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A n a i s d o I HM T
tornando urgente a implementação de estruturas, em particular
no domínio da saúde e obras públicas, que dessem resposta às
necessidades decorrentes deste surto populacional. Na capital
da colónia replicavam-se agora as situações verificadas em Lis-
boa e no Porto quando, em meados do século XIX e na perspe-
tiva de melhores condições de vida, estes dois centros urbanos
se tornaram polos de atração para quem procurava trabalho,
tornando evidente a necessidade de alterações estruturais e a
tomada de medidas específicas que dessem resposta aos proble-
mas decorrentes deste acréscimo de população [6].
Habitação, alimentação e saúde, condições de higiene, salubri-
dade e segurança dos locais de trabalho e habitações, a higiene
dos produtos alimentares ou a qualidade da água tornaram-se
uma preocupação e impuseram-se como áreas de intervenção
fundamental assistindo-se, a partir de meados do século, não
só à criação e/ou reorganização de organismos governamentais
que refletiam estas preocupações (Ministério das Obras Públi-
cas, Comércio e Indústria - 1852; Junta Consultiva de Saúde
Pública - 1868, Direção Geral de Saúde e Beneficência Pública
- 1899), como à elaboração de legislação específica. Legislação
essa que definia e regulamentava as diferentes ações no sentido
da melhoria das condições de vida e trabalho das populações,
tanto nos centros urbanos como nos locais de trabalho e, em
particular, dos estabelecimentos industriais (Regulamento de
Saúde Pública - 1837; Código Penal - 1852 - que, pela primeira
vez criminaliza os atos que diretamente prejudicam a saúde; re-
gulamentos sobre a salubridade das instalações industriais - 1855
- e das edificações urbanas - 1902; e a reforma da organização
dos serviços de saúde, higiene beneficência pública -1899).
As preocupações higiénico-sanitárias ganhavam manifesta re-
levância no quadro da política de saúde em Portugal e, quase
em simultâneo, refletiram-se nas colónias com a publicação,
em 1860, do Regulamento Geral do Serviço de Saúde das Pro-
víncias Ultramarinas e de regulamentos mais específicos como
seja, por exemplo, o Regulamento Geral de Sanidade Marítima,
aprovado por Decreto de 21
de janeiro de 1897 e publi-
cado pela Imprensa Nacional
em 1900.
No que respeita a Moçam-
bique, apesar do primeiro
Regulamento do Serviço de
Saúde da Província remon-
tar a 1844 [7] e a formação
de uma Companhia de Saúde
datar de janeiro de 1875, será
a construção de um hospi-
tal em Lourenço Marques,
em 1878 [8 e 9], que marca
efetivamente o início da ela-
boração e implementação de
um conjunto de medidas sa-
nitárias que acompanharam
as reformas administrativas na
colónia, designadamente a transferência da capital para Louren-
ço Marques em 1898. Ano em que se procedeu igualmente à
regulamentação dos Serviços de Saúde, em conformidade com
a Carta de lei de 28 de maio de 1896, pela qual estes se regeram
até
que o Decreto n.° 5:727, de 10 de maio de 1919, veio mo-
dificar a orgânica dos serviços de saúde coloniais.
Neste contexto, entre o último quartel do século XIX e as pri-
meiras décadas do século XX, Lourenço Marques testemunhou
um crescimento económico, urbano e populacional que impôs
medidas específicas no domínio da saúde, obras públicas e sanea-
mento com resultados visíveis em termos estruturais e na pró-
pria imagem da cidade.Ainda que, muitas vezes, essas medidas se
tenham revelado insuficientes ou até mesmo inadequadas, certo
é que houve vontade, interesse e algum investimento no sentido
de transformar o vilarejo insalubre do início do século XIX na
metrópole cosmopolita das primeiras décadas do século XX.
Reputada pelos ares doentios e febres endémicas, mas reconhe-
cida e apreciada pelo excelente porto e a facilidade de ligação
às minas do Rand, a urbe cresceu, encaixada entre o mar e o
pântano, mau grado a falta de infraestruturas e as ameaças à saú-
de pública; sendo que, neste contexto, a chegada da primeira
expedição de Obras Públicas, em 1877, testemunha a intenção
de organizar e controlar esse crescimento.
Urbanização, saneamento
e saúde pública
Chefiada por Joaquim José Machado (1847-1925), a equipa
das Obras Pública concentrou a sua ação em dois eixos fun-
damentais. Por um lado, as obras de drenagem do pântano,
de construção de diques para a contenção das águas e de um
primeiro sistema de esgotos para a parte baixa da cidade;
por outro, a elaboração de um plano de urbanização, con-
duzindo a expansão do núcleo urbano para as áreas mais altas
Fig. 1:
Projeto de ampliação da Cidade de Lourenço Marques.MajorAntónio JoséAraújo, 1887.
Direção Geral das Obras Públicas [9]