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Introdução

Este artigo tem por objetivo apresentar o território dos leprosos

situado emAnápolis nos anos 1930 - 1970. Para tanto, realizou-

-se levantamento bibliográfico, coleta e análise de relatos orais e

imagens fotográficas. Por meio da análise dos dados percebeu-

-se que poucos estudos haviam sido feitos sobre os leprosos re-

sidentes na cidade e período mencionado, talvez por se tratar de

“personagens escondidos”, [1], inserido num território também

escondido.

Cabe ressaltar que no campo dos estudos geográficos o conceito

de território inicialmente atrelou-se a ideia de matéria inerte,

circundada por fronteiras, na qual o poder se estabelece. Neste

caso, [2], desde o nascimento do Estado territorial (Sec. XIX) a

sociedade é deixada de lado, com se existisse uma cisão entre, de

um lado, as materialidades e, de outro, ações sociais.

O conceito de território modificou-se e, consequentemente,

suas conceções temporais e espaciais também. No cenário atual

discute-se o território construído e desconstruído dentro de es-

calas temporais (séculos, décadas, anos, meses ou dias); o seu

caráter permanente; sua existência periódica cíclica (contínuo

ou descontínuo); e espacialidade móvel [3].

O território [4] também aparece em outras perspetivas: parcial,

integradora, relacional e multiterritorial. Para o autor a perspe-

tiva parcial diz respeito ao entendimento político, cultural, eco-

nómico e naturalista, cada qual percebido de forma isolada. Na

integradora o território é entendido como revelador de parte

ou de todas as dimensões sociais, seja económica, política, cul-

tural. Na relacional o território é entendido como movimento,

fluidez, interconexão proporcionando o processo de territoriali-

zação/desterritorialização/reterritorialização. E, por último, na

perspetiva da multiterritorialidade pode-se considerá-la como

as diferentes formas como o território

se apresenta dentro do espaço, ou ainda,

como um processo constante de reterri-

torialização.

Outro expoente na discussão do concei-

to foi Milton Santos. Para ele o território

só se torna um conceito utilizável para a

análise social quando o consideramos a

partir do seu uso, a partir do momento

em que o pensamos juntamente com

aqueles atores que dele se utilizam [5].

Pensar o território usado é pensar a ter-

ritorialidade, pois envolve considerar as

relações económicas, sociais, culturais e

políticas, bem como também, questões

espaciais e temporais. Ele é o espaço

onde forças sociais se utilizam de meca-

nismo de inclusão e exclusão e é espaço

de poder, de ação e de resistência. Por-

tanto a territorialidade se materializa por

meio das ações humanas.O território é a

forma e o seu uso são as ações.

Outra estudiosa do assunto [6] nos diz: a cada período, vivemos

um tempo concreto, feito de possibilidades concretas à disposi-

ção dos atores. Escolhidas, tais possibilidades tornam-se existen-

ciais, às quais podemos chamar território usado, mas os atores

têm força diferente, que advém, entre outras coisas, das suas

interpretações sobre as possibilidades do

período.As

temporali-

dades são, portanto, visões do tempo, visões do período, que se

fazem com recursos e constrangimentos, como a informação, a

educação, o acesso às coisas e às ideias ou sua falta, as limitações

de classe, entre outros. É uma interpretação do período e a pro-

dução de uma territorialidade.Vemos o mundo a partir de nosso

sentido de pertencimento.

Neste sentido acrescenta-se ao conceito de territorialidade o

sentimento de pertencimento. Tal sentimento é desigual entre

os atores do território por causa da diversidade de situações

existenciais. Diante do exposto, este artigo busca responder às

seguintes perguntas: como se formou o território do refúgio?

Quem são os atores que usam o território do refúgio? Como

esses atores interpretam sua territorialidade?

Território da lepra

A cidade deAnápolis se localiza na porção centro oeste do ter-

ritório brasileiro, conforme a figura 1, sua história se remete

ao início do século XX, sendo que nos anos de 1930, atraiu

migrantes devido ao desenvolvimento económico ocasionado

especialmente pela instalação da seção da estrada de ferro, es-

tabelecendo a cidade como base para a expansão e interiori-

zação do Brasil.

Os imigrantes que estabeleceram residência em Anápolis nos

anos 1930 vieram de diferentes estados brasileiros ou de outras

Fig. 1:

Localização da cidade deAnápolis na região Centro Oeste do Brasil

Doenças, agentes patogénicos, atores, instituições e visões da medicina tropical