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FIGUEIREDO, Jacinta Teresa Gomes Chaves de Matos (2015)
Lesões causadas pelos ovos de Shistosoma haematobium como
factor de risco em doenças crónicas urinárias das zonas
endémicas de Angola. Dissertação de Doutoramento no ramo de
Ciências Biomédicas, especialidade de Parasitologia. IHMT.
Lisboa.
Resumo: várias espécies de tremátodes do género
Schistosoma
. Considerando
que a schistosomose por
S. haematobium
, cujas lesões podem ter graves
consequências para a saúde humana, é endémica em Angola, o seu estudo e o
seu controlo tornam-se imperiosos. Nesse contexto, a presente tese tem por
objetivo geral caraterizar as lesões clinico-patológicas causadas por
S.
haematobium
e os potenciais fatores associados à parasitose em Angola.
Durante o período de realização do estudo (2011-2013), 1671 utentes
recorreram à consulta de Urologia do Hospital Américo Boavida em Luanda,
Angola, dos quais 189 (10,7%) integravam os critérios de inclusão pré
definidos. Dos doentes avaliados 97 (51,3%) eram mulheres e 92 (48,7%)
homens, com idades compreendidas entre os 14 e 77 anos (média 37,9 anos),
originários de 13 das 18 províncias do país.
O exame parasitológico da urina foi positivo em 46 doentes (24,3%), sendo a
média da carga parasitária de 23,1 ovos/10ml. Quanto à idade, verificou-se o
padrão clássico da parasitose, com o pico da infeção no grupo dos 14-28 anos
e com diferenças significativas (χ2, P<0,001) em relação aos outros grupos
etários. Tanto a infeção como a intensidade do parasitismo eram mais
frequentes na população feminina (54,3%) comparativamente ao masculino
(45,7%), com diferenças significativas em relação à carga parasitária (χ2,
P
=0,044). A hematúria foi o sinal mais frequentemente referido pelos doentes
(93%). Os resultados da ecografia renal e pélvica demonstraram que 167
(88,3%) tinham alterações na bexiga enquanto em 75 (34,4%) se detetaram
lesões renais de grau variado.
No exame de uretrocistoscopia verificou-se que a quase totalidade dos doentes
(98,4%) apresentava lesões vesicais em diferentes estádios de evolução
causadas por
S. haematobium
. Constatou-se uma elevada concordância entre
as alterações visualizadas na ecografia com as obtidas na uretrocistoscopia e
histologia com os métodos de diagnóstico de tumor vesical, a citologia da urina
e o teste NMP22 BladderChek®. A maioria dos doentes apresentava cistite
crónica (75,7%) e em 42 (22,3%) foram identificados carcinomas dos tipos
epidermoide (CE) e de células transicionais (CCT).
A ocorrência de co-morbilidade de lesões urológicas e schistosomose ectópica
foi observada em 28 doentes. Após conduta terapêutica e/ou cirúrgica, 149
doentes tiveram alta por cura e 16 passaram a ser seguidos na Oncologia. A
taxa de mortalidade foi de 30% (9/29) nos doentes oncológicos e um caso por
insuficiência renal crónica com atrofia renal bilateral. Os resultados preliminares
de RAPD-PCR sugerem a existência de existência de alta variabilidade
genética inter e intrapopulacional de
S. haematobium
a nível regional. O
presente estudo comprova não só a infeção schistosómica na população adulta
como evidencia as consequências fisiopatológicas resultantes da retenção
crónica dos ovos nos tecidos, com ênfase na associação entre
S. haematobium
e neoplasia da bexiga. Consideramos de maior relevância a inclusão da
população adulta nos programas de controlo da schistosomose, de modo a
evitar a evolução da doença e a intervenção clínica adequada mais precoce, o
que irá permitir um melhor prognóstico e consequente qualidade de vida.