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Generalitat de Catalunya - Departament de Salut 2010).
Em Portugal não existe um rastreio sistemático em grávidas
de risco (World Health Organization 2009b)
.
A percenta-
gem mais representativa de nados vivos filhos de mães com
nacionalidade estrangeira em Portugal no ano de 2009 cor-
respondia à nacionalidade brasileira com um total de 3 786
recém-nascidos, representando 3,81% dos nascimentos em
Portugal de filhos de mães estrangeiras nesse ano (Instituto
Nacional de Estatística 2010). Tendo em conta estes dados,
encontra-se em curso, desde 2011, um estudo epidemioló-
gico piloto para detecção de grávidas infectadas por
T. cruzi
em três maternidades da grande Lisboa, até à data sem casos
positivos (Ferrão
et al
. em preparação).
Características clínicas e imunológicas da doença e
problemas do diagnóstico
Existem manifestações clínicas na fase aguda e na fase cróni-
ca da doença; no entanto a maioria dos doentes apresenta-se
oligossintomática ou assintomática e não sabe estar infectada
(Dias
et al.
1956). Em área endémica, a fase aguda tende a
ocorrer nos primeiros anos de vida, sendo verificados sinto-
mas inespecíficos como febre, mal-estar geral, dores mus-
culares, anorexia, e em alguns casos diarreia e vómitos. Há
geralmente edema, aumento dos nódulos linfáticos, hepato-
megália e esplenomegália, configurando na maioria das vezes
um sindroma de mononucleose (WHO Expert Committee
2002).
Após a infecção aguda verifica-se uma grande diminuição do
número de parasitas em circulação e este é encontrado prin-
cipalmente na sua forma intracelular nos órgãos alvo: cora-
ção, sistema nervoso central, sistema nervoso autónomo, e
sistema digestivo (WHO Expert Committee 2002). A per-
sistência do parasita nestes órgãos, associada a determinados
tipos de resposta imune poderá levar a complicações cardí-
acas e digestivas décadas depois, na fase crónica da doença
(WHO Expert Committee 2002;Ayo, 2013).
A fase indeterminada corresponde a um período prolonga-
do de aparente cura clínica durante o qual a doença progri-
de silenciosa e sub-repticiamente (Laranja
et al
. 1948). O
aparecimento de variadas lesões em órgãos internos, prin-
cipalmente no coração, pode levar à ocorrência de morte
súbita por arritmia cardíaca. É nesta fase que se encontram a
maioria dos doentes, geralmente sem sabê-lo (World Health
Organization 2010; Junior
et al.
2001).
A fase crónica sintomática da doença de Chagas ocorre cerca
de 10 a 30 anos após a infecção inicial (Rassi & Marin-Neto
2010). Após vários anos de uma fase assintomática, conside-
ra-se que cerca de 20% a 30% dos doentes poderão desen-
volver sintomas cardíacos, ao passo que cerca de 5% a 10%
poderão desenvolver sintomas digestivos. A Miocardiopatia
Crónica Chagásica (MCC) resulta numa insuficiência cardí-
aca progressiva, acompanhada de arritmias severas e fenó-
menos trombo-embólicos, inclusive para o Sistema Nervoso
Central. O atingimento digestivo resulta em denervação,
principalmente dos segmentos terminais do esófago e có-
lon, a montante dos quais se estabelecem grandes dilatações
(megaesófago e megacólon chagásicos). (World Health Or-
ganization 2009a).
Não existe até hoje uma técnica que seja considerada de re-
ferência para o diagnóstico da doença de Chagas, em especial
na fase crónica (Flores-chávez
et al
. 2007; Otani
et al.
2009).
No entanto, a OMS preconiza que um diagnóstico definitivo
nesta fase da doença é aceite se dois testes serológicos di-
ferentes de detecção de anticorpos revelarem um resultado
positivo, funcionando o primeiro como teste de rastreio e o
segundo como teste confirmatório (WHO Expert Commit-
tee 2002).
Em caso de suspeita de doença aguda considera-se útil
a realização de exame a fresco ou corado de esfregaço de
sangue, para observação directa do parasita (WHO Expert
Committee 2002). A
Polimerase Chain Reaction
(PCR) pode-
rá ser aplicada na fase aguda ou para detecção de infecção
congénita (Fondation Merieux &World Health Organization
2008), embora na fase crónica a precisão deste método seja
limitada, devido à baixa parasitémia que existe nessa fase da
doença (Otani
et al.
2009). São utilizados actualmente para
a fase crónica da doença testes de Hemaglutinação Indirec-
ta (HAI), Imunofluorescência Indirecta (IFI) e
Enzyme-linked
Immunosorbent Assay
(ELISA) (WHO Expert Committee
2002).A reactividade cruzada de alguns pacientes infectados
com
Leishmania spp.
,
Trypanosoma rangeli
(não patogénico) e
Plasmodium spp.
está bem estabelecida, devendo este ser um
factor a ter em consideração na escolha do teste serológico
mais adequado para uma determinada população (WHO Ex-
pert Committee 2002; Flores-Chávez
et al.
2009).
A terapêutica da doença de Chagas
Para o tratamento etiológico da doença de Chagas existem
em utilização dois derivados nitroimidazólicos, tripanocidas,
o Nifurtimox e o Benznidazol (Villar
et al.
2009), que foram
inicialmente testados em casos de fase aguda, e mais tarde na
fase crónica (World Health Organization 2007). O seu uso
está associado a efeitos adversos importantes e severos; estão
contra-indicados na gravidez e na insuficiência hepática e re-
nal. Sabe-se actualmente que os efeitos adversos de ambos os
fármacos são mais frequentes e graves em indivíduos adultos
(World Health Organization 2007).
Ambos os fármacos são razoavelmente eficazes na fase aguda
da patologia (entre 58 e 76% de cura parasitológica), mas a
sua eficácia diminui à medida que a doença se torna crónica.
No entanto, sabe-se que podem eventualmente diminuir a
carga parasitária na fase indeterminada e crónica inicial da
doença, de forma a impedir a sua evolução e prevenir com-
plicações (Villar
et al
. 2009;Viotti
et al,
2011).
Artigo Original