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mais, França deu início às negociações. O M.N.E. daquele
país contactou o M.N.E. português para indagar se aceita-
ria continuar no cargo, algo que o Governo francês veria
com agrado devido aos “relevantes serviços prestados” [50].
Adicionalmente, evitar-se-ia a apresentação de candidaturas
“que não ofereçam tantas garantias” [50].
Da mesma forma, a diplomacia inglesa entrou em contac-
to com as autoridades portuguesas através de Paul Henry
– antigo secretário-geral da C.C.T.A. e naquele período a
exercer como sub-diretor do Departamento de África do
Levante no Quai d’Orsay – que demonstrou satisfação numa
eventual reeleição de Cambournac [51].
Quando questionado sobre a hipótese de uma reeleição, ma-
nifestou-se disposto em ser reconduzido nas funções que já
estava a exercer.Assim, havendo disponibilidade do candida-
to, e dois promotores iniciais – Governos francês e inglês –,
eram necessários mais apoios que não tardaram em chegar,
através de diligências oficiais juntos dos outros Governos.
O candidato português viria a receber o apoio do governo
da Federação da Rodésia e Niassalândia [52], da União Sul
Africana [53], do governo espanhol [54,55], no caso de ha-
ver delegados da Nigéria e da Serra Leoa esses fariam parte
da delegação britânica e apoiariam este candidato [56], do
governo belga [57] e do governo do Ghana [58,59,60]. Foi
assim nomeado para continuar no cargo de diretor do
Bureau
Regional Africano da O.M.S. [61,62].
Durante o segundo período de atividade na Direção da
O.M.S.-África, Cambournac poderia ter interrompido o
seu mandato em dois momentos críticos e terminar as fun-
ções de Diretor regional. O primeiro momento surgiu em
maio de 1959, numa carta da Direção Geral dos Negócios
Políticos e da Administração Interna para o diretor geral da
Administração Política e Civil, na qual circulou a informação
de que o diretor-geral da O.M.S., Marcolino Gomes Candau
(1911-1983), pretendia, com alguma insistência, abandonar
funções em 1960. O ministro da Saúde eAssistência dizia ter
“fundadas esperanças” [63] na eleição de Cambournac para
o cargo de diretor-geral da agência. Se tal viesse a aconte-
cer, teria o
apoio do Secretariado e de várias delegações, e a
“oposição dos países do Bloco Soviético” [60], provavelmente
resultante de divergências políticas.Todavia, Marcolino Can-
dau manteve-se em funções durante um segundo mandato
como Diretor-geral da O.M.S. e uma proposta de candidatu-
ra à Direção Geral da Organização não aconteceu.
O segundo momento teve lugar em setembro de 1962, de
forma enigmática e pouco clara, sem que na documentação
consultada fossem encontrados elementos esclarecedores.
A Direção Geral dos Negócios Políticos e da Administração
Interna informou o diretor do Gabinete dos Negócios Políti-
cos da conversa ocorrida entre Cambournac e o embaixador
de Portugal em Brazaville, com o objetivo de dar a conhecer
aos ministros da Saúde e do Ultramar que “apesar de nada
haver de concreto podem eventualmente surgir no decurso
da reunião da O.M.S. circunstâncias que o levem a tomar
uma decisão que o liberte das suas funções, o que de forma
alguma corresponde porém à sua intenção” [64]. Desejava
prosseguir em funções no cargo de Diretor regional, porém
é clara a existência de uma tensão iminente que poderia ter
forçado uma decisão contra a sua vontade.
Apesar das contingências, Cambournac exerceu as funções
para as quais foi eleito até ao fim do seu mandato, vindo a
ser substituído no cargo por Alfred Quenum (1926-1984),
a partir de 1 de fevereiro de 1965. R.H. Bland iria assumir
funções até ao momento de chegada de Quenum [65].
Conclusão
A atividade de Cambournac, fundamentalmente dedicada ao
estudo e ao combate da malária, passou por várias etapas
que o levaram ao cargo de Diretor regional da O.M.S. para
África.A sua formação internacional em MedicinaTropical e
em malariologia conduziram-no a uma especialização cien-
tífica contextualizada em redes científicas da saúde pública
internacional e da qual faziam parte a Organização de Higie-
ne da Sociedade das Nações e a Fundação Rockeffeler. Em
Portugal, firmou-se como especialista em malária e doenças
tropicais ao assumir a Direção do Instituto de Malariologia e
o cargo de professor efetivo do Instituto de Medicina Tropi-
cal. O prestígio científico que adquiriu como malariologista
e epidemiologista nesta época, no contexto da saúde pública
nacional e internacional da medicina tropical, a partir dos
Institutos onde trabalhava, conjugado com a sua personali-
dade diplomática, constituiram um trajeto natural para o seu
lugar no Comité de Peritos do Paludismo da Organização
Mundial de Saúde.
Com mérito reconhecido nas agências internacionais, a
O.M.S. e a C.C.T.A., Cambournac surgiu como um can-
didato elegível para o cargo de Diretor regional da O.M.S.-
-África em 1952, proposto por vários Estados Membros. O
processo de nomeação envolveu várias conversas oficiosas
entre diplomáticos da política de saúde internacional, numa
iniciativa que partiu das delegações dos governos britânico
e francês, e que rapidamente acolheu o apoio dos restantes
Estados membros da O.M.S.. A escolha parece ter surgido
de forma consensual, assente na sua perícia e experiência, e
no seu alinhamento com a política da O.M.S. e das potências
coloniais para as questões de África. Sem sobressaltos surgiu
o apoio político de Portugal e as reacções institucionais ao
convite para o alto cargo daquela Organização. Dos Minis-
térios que tutelavam os vários serviços onde o especialista
actuava foi dada a autorização imediata. Do mesmo modo, a
Direção do I.M.T. autorizou a libertação de funções do pro-
fessor da instituição, porém com alguma hesitação, a avaliar
pela forma como Fraga de Azevedo deu o seu aval para o
libertar das funções docentes e de investigação.
Para Cambournac, o cargo de Diretor regional da O.M.S.
em África correspondia a uma continuidade coerente com
Políticas e redes internacionais de saúde pública no século XX