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se refere à utilização efetiva dos recursos
disponíveis e satisfação quanto a esses serviços
(Andersen, 1995). Nesta perspetiva, o acesso e
utilização dos serviços de saúde, bem como a
satisfação dos utilizadores, resultam da interação
entre as características do indivíduo e dos serviços
(incluindo os profissionais de saúde) (Andersen,
1995).
Estudos desenvolvidos com vista a identificar
padrões de procura de cuidados de saúde pelas
comunidades imigrantes indicam que, muitas
vezes, a utilização dos serviços por parte destas
comunidades modifica-se progressivamente com o
aumento do tempo de residência, desde a não
utilização ou utilização ocasional dos serviços de
emergência até à utilização regular dos serviços de
cuidados de saúde primários (Gonçalves
et al.
,
2003; Norredam
et al.
, 2004). Num estudo
realizado com imigrantes em Portugal, cerca de
77% reportou já ter utilizado o Serviço Nacional de
Saúde e, destes, quando questionados sobre o
primeiro serviço a que recorreram, 49,5% referiu o
centro de saúde e 32,5% referiu o hospital (Dias
et
al.
, 2011). Investigações apontam também no
sentido de que o acesso e utilização dos serviços
pelas populações imigrantes são, muitas vezes,
dificultados pela presença de barreiras de ordem
legislativa, estrutural, organizativa, económica,
cultural e linguística (Scheppers
et al.
, 2006).
Atualmente, reconhece-se que a utilização dos
serviços de saúde resulta da interação entre as
características do indivíduo, dos profissionais de
saúde e do sistema de saúde (Dutton, 1986). Com
vista a aprofundar o conhecimento sobre estes
diferentes fatores, têm vindo a ser desenvolvidos
estudos quer com as comunidades imigrantes, quer
com os próprios profissionais de saúde (Gonçalves
et al.
, 2003; Leduc e Proulx, 2004;
Scheppers
et al.
, 2006). Um estudo conduzido
recentemente pela nossa equipa revelou que nunca
ter utilizado os serviços de saúde foimais frequente
entre os homens, os imigrantes provenientes de
países da Europa de Leste e os que têm estatuto
irregular de imigração (Dias
et al.
, 2011). Outros
estudos salientam a influência de fatores ao nível
da relação entre profissional de saúde e utente,
nomeadamente as atitudes negativas dos
profissionais face aos imigrantes (Dias
et al.
, 2012;
Durieux
et al.
, 2004), e de fatores ao nível dos
serviços de saúde (procedimentos burocráticos,
custo, horários) (Dias
et al.
, 2008; Jones
et al.
,
2002).
A complexidade dos determinantes de saúde no
contexto da imigração e a falta de dados
consistentes sobre estas temáticas levam a que
ainda persistam lacunas no conhecimento. Neste
contexto, o desenvolvimento de estudos na área é
relevante, dada a necessidade de tornar os serviços
de saúde e os profissionais mais adaptados à
crescente diversidade cultural e operacionalizar os
princípios da equidade em saúde. O estudo que se
apresenta pretende descrever as perceções de
imigrantes e de profissionais de saúde sobre
questões relacionadas com a procura de cuidados
de saúde e dificuldades na utilização dos serviços
por parte das populações imigrantes, procurando
identificar as concordâncias e discrepâncias nas
perceções entre os grupos. Este conhecimento pode
contribuir para identificação de necessidades
específicas e para a decisão informada no
desenvolvimento de políticas e estratégias de
promoção do acesso e utilização dos serviços e de
adequação da prestação de cuidados de saúde aos
imigrantes.
MATERIAIS E MÉTODOS
O estudo presente insere-se no projeto de
investigação “Atitudes e representações face à
saúde e doença e acesso aos cuidados de saúde nas
populações imigrantes: Em direção a serviços de
saúde amigos dos imigrantes”, promovido pelo
Instituto de Higiene e Medicina Tropical, em
parceria com a Administração Regional de Saúde
de Lisboa e Vale do Tejo (ARS LVT) e outras
instituições
académicas.
Neste
projeto,
desenvolveram-se dois estudos quantitativos, que
consistiram na aplicação de um inquérito por
questionário a imigrantes residentes em Portugal e
a profissionais dos serviços de cuidados de saúde
primários da região de Lisboa e Vale do Tejo.
Estudo com imigrantes
Realizou-se um estudo transversal na área
metropolitana de Lisboa, localidade que,
atualmente, apresenta a maior concentração de
populações imigrantes do país (SEF, 2012). O
estudo consistiu na aplicação de um inquérito, por
questionário, a uma amostra de 1372 imigrantes
(51,1% mulheres; 38% do Brasil, 32,6% de países
africanos de língua oficial portuguesa e 29,4% de
países da Europa de Leste).
Os participantes foram selecionados através do
método de amostragem “bola-de-neve” (Atkinson
e Flint, 2001). Neste processo, estiveram
envolvidas organizações não-governamentais e
associações de imigrantes das comunidades em
estudo, que colaboraram com a equipa de
investigação na divulgação do estudo junto das