186
O ENSINO EM SAÚDE PÚBLICA NO INSTITUTO DE HIGIENE E MEDICINA
TROPICAL DE LISBOA, 1902-2012
PAULO FERRINHO
SÓNIA DIAS
ZULMIRA HARTZ
Instituto de Higiene e Medicina Tropical, Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, Portugal.
:
PFerrinho@ihmt.unl.pt (Paulo Ferrinho).
RESUMO
Este artigo apresenta uma descrição sumária da longa tradição e
evolução do ensino da Saúde Pública no Instituto de Higiene e
Medicina Tropical (IHMT), que emergiram de uma atividade
integrada da oferta docente da Escola de Medicina Tropical e dos
institutos que se lhe seguiram. Essa oferta colaborat iva manteve-seao
longo de mais de um século e multiplicou-se numa atividade docente
em saúde pública alicerçada numa forte agenda de investigação, que
foi crescendo através da realização de cursos para programas de
mestrado e doutoramento, bem como de uma forte oferta decursosde
apoio ao desenvolvimento, orientados para a saúde públicacomoação
coletiva para desenvolver as condições que permitem uma vida
saudável no seio das comunidades em que vivemos. Esta açãocoletiva
está implicada naquilo que a saúde pública faz melhor: a medição do
estado de saúde, a organização e gestão de serviços e programas de
saúde, o desenvolvimento de recursos humanos em saúde,apromoção
da saúde e a intervenção em grupos populacionais específicos.
O grupo multidisciplinar de docentes e investigadores de saúdepública
do IHMT tem assumido protagonismo não só no trabalho
desenvolvido sobre problemáticas prioritárias de saúde, mastambém
na influência nas políticas de saúde, no contexto português e
internacional, em especial em vários países africanos (Angola,Cabo
Verde, Guiné-Bissau e Moçambique), bem como nas organizações
internacionais, nomeadamente a União Europeia, a OMS (único
Centro colaborador da OMSem Portugal para políticaseplaneamento
da força de trabalho em saúde), Banco Mundial e CPLP.
SUMMARY
This article presents a summary description of the long traditionand
evolution of Public Health education at the Instituto de Higiene e
Medicina Tropical (IHMT) that has emerged from an integrated
activity of the teaching offer at the School of Tropical Medicineand
at the subsequent institutes. That collaborative offerremainedforover
a century and resulted in a teaching activity grounded in a strong
research agenda, which grewthrough courses for masters anddoctoral
programs, and through a wide range of courses for development
assistance, oriented to public health as a collective action to develop
the conditions that promote healthy life in the communitieswelivein.
This collective action is implicated in what public health doesbetter:
assessment of the health status, the organization andmanagementof
health programs and services, the development of humanresourcesfor
health, health promotion and theintervention in specificpopulations.
The multidisciplinary group of teachers and researchers of public
health in IHMT has been in the forefront of works in priorityhealth
problems, but also in influencing health policies in the Portugueseand
international contexts, particularly in many Africancountries(Angola,
Cape Verde, Guinea-Bissau and Mozambique), as well as in
international organizations, namely the EU, WHO (the only WHO
Collaborating Center in Portugal for health workforce, policy and
planning), the World Bank and CPLP.
INTRODUÇÃO
Em 1901, Aníbal Bettencourt (1868-1930),
médico diretor do Instituto Bacteriológico de
Lisboa (criado em 1892), foi responsável pela
primeira missão científica portuguesa enviada aos
trópicos para, especificamente, estudar uma doença
tropical - a doença do sono. Tal missão ajudou a
reforçar a iniciativa, com o apoio de médicos
ilustres, de entre os quais destacamos Miguel
Bombarda (1851-1910) e Egas Moniz (1874-
1955), e sob proposta de António Duarte Ramada
Curto (1848-1921), de implantar um instituto de
medicina tropical em Lisboa (Abranches, 2004;
Amaral, 2008 e 2010;
Bastos, 2007;
Fraga de
Azevedo, 1952; Pita e Pereira, 2010; Torgal, 2002).
Esta iniciativa coincidiu com o reforço da presença
portuguesa nos territórios do império e beneficiou
da reforma sanitária de Passos Manuel (1801-1862)
e de uma “explosão de conhecimento” sobre
germes como causas de doenças, iniciada por Louis
Pasteur (1822-1895). Tal como para outros países
europeus, revolucionou a saúde pública em
Portugal, levando à instalação, em 1881, do
antecessor do Instituto Nacional de Saúde, o
Laboratório Central de Higiene, que passou a
Instituto Central de Higiene, em 1899, e que, em
1902, data da sua inauguração, ofereceu o seu
primeiro curso - Curso de Medicina Sanitária para
médicos do Corpo de Saúde, em 1929. Nesse ano,
o Instituto Central de Higiene adicionou “Dr.
Ricardo Jorge” ao nome, passando, em 1945, a
denominar-se “Instituto Superior de Higiene Dr.
Ricardo Jorge” (Abranches, 2004).
A Marinha foi também importantíssima na
implantação sanitária no ultramar (Ferrinho
et al.
,
2012). Nada mais apropriado, portanto, do que, em
agosto de 1887, ter sido publicada uma carta régia
autorizando a reforma dos cursos da Escola
Naval, onde ficaria acolhido o ensino da medicina
tropical. Em novembro do mesmo ano, um decreto
do Rei D. Luís (1838-1889) detalhava o plano da
reforma. São referidos seis cursos, sendo o 4º o
Curso Complementar para Facultativos Navais.