37
A n a i s d o I HM T
mensagem real. Neste caso a fotografia e a amostragem
do “nós” surge aliada a outro instrumento da força da
medicina europeia, protagonizada pelo microscópio (cf.
Figura 7).
Corpos Expostos
Muitas fotografias revelam a vulnerabilidade de corpos
expostos em pose (da mulher, do homem, da criança),
sem roupas, corpos dóceis e passivos, tornando-os dis-
poníveis aos olhares das muitas pessoas que entram no
circuito da sua difusão, deixam transparecer uma assime-
tria de poder, inerente numa relação colonial. Estes cor-
pos em pose são indutores de associações de ideias [38]
- corpo indígena = selvagem/ exótico – e valorização do
papel colonial.
Estes corpos, objecto de curiosidade do olhar popu-
lar e científico (antropologia e medicina), assumiam-se
como suficientemente diferentes e exóticos para ser ins-
peccionados livremente, eram pertença de colonizados
que não tinham nome, voz ou opinião para contestar a
exposição e o devastar visual do seu corpo. Esta prática
configura-se em ver o outro como um ser exótico, que
vive numa espécie de “zoo humano” e que a objectiva do
europeu pretende captar. O “outro” é fotografado na sua
condição de sujeito alvo da “missão civilizadora” em pose
de perfeita disciplina [37]. Há a construção do “outro”
colonizado, emergindo a fotografia como metáfora da or-
dem colonial, na exacta medida entre quem fotografa e
quem é fotografado, entre quem vê e é visto, entre quem
controla e vigia e é controlado e vigiado.
Outra questão é o modo como o olhar do fotógrafo tem
legitimidade para olhar o corpo desnudado da mulher.
Tal como o fotógrafo encontrava legitimidade para olhar
para o corpo da mulher nativa, também o leitor-espec-
tador masculino o podia fazer, partilhando os valores de
supremacia colonial [23]. Outra metáfora da assimetria
de poder.
Domínio do Outro/ Panóptico
Vigiar e classificar, são formas de controlo social, que opera
pela aquisição e organização da informação. A informação e
conhecimento são adquiridos pela observação. Conhecer é
poder.A missão configura-se como um panóptico, como um
mecanismo de vigilância, um olhar dos que se encontram
em posições privilegiadas na estrutura social, para quem o
mundo se afigura como um espectáculo, um palco, uma per-
Fig. 7 -
Trabalho de
Campo, no estudo da
Ancilostomíase (1964).
BCGP XIX (76): 449
Fig. 8 -
Sequência de Imagens relacionadas com a vigilância da
Ancilostomíase (1948). BCGPVol. III (12): 964 (estampas)