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Introdução

A nanobiotecnologia aplicada à medicina tem especial inte-

resse para diagnóstico molecular, especialmente para diag-

nóstico clínico, uma vez que possibilita a integração de diag-

nóstico com terapêutica, lançando as bases para uma aborda-

gem de medicina

personalizada.As

aplicações de maior rele-

vância são nas áreas da descoberta de novos biomarcadores,

diagnóstico e tratamento de cancro, assim como na deteção

de doenças infeciosas [1].

Neste trabalho, apresentamos dois métodos nanotecnológi-

cos inovadores para o diagnóstico da malária, uma das doen-

ças infeciosas de maior prevalência em todo o mundo.

A malária é causada por parasitas protozoários do género

Plasmodium (P

.

)

, sendo uma das espécies,

P. falciparum,

res-

ponsável por elevados níveis de mortalidade e morbilidade

associados a esta doença. Ocorrem anualmente cerca de 6,6

milhões de casos de infeção por malária, sendo que em 2013

foram registadas 584.000 mortes, maioritariamente em

África e entre os principais grupos de risco, nomeadamente,

pacientes comVIH, grávidas e crianças com idade inferior a

5 anos [2].

A malária é transmitida principalmente em regiões tropicais

e sub-tropicais onde a temperatura, humidade e a existência

de águas paradas permitem a proliferação dos vetores, no-

meadamente os mosquitos fêmea do género

Anopheles

. A in-

feção inicia-se quando o mosquito infetado pica o hospedeiro

mamífero, injetando esporozoítos de

Plasmodium

na corrente

sanguínea. Os esporozoítos atingem o fígado, infetando os

hepatócitos, no interior dos quais se replicam num processo

que culmina com a libertação de centenas de merozoítos na

corrente sanguínea. Estes parasitas invadem os eritrócitos,

conduzindo ao aparecimento dos sintomas desta doença [3].

Os sintomas habitualmente surgem 10 a 15 dias após a pi-

cada do mosquito e, à semelhança duma doença febril, os

mais comuns incluem dores de cabeça, febre alta, calafrios,

vómitos e mal-estar [2-5].

A semelhança entre os sintomas de malária e os de uma

doença febril pode conduzir ao uso desnecessário de medi-

camentos anti-maláricos como os derivados de artemisinina,

cloroquina, mefloquina, entre outros. É por isso de extrema

importância que o diagnóstico de malária seja baseado na

determinação da presença de parasitas no sangue e não nos

sintomas da doença.

O método mais comum para a deteção de parasitas

Plasmo-

dium

é a análise de esfregaços de sangue por microscopia

ótica, considerado como "

gold standard

" do diagnóstico de

malária. Contudo, os parasitas também podem ser deteta-

dos através de microscopia de fluorescência ou recorrendo

a tecnologias de amplificação de ácidos nucleicos (PCR) [6].

Estes métodos apresentam diversas desvantagens, pois re-

querem laboratórios e equipamentos apropriados, técnicos

especializados e tempo considerável para a análise, exigindo

condições que são dificilmente acessíveis em países em vias

de desenvolvimento. Em alternativa, têm sido desenvolvidos

os testes imunocromatográficos ou testes de diagnóstico rá-

pido (TDR). São testes simples, rápidos, específicos, sensí-

veis e de baixo custo. São de fácil leitura e interpretação e

não necessitam de infraestruturas de apoio, o que os torna

vantajosos em países com poucos recursos [6-9].

Os TDR disponíveis comercialmente permitem detetar di-

ferentes antigénios de

Plasmodium

, tais como: Histidine Rich

Protein 2 (HRP2), Lactate Dehydrogenase (

p

LDH) e aldola-

se. No entanto, estes testes também apresentam limitações;

a HRP2 (somente expressa em

P. falciparum

) é detetada em

circulação várias semanas após a eliminação dos parasitas, o

que pode conduzir a falsos positivos. A

p

LDH e a aldolase

(produzidas por todas as espécies do género

Plasmodium)

são

menos sensíveis como biomarcadores de infeção por

Plas-

modium

, comparativamente com os testes para a deteção de

HRP2, mas têm a vantagem de serem rapidamente elimina-

dos da circulação após tratamento conducente à eliminação

dos parasitas.A sensibilidade dosTDR pode ser grandemen-

te afetada pelas condições climatéricas como a humidade e

o calor. Podem também gerar falsos positivos, devido a rea-

ções cruzadas em pacientes com artrite reumatoide ou ou-

tras condições que apresentem auto-anticorpos circulantes

[7,8,10]. Devido a todas estas limitações, torna-se urgente

a identificação de um novo biomarcador de malária, assunto

atualmente também em estudo pelo nosso grupo de inves-

tigação.

Os TDR são geralmente dispositivos imunocromatográficos

de fluxo lateral que usam nanopartículas de ouro (AuNP)

conjugadas com um anticorpo específico que reconhece o

antigénio alvo. Normalmente usam uma membrana de ni-

trocelulose como suporte no qual se imobilizam as compo-

nentes das linhas de teste e de controlo (Figura 1 A). O teste

apresenta uma pequena janela para visualização dos resulta-

dos e encontra-se protegido por um invólucro de plástico

(Figura 1 B). Esta tecnologia tem sido empregue noutros

ensaios de diagnóstico, onde se destacam os testes de gravi-

dez [9,11]. Contudo a nitrocelulose sendo um material com

propriedades hidrófobas de forma a poder ser utilizado nes-

tes testes, necessita de sofrer um tratamento superficial, caso

contrário não ocorre a difusão das soluções líquidas, sendo

esta desvantagem superada pela celulose que é intrinseca-

mente um material hidrófilo.

As AuNP são candidatas ideais ao desenvolvimento de bioen-

saios, devido às suas propriedades únicas, tais como possi-

bilidade de controlo de tamanho através de síntese química

simples, facilidade de preparação, elevada área superficial

e fácil funcionalização que possibilita elevada solubilidade

em água e cor intensa. As AuNP proporcionam um nano-

-ambiente favorável à imobilização de biomoléculas (anti-

corpos), mantendo a atividade biológica destas. A funciona-

lização das AuNP oferece a oportunidade de criar superfícies

complementares e interações multivalentes para um reco-

nhecimento biomolecular eficiente. Os ligandos baseados

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