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A n a i s d o I HM T
venção da medicina legal paulista. Seguindo o livro-texto de
Flaminio Favero, podemos verificar que a ceroplastia de Au-
gusto Esteves deu concretude ao “programa” proposto por
aquele médico para a medicina legal paulista. Quase todos
os temas foram abrangidos, sem esgotá-los, pela ceroplastia.
Apenas a hematologia, a criminologia, a psicopatologia, a
medicina profissional e a ética médica não foram contempla-
das, por tratarem de questões eminentemente teóricas. Mas
o resto ganhou forma através da ceroplastia.
Conclusões
Procuramos indicar os usos e a importância da ceroplastia
na consolidação da dermatologia e da medicina legal em São
Paulo. Não há como apurar todas as formas de utilização das
peças, mas ficou evidente que sua função precípua era di-
dática. Durante vários anos, elas foram utilizadas nas aulas
de dermatologia e medicina legal.Augusto Esteves produziu
também outros tipos de material didático, tal como pranchas
(desenhos e gravuras) para o ensino de aspetos da medicina
forense.
O uso museológico veio bem mais tarde. Em 1980, por
iniciativa de Carlos Silva Lacaz (1915-2002), diretor da Fa-
culdade de Medicina entre 1974 e 1978 e idealizador do
Museu do Museu Histórico da Faculdade, criou-se o Museu
Ceroplástico Augusto Esteves, composto pelas peças produ-
zidas na cátedra de dermatologia. Anos depois, por conta de
reformas no prédio da Faculdade de Medicina, a exposição
foi desmontada e as peças foram armazenadas por Lacaz no
Museu da Faculdade de Medicina, onde ainda hoje perma-
necem.
As peças revelam a intenção de intervir na sociedade e tor-
nam concretos quais seriam os objetos desta intervenção. Do
ponto de vista histórico, cremos que este é o aspeto mais
relevante que emerge do estudo das peças ceroplásticas.
Mesmo tendo perdido o seu papel didático e relegadas ao
esquecimento, as peças ceroplásticas ganham hoje relevân-
cia dentro do campo da história da ciência. Como indicava
Schnalke [16] há mais de uma década, as coleções ceroplásti-
cas foram recuperadas e transformadas em objeto de estudo
de historiadores da ciência e da medicina, que nelas viram
importantes fontes para a compreensão da formação das es-
pecialidades médicas e da representação do corpo e de suas
doenças.
4 - Em 1922 houve a Primeira Conferência Paulista de Medicina Legal e Crimino-
logia. Em 1937 ocorreu a Primeira Semana Paulista de Medicina Legal.A Segunda
Semana foi realizada três anos depois, em 1940.
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