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situações de urgência/agudas. Também entre

profissionais se verificaram opiniões díspares

sendo que, comparativamente aos médicos e

enfermeiros, os administrativos consideraram,

como menos frequente, os imigrantes utilizarem os

serviços

para

consultas

de

enfermagem/tratamentos, de saúde sexual e

reprodutiva, materna e infantil. Estas diferenças

parecem resultar de uma possível valorização

destas questões de saúde pelos médicos e

enfermeiros.

Neste estudo, foram também analisadas as

perceções dos participantes sobre dificuldades que

consideram existir no contexto da utilização dos

serviços. Os resultados obtidos podem ser

interpretados à luz do modelo conceptual de

Andersen sobre o uso dos serviços de saúde

(Andersen, 1995). De facto, este modelo tem-se

constituído uma ferramenta útil para selecionar,

identificar e sequenciar as variáveis relevantes no

processo de utilização dos serviços, quer pela

população em geral, quer por populações

imigrantes (Scheppers

et al.

, 2006).

Por um lado, ambos os grupos foram

consensuais ao referir maioritariamente as

barreiras de nível individual, como falta de

recursos económicos e desconhecimento dos

imigrantes sobre as questões legais do acesso à

saúde enquanto aspetos que dificultam a utilização

dos serviços, como se encontra noutros estudos

(Anderson

et al.

, 2003; Dias

et al.

, 2008; Leduc e

Proulx, 2004). Da parte dos profissionais, a ênfase

dada aos aspetos relacionados com o utente

imigrante como dificultadores da utilização dos

serviços pode refletir alguma atitude associada a

estereótipos em relação à população imigrante

(Dias

et al.

, 2012). Por outro lado, a convergência

de perceções parece realçar que esta é uma área

prioritária de intervenção.

Os aspetos da interação com os profissionais,

como dificuldades linguísticas e sentimento de

desconfiança em relação aos mesmos, foram

realçados pelos imigrantes mas não foram

valorizados pelos profissionais. Estes resultados

podem indicar, à semelhança de estudos anteriores,

que os profissionais tendem a subvalorizar a

qualidade de aspetos não técnicos dos cuidados de

saúde, como a comunicação e as relações

interpessoais

(Durieux

et

al.

,

2004).

Adicionalmente, os resultados obtidos são

coincidentes com investigações anteriores em que

os profissionais revelam uma reduzida perceção da

relevância do seu papel e dos serviços na melhoria

do acesso e utilização dos serviços por parte das

comunidades imigrantes (Dias

et al.

, 2010). A

desvalorização da comunicação e das relações

interpessoais na prestação de cuidados pode afetar

a qualidade da interação profissional-utente,

podendo resultar em insatisfação dos utentes

quanto aos serviços e, consequentemente, em

menor utilização (Anderson

et al.

, 2003; Junge

et

al.

, 2002). Estes dados indiciam que esta é uma

área de atuação com oportunidades potenciais para

melhoria da prestação de cuidados. Neste contexto,

torna-se necessário sensibilizar os profissionais e

incentivar a mudança do seu desempenho

profissional, no sentido de uma abordagem

holística e inclusiva.

Outros aspetos considerados diferentemente

pelos participantes incluíram questões relacionadas

com mitos, crenças, tradições religiosas e culturais

dos imigrantes, que foram apontadas como

dificuldades, principalmente pelos profissionais.

Esta perceção pode traduzir-se na necessidade

sentida pelos profissionais, e consequente

oportunidade de ação, de maior conhecimento e

competências para lidar com a diversidade cultural

que, atualmente, caracteriza a população utente dos

serviços. No mesmo sentido apontam os resultados

obtidos sobre a perceção dos profissionais de que

existem algumas lacunas nos conhecimentos e

competências para lidar com as populações

imigrantes e de que a formação na área da saúde e

imigração é importante.

Importa assinalar que, entre os grupos de

profissionais, surgiram discrepâncias sobre o peso

das diferenças linguísticas e dos mitos, crenças,

tradições religiosas e culturais enquanto barreiras à

utilização dos serviços. Grande parte dos médicos

e enfermeiros indicou que estes aspetos dificultam

o acesso, ao contrário dos administrativos, que,

mais frequentemente discordaram. De forma geral,

as diferentes perceções encontradas nos grupos

profissionais podem, em parte, explicar-se pelas

funções singulares que cada grupo desempenha e

com as suas experiências e contactos específicos

com imigrantes. Assim, torna-se saliente a

necessidade de que as estratégias de capacitação

dos profissionais de saúde para lidar com a

diversidade cultural considerem as especificidades

e necessidades associadas aos diferentes perfis

profissionais.

Este estudo apresenta algumas limitações. Os

dados obtidos por parte dos profissionais de saúde

não se referem aos cuidados prestados a utentes

específicos, mas sim às suas perceções relativas ao

atendimento a populações imigrantes. Da mesma

forma, não é possível conhecer os profissionais de

saúde a que se referem os imigrantes nas suas

respostas. Isto impossibilita o estabelecimento de