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1. Regulação e conhecimento

A regulação, enquanto forma de intervenção pública nas ati-

vidades económicas através da imposição de regras que visam

modificar o comportamento económico de indivíduos e em-

presas, surgiu no setor da saúde associada ao reconhecimen-

to de que este setor tem especificidades que o distinguem

de outros mercados de bens e serviços. Tais especificidades

verificam-se não só ao nível do comportamento dos agentes

e das relações económicas que entre eles se estabelecem, mas

decorrem também da importância social conferida à saúde.

Um conjunto de falhas nos mercados da saúde, tais como a

assimetria de informação entre prestadores e utentes, o con-

texto de incerteza em que ocorre a prestação de cuidados de

saúde, ou as decisões de consumo baseadas numa relação de

agência entre profissional de saúde e utente, implicam que o

livre funcionamento dos mecanismos de mercado não garan-

ta resultados satisfatórios. A regulação da saúde visa, assim,

compensar essas falhas através do condicionamento da con-

duta dos agentes económicos e de mecanismos de defesa dos

direitos dos consumidores.

Para ser possível concretizar uma intervenção pública regu-

latória que cumpra este objetivo, o elemento-chave é o co-

nhecimento. Com efeito, uma intervenção nos mercados que

produza efeitos positivos, tem necessariamente que partir

de um profundo conhecimento sobre a organização e o fun-

cionamento do sistema de saúde (o que passa por analisar as

estruturas, os processos e os resultados desse sistema), mas

também os incentivos de empresas e profissionais, as prefe-

rências e a satisfação dos utentes, e não menos importante,

as escolhas estratégicas dos decisores políticos. Tal conheci-

mento não está,

a priori

, reunido e sintetizado de forma a

ser utilizado na formulação de atos de regulação. E por esse

motivo, uma atividade fundamental de qualquer instituição

com competências de regulação consiste em conduzir e/ou

promover a investigação necessária à produção do conheci-

mento sobre todas aquelas questões.Acresce que a amplitude

concreta desta investigação

varia grandemente de uns

setores de atividade para

outros, devido a diferen-

tes graus de maturidade

na produção de estatísticas

oficiais e de investigação

nos meios académicos. No

caso particular do setor da

saúde em Portugal, a enti-

dade reguladora tem a ne-

cessidade de, relativamente

a muitos dos temas investi-

gados, efetuar a recolha de

informação e a produção de

estatísticas

ad novo

, o que

contrasta, por exemplo,

com o setor dos serviços financeiros, sobre o qual há hoje um

histórico grande de publicação de estatísticas e de produção

de investigação.

Estando, então, afirmada a imprescindibilidade da investi-

gação para a geração de conhecimento, importa explicar de

que forma tal conhecimento pode ser usado para sustentar a

intervenção regulatória. De um modo geral, o conhecimento

que resulta da investigação sobre a organização, o funciona-

mento e os agentes dos mercados, por parte de uma entidade

reguladora, é fundamental para direcionar correctamente as

atividades de supervisão comportamental dos regulados, mas

também para o desenho de intervenções regulatórias que vi-

sam moldar o comportamento dos agentes, como é o caso

da emissão de regulamentação, instruções e recomendações.

Por outro lado, as entidades reguladoras têm especiais obri-

gações de promover a disseminação de informação sobre o

setor regulado junto dos agentes interessados e da sociedade

em geral, dessa forma procurando promover a diminuição de

assimetrias de informação. E finalmente, as entidades regu-

ladoras têm um papel importante na produção de conheci-

mento que sirva de base à decisão política, propiciando uma

ponderação de um conjunto alargado de aspetos que (quase

sempre) apenas o regulador tem capacidade de apreender.

2. A Entidade Reguladora da Saúde

A Entidade Reguladora da Saúde (ERS) é o organismo pú-

blico com natureza de entidade administrativa independen-

te a quem compete a regulação da prestação de cuidados de

saúde em Portugal. Em conformidade com os seus estatutos,

aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto,

a ERS tem por missão a regulação da atividade dos estabele-

cimentos prestadores de cuidados de saúde, e as suas atribui-

ções compreendem a supervisão desses estabelecimentos no

que respeita ao cumprimento dos requisitos de exercício da

atividade e de funcionamento, incluindo o licenciamento dos

Controlo dos requisitos de funcionamento

Proceder ao registo público obrigatório dos prestadores

Instruir e decidir os pedidos de licenciamento, realizando as vistorias necessárias

Defesa dos direitos dos utentes

Tratar as reclamações dos utentes dos prestadores dos setores público, privado e social

Prestar informação, orientação e apoio aos utentes dos serviços de saúde

Supervisão da conduta dos prestadores

Investigar os indícios de má conduta dos prestadores no âmbito de processos de inquérito e de processos de contra ordenação

Aplicar sanções por má conduta dos prestadores (admoestações, coimas e suspensão de estabelecimentos)

Emitir instruções e recomendações aos prestadores

Realizar ações de fiscalização e auditorias

Avaliação da qualidade dos cuidados de saúde

Avaliar a qualidade dos cuidados de saúde (no âmbito do Sistema Nacional de Avaliação em Saúde)

Regulação económica do setor da saúde

Realizar estudos e pareceres sobre acesso, concorrência, qualidade, organização e eficiência do sistema de saúde

Resolução de conflitos

Mediar os conflitos entre financiadores e prestadores

Mediar os conflitos entre prestadores e utentes

Tabela 1

– Principais atividades de regulação da ERS, por áreas de atuação

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