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S58

Artigo Original

1- A regulação da economia

1

A regulação da economia tem como pontos centrais a for-

mulação, implementação e efetivação de regras dirigidas

aos agentes económicos no mercado, destinadas a garantir

o seu funcionamento equilibrado, de acordo com deter-

minados objetivos públicos. Deve entender-se

a regulação

como a intervenção estadual na economia por outras formas que

não a participação direta na atividade económica, equivalendo,

portanto, ao condicionamento, coordenação e disciplina da ativi-

dade económica privada

2

.

São três as operações materiais em que assenta a ativida-

de regulatória da economia: emissão de normas de atuação

(

rule making

) - regulação em sentido estrito; aplicação e su-

pervisão de aplicação de normas (

rule implementation

e

rule

supervision

); e aplicação de sanções pelo incumprimento

das normas (

rule

enforcement

). Os poderes da administração

regulatória não se distinguem estruturalmente da adminis-

tração pública em geral.Todavia, a administração regulató-

ria é caracterizada em geral por dois traços específicos: (i)

maiores poderes discricionários das entidades reguladoras,

sobretudo as autoridades reguladoras independentes, quer

ao nível regulamentar, quer ao nível da fiscalização admi-

nistrativa, quer, por último, ao nível do poder sancionató-

rio; (ii) concentração dos poderes normativos “executivos”

e sancionatórios na mesma autoridade administrativa – a

autoridade reguladora – diferentemente do que ocorre na

administração em geral, em que tais fases estão desagrega-

das, cabendo a diferentes organismos administrativos.

São essencialmente quatro as razões de ser da regulação

económica:

O primeiro fundamento da regulação está nos limites e

“falhas” do mercado, isto é, nas situações em que o mer-

cado, pelas especiais características de certos setores, não

pode funcionar normalmente sem intervenção externa.Tal

é o caso dos “monopólios naturais”, em que, por razões de

racionalidade económica e ambiental, não se pode esta-

belecer concorrência entre uma pluralidade de operado-

res, tendo de se aceitar um único operador (indústrias de

rede). O mesmo sucede com as “externalidades negativas”.

Estas dizem respeito aos custos sociais de certas atividades

económicas, associados aos danos ambientais, aos prejuí-

zos para a saúde pública, aos riscos para a segurança cole-

tiva, etc. Entre as falhas de mercado contam-se também as

“assimetrias de informação”, decorrentes da desigualdade

de informação entre fornecedores e consumidores no que

concerne às características e qualidade dos bens e serviços.

A segunda razão de ser que tradicionalmente se associa à

regulação pública da economia decorre de exigências am-

bientais e de ordenamento territorial das atividades econó-

micas, do planeamento e ordenamento urbanístico.

A terceira razão da regulação decorre da necessidade de

proteger os consumidores na sua relação de “troca desi-

gual” com os produtores e distribuidores. São os valores

de uma informação fiável e adequada sobre os produtos e

serviços postos no mercado, da segurança e da saúde indi-

vidual, de assegurar um direito à reparação de danos, que

justificam a intervenção regulatória

3

.

Finalmente, a quarta razão para a regulação pública da eco-

nomia deriva da necessidade de assegurar a todos, indepen-

dentemente de meios económicos e do local de residência,

o acesso a certos serviços considerados básicos, como a

água, a energia, as telecomunicações e os serviços postais.

Trata-se dos chamados “serviços de interesse económico

geral”, antigamente fornecidos diretamente pelo poder

público e que depois da sua privatização e/ou liberaliza-

ção ficam sujeitos a “obrigações de serviço público”. Neste

aspeto o Estado fornecedor de serviços públicos torna-se

garante do seu fornecimento por entidades privadas (“Es-

tado garante”)

4

.

2 - As autoridades reguladoras

independentes

As autoridades reguladoras independentes são identificadas

pelos seguintes traços: procedimento especial de nomea-

ção dos seus dirigentes, duração do seu mandato mais lon-

ga do que a legislatura, irremovibilidade (salvo falta grave),

independência funcional (não sujeição a tutela de mérito

nem a orientações governamentais), recursos financeiros

próprios, prestação direta de contas perante o Parlamento

sem passar pelo Governo.

Para além da separação clara entre política e economia,

a opção pelo modelo de regulação independente assenta

ainda na necessidade de separar o papel de regulador em

relação ao aparelho administrativo tradicional e à volatili-

dade dos governos.Trata-se, pois, de assegurar a estabilida-

de e segurança do quadro regulatório, tornando-o imune

ao ciclo eleitoral, através, desde logo, da inamovibilidade

dos mandatos dos reguladores.Tal aspeto assume particular

importância, porquanto potencia a confiança dos agentes

económicos.

A justificação do modelo de regulação independente de-

corre ainda da necessidade de favorecer o profissionalismo

da atuação regulatória, determinando o recrutamento de

pessoal especializado de forma a assegurar um processo de

decisão informado e fundado em dados técnicos.

Outra das justificações da adoção do modelo de regulação

independente deriva da conceção que lhe está inerente, ou

seja, da necessidade de que o desenvolvimento da atividade

económica seja controlado por sujeitos imparciais, “colo-

cados numa posição equidistante em relação aos interesses

públicos e privados em jogo”

5

. A neutralidade e a indepen-

dência da decisão regulatória são os instrumentos eleitos

com vista ao desiderato final: a garantia da livre e efetiva

concorrência entre os operadores económicos, a transpa-

rência e a visibilidade do mercado, bem como a remoção