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“curar os enfermos”

e

“enterrar os mortos”

(Rasteiro, 2002).

As Misericórdias estabeleceram-se rapidamente

nas ilhas e no ultramar, ao ritmo da evolução do

império, como um dos seus elementos

institucionais mais marcantes: nos Açores e em

Cabo Verde a partir de 1498, no norte de África

desde 1502, na Madeira a partir de 1511, na costa

oriental de África em 1569 (Abreu, 2007).

A assistência hospitalar oferecida pelas

Misericórdias foi, muitas vezes, a única disponível

para as populações do mundo colonial português,

dado que aquela assistência não era considerada

como responsabilidade dos municípios ou da

Coroa, mas sim como uma obra de caridade da

Igreja, das irmandades e das ordens religiosas.

(Gonçalves Ferreira, 1982). Esse trabalho

meritório das Misericórdias expandiu-se e levou a

que, ainda hoje, existam centenas delas espalhadas

pelo mundo. Contabilizam-se 886, sendo cerca de

metade (464) no Brasil e 402 noutros territórios

(Portugal, Espanha, Itália, França, Luxemburgo,

Índia, Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe

e Venezuela) (Melícias, 1998).

DO ILUMINISMO E REFORMA POMBALINA

À INDEPENDÊNCIA DO BRASIL

A dinastia filipina abalou o império, com a

presença portuguesa em África ameaçada pelas

nações hegemónicas da época. Com a Restauração,

em 1640, a atenção da política colonial desviou-se

mais para o Brasil. Em Portugal, com Sebastião

José de Carvalho e Melo (1699-1782), o Marquês

de Pombal, absorveu-se o Iluminismo e, por outro

lado, reforçou-se o absolutismo: Perseguiu os

jesuítas e expulsou-os de Portugal; empreendeu

reformas de âmbito administrativo, económico e

cultural. A partir da década de 1770, avançam as

reformas universitárias, centradas na Universidade

de Coimbra (Estatutos de 1772) e, constatando-se a

precariedade da assistência médica, Pombal

estendeu-as também ao universo da Medicina,

numa altura em que não existiam médicos e

cirurgiões suficientes, fosse na metrópole ou fosse

“para as expedições das frotas comerciais epara

o socorro das províncias, onde já nãohaviasenão

barbeiros que sangravam e meros curandeiros”

(Abreu, 2007).

A regulamentação e melhor fiscalização dos

ofícios relacionados com a arte de curar foi uma

outra meta, para a qual contribuiu Dª. Maria I (1734

[1777] - 1817), que em 1782 instituiu a Junta do

Protomedicato, com deputados, médicos e

cirurgiões. A sua principal função era a fiscalização

sobre os ofícios de curar praticados

clandestinamente ou sem licença. No entanto,

implantada em Portugal e no Brasil, essa junta teve

pouco impacto para a assistência médica e nenhum

em África (Abreu, 2007).

Tão importante quanto garantir a assistência

médica era também coibir os excessos de terapias

existentes. Com essa finalidade, a “

Pharmacopeia

geral para o reino e domínios de Portugal

”, de

1794, visava regulamentar a desordem existente

nas boticas, proibindo a produção de

medicamentos a partir de outras farmacopeias

(Pita, 1998).

Desenvolvia-se então na Europa o pensamento

sobre higiene pública de Johann Peter Frank (1745-

1821) e de Edwin Chadwick (1800-1890)

(Gonçalves Ferreira, 1982). Para Portugal, o seu

representante máximo fora António Nunes Ribeiro

Sanches (1699-1783) que em Paris publicou, em

português, o “

Tratado da Conservação da Saúde

dos Povos

” (1756) e o “

Método para Aprender e

Estudar a Medicina, …” (1763)

, apoiando e

influenciando assim a reconstrução da cidade de

Lisboa após ao terramoto de 1755 e a reforma

pombalina do ensino médico (Doria, 2001; George,

2004; Viegas

et al.

, 2009).

A Academia Real de Ciências de Lisboa,

fundada em 1779, também no reinado de Dª Maria

I, foi o organismo indicado para instruir a política

colonial através de investigação empírica, que

poderia contribuir para a recuperação económica e

política da metrópole, face à forte pressão

competitiva empreendida pelas outras potências

europeias. Em 1814, a Academia publicou um

programa de elaboração de topologias médicas,

seguindo as recomendações da

Societé Royale de

Médicine

, de Paris. Entre os objetivos desse

programa, estava a implantação dos mecanismos

para controlo da saúde dos portugueses, de colonos

e escravos e não se podem aqui desvalorizar os

esforços do governo no sentido de direcionar

investimentos para esse fim (Abreu, 2007). Porém,

os esforços dos sábios da Academia nunca

excederam

“a superficialidade, o aleatório, a

estreiteza, inerentes a todas as obras do

despotismo esclarecido”

(Sérgio, 1978).

Contribuíram aqui, também, as revoluções

americana (1776) e francesa (1789). As ideias

renovadoras propagadas pela revolução francesa