA DE
LISBOA
SÓNIA DIAS (S.D.) *
/
**
ANA GAMA (A.G.) *
/
**
MARIA O. MARTINS (M.O.M.) *
/
***
* Unidade de Saúde Pública Internacional e Bioestatística, Instituto de Higiene e Medicina Tropical
(IHMT), Universidade Nova de Lisboa. Rua da Junqueira Nº 100, 1349-008 Lisboa. Tel.: 213652600.
E-
:
SFDias@ihmt.unl.pt(SD).
** Centro de Malária e Outras Doenças Tropicais (CMDT) / IHMT.
*** Unidade de Parasitologia e Microbiologia Médicas (UPMM) / IHMT
.
RESUMO
Este estudo pretende descrever o estado de saúde de uma população
imigrante e identificar os determinantes associados. Realizou-seum
inquérito, por questionário, com 1375 imigrantes residentes em
Lisboa, selecionados pelo método “bola-de-neve”. Os dados foram
analisados através de regressão logística.
Do total de imigrantes, 61,5% reportou boa saúde, mais
frequentemente os homens do que as mulheres. Em ambos os grupos,
o mau estado de saúde reportado está associado a maior idade e à
existência de doença crónica. Reportar má saúde está negativamente
associado a ser africano e brasileiro (comparando com europeu de
leste) e a ter escolaridade superior. Nas mulheres, ter mau estado de
saúde está também associado a residir há mais tempo em Portugal,a
percecionar os rendimentos como insuficientes, a reportar doença
mental e a não praticar exercício físico. Nos homens,termásaúdeestá
positivamente associado a não estar empregado e a não ter cuidados
alimentares.
As variações no estado de saúde entre grupos de imigrantes e a
influência das questões de género e do contexto socioeconómico e
cultural devem ser consideradas no desenvolvimento de políticas e
estratégias de ação direcionadas para a melhoria da saúde destas
populações.
SUMMARY
This study aimed to describe the health status of an immigrant
population and identify the associated determinants. A questionnaire
survey was conducted with 1375 immigrants living in Lisbon and
selected through snowball sampling. Data were analyzed by logistic
regression.
Of the overall sample, 61.5% reported good health, more frequently
men than women. In both groups, reported bad health conditionwas
associated with increasing age and chronic disease. Reporting bad
health condition was negatively associatedwith african and brazilian
origin (compared to eastern european origin) and higher education.
Among women, bad health status is also associated with living for
longer periods in Portugal, with perceiving income as insufficient,
with reportingmental illness and not practicing physical exercise.
Among men, a bad health status is positively associatedwith being
non-employed and having no concern about eating habits.
The variations in health status across immigrant groups and the
influence of gender issues, of the socioeconomic and culturalcontext
as well must be considered when developing policies and action
strategies to improve the health status of these populations.
INTRODUÇÃO
Um conhecimento mais profundo sobre o estado
de saúde das populações é fundamental para
auxiliar a decisão informada no desenvolvimento
de esforços conducentes à obtenção de maiores
ganhos em saúde. O Relatório Europeu de Saúde
da OMS para 2009 salienta a melhoria do estado de
saúde da população na região europeia registada
nas últimas décadas (WHO, 2009). Contudo, as
diferenças persistentes observadas no estado de
saúde das populações têm levado a uma ênfase nas
populações mais desfavorecidas, em que se
incluem alguns grupos de imigrantes (WHO,
2010).
Os dados sobre a saúde dos imigrantes são
ambíguos e pouco consensuais: alguns estudos
documentam que estas populações tendem a
apresentar melhores indicadores de saúde do que a
população em geral (Jasso
et al.
, 2004), enquanto
outros estudos descrevem um pior estado de saúde
(Villadsen
et al.
, 2009).
De acordo com a primeira ideia, tem-se utilizado
o conceito de
healthy migrant effect,
de acordocom
o qual as populações imigrantes são mais saudáveis
do que as populações nativas do país de
acolhimento com características semelhantes
(Jasso
et al.
, 2004; McDonald e Kennedy, 2004).
As explicações apresentadas para esta ocorrência
assentam na existência de um segundo efeito,
designado por
selectivity effect
, que consiste na
ideia de que só os indivíduos que
se sentem com boa saúde aceitam os custos
inerentes ao processo de imigração, na expectativa
de alcançar benefícios com a mudança para um
novo país (Jasso
et al.
, 2004; Norman
et al.
, 2005).
Outra das explicações apontadas para justificar
vantagens encontradas no estado de saúde dos
imigrantes é designada de
salmon bias effect
(Khlat
e Darmon, 2003). Como o próprio nome sugere,
este efeito compara a população imigrante a
salmões que, quando doentes, regressam a casa,
neste caso, ao país de origem. Nesta perspetiva, só