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A n a i s d o I HM T

logo, seu objetivo era justamente chamar a atenção para

a grande incidência da lepra, pois ainda que Souza Araújo

tenha diminuído pela metade a estimativa do número de in-

divíduos doentes, a estatística continuava grave. Orsini ain-

da apresentou outros dados publicados no “Boletim Oficial

Sanitário Pan-americano de 1933”, que trazia a opinião de

M. Fallaice, um estudioso do problema higiénico brasileiro,

para o qual a lepra constituiria um perigo para o país, pois

“o Brasil teria 97 leprosos para cada 100 mil habitantes, ao

passo que na Índia havia 50 para 100 mil” [11]. Sendo assim,

para o referido leprólogo, mesmo que tais estatísticas fos-

sem exageradas, não se poderia desconsiderar o problema

já que o “coeficiente da lepra no Brasil era de 0,50 por

mil” [11], o que não era um número desprezível. O mé-

dico fez, então, uma detalhada descrição das informações

disponíveis acerca do número de leprosos em cada estado

brasileiro.

Na medida em que as estatísticas colocavam o Brasil entre

os países com maior incidência de lepra no mundo, contro-

lar esta doença passou a ser considerada uma etapa necessá-

ria ao processo de construção de nossa nacionalidade, base

do projeto de civilizar e modernizar a nação. Costa observa

que, dentre as estratégias utilizadas pelos leprólogos, esta-

va a de “produzir um discurso em que, tal como nas ende-

mias rurais, uma maior incidência da lepra seria creditada

à ausência do Estado e à total omissão do poder público na

formulação de políticas para seu controle” [10:245]. Esta

estratégia pode ser observada na fala do médico Olyntho

Orsini, pois, em sua acepção,

O problema da lepra no Brasil esteve durante séculos ao

abandono. Os governos, com raríssimas e honrosíssimas exce-

ções,sempre preocupados com a lepra da política,esqueciam-

-se da lepra hanseniana,que tranquilamente estendia,pouco

a pouco, a sua atividade a todos os recantos do país

[11].

Através deste discurso, ao mesmo tempo em que se res-

ponsabilizava o Estado pela grande incidência da lepra,

também era possível demandar dele ações efetivas para seu

combate. Tal empreitada significou construir possibilida-

des de negociação dos leprólogos com os governos para

efetivar as políticas de controle da doença. Deste modo,

“a ideia de que a lepra era uma doença que exigia medidas

singulares de controle, partilhada por médicos e autori-

dades sanitárias, acabaria por constar no texto do decreto

nº 13.538, que reorganizou o Serviço de Profilaxia Rural”

[10:241]. Este decreto [13] estabelecia que o serviço con-

tra a enfermidade estivesse sujeito a um regime especial,

que significava a construção de colónias de isolamento.

Para viabilizar a política de isolamento, recorreu-se a todo

tipo de argumento, sobretudo, àqueles que se fundamen-

tavam no caráter estigmatizante da doença, os quais eram

capazes de difundir o pavor na sociedade. Para o médico

António Aleixo, segregar os leprosos era um recurso do

qual deveriam lançar mão para preservar a sociedade. Mais

que isso, de acordo com sua perspetiva, o combate à doen-

ça por meio do isolamento era uma “verdade” [14]. Desse

modo, pode-se dizer que a segregação do doente de lepra

tornara-se uma máxima que os leprólogos empenharam-

-se, estrategicamente, em difundir naquele momento. Isto

ocorria porque, à medida que a sociedade era conscien-

tizada do “perigo” representado pela lepra, bem como da

urgência em controlá-la, o poder público acabava sendo

pressionado a posicionar-se e a investir em ações para com-

batê-la. Analisando todo o processo de estruturação das

políticas de controle da doença e, particularmente, do iso-

lamento compulsório, é possível afirmar que a estratégia

obteve êxito em muitos aspectos. Pois, conforme afirmou

Cunha, “a luta contra a lepra tornou-se, enfim, mais con-

tundente a partir de 1935, com a elaboração de um plano

de construção de leprosários promovido pelo governo fe-

deral” [15]. Este plano, elaborado pela Diretoria Nacional

de Saúde e Assistência Médico-Social, sob coordenação de

João de Barros Barreto, juntamente com os médicos Ernani

Agrícola e Joaquim Motta, pode ser pensado como uma

resposta do poder público à urgência que se imprimiu ao

problema da lepra.

Assim, um plano nacional de combate à lepra, tal qual o

sugerira o médico António Aleixo, foi elaborado e, com o

apoio do ministro Gustavo Capanema, aprovado pelo presi-

dente Getúlio Vargas em 1935. Seu conteúdo pretendia di-

recionar as ações do governo, determinando os objetivos a

perseguir, bem como planejando a distribuição de recursos e

gastos para construção e manutenção de leprosários em todo

o país. De modo geral, o plano pressupunha a construção

de leprosários em número suficiente para isolar os leprosos,

além do melhoramento dos já existentes, não só com o fim

de aumentar o número de leitos, como também para permi-

tir uma melhor assistência. O mais interessante neste plano

era a pressão que o governo federal passou a exercer sobre os

estados a fim de se equiparem para o controle da lepra.

4.º - Obrigação, de modo geral, por parte dos Estados, das

seguintes medidas: a) instalação de dispensários em núme-

ro suficiente; b) cessão dos terrenos necessários à construção

de leprosários e instalação dos referidos estabelecimentos;

c) manutenção de metade dos doentes isolados; d) adoção

da legislação federal sobre o assunto e subordinação técni-

ca aos órgãos competentes da União.

5.º - Desenvolvimento do plano de construção em 3 anos.

De acordo com as possibilidades financeiras do país e ou-

tras circunstâncias supervenientes, poderá o prazo ser dila-

tado para 4 ou 5 anos

[16].

A perspetiva era de que os estados, com o apoio e sob a

orientação da União, ampliassem o número de leprosários

existentes para que todos os leprosos pudessem ser isolados,

sabendo que o plano deveria ser executado, no máximo, em