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Embora o Instituto de Higiene e Medicina Tropical da Uni-
versidade Nova de Lisboa (IHMT/UNL) possua um vastís-
sima história no combate às doenças infeciosas, a micobac-
teriologia e em particular a tuberculose, não foram durante
muito tempo objeto desse combate, dado que a tuberculose
e a lepra estavam tradicionalmente adstritos aos serviços na-
cionais de saúde pública e aos programas nacionais específicos
de combate a estas enfermidades. A severidade e importân-
cia para a saúde pública em Portugal continental e nos terri-
tórios além-mar, onde o IHMT prestava serviço assistencial,
destas duas doenças, assim o exigiam [1,2]. Contudo, de entre
as enfermidades de origem micobacteriana mais estudadas na
história do IHMT, a lepra foi a que mais atenção recebeu, pois
grassava em todos estes territórios, em particular nas tribos in-
dígenas da Guiné e da Angola, ressalvando-se as missões do Dr.
Augusto Salazar Leite na Guiné e em Angola nos anos 50 do
século XX [3,4]. No respeitante à tuberculose, as missões do
IHMT centraram-se no apoio aos programas locais de luta con-
tra a tuberculose, como relatam as missões de Fraga deAzevedo
e de Pedroso Ferreira aTimor e Macau, respetivamente [5,6].
Sendo as micobacterioses uma das muitas patologias de origem
bacteriana que o Departamento de Microbiologia Médica do
IHMT/UNL estudava durante a primeira metade do século
XX, não lhe foi contudo dada a mesma relevância que foi dada
a outras enfermidades como a malária, a filaríase ou a tripa-
nossomíase [7]. O IHMT/UNL ocupava assim o seu lugar na
luta conta as enfermidades consideradas exóticas para o con-
texto médico de Portugal continental, focando-se na assistência
às populações dos territórios do ultramar, não se sobrepondo
aos programas nacionais e locais de luta contra a tuberculose
e lepra, apenas complementando e alertando sempre que ne-
cessário. Porém, na segunda metade do sec. XX, vários fatores
sócio-económicos motivaram a deterioração das infraestrutu-
ras administrativas, sociais e das políticas de saúde pública que
continham a propagação da tuberculose a nível mundial, o
mesmo ocorrendo em Portugal. Um excesso de confiança na
antibioterapia na cura das infeções micobacterianas, sobretudo
nos anos 60 e 70, o aumento da toxicodependência, a mudan-
ça do perfil populacional em resultado da intensa imigração de
indivíduos de países com elevada prevalência de tuberculose e
a sua concentração nos principais centros urbanos, a pobreza
e a desnutrição associada à guerra em países da CPLP em de-
senvolvimento pós-independência e a ineficiente capacidade de
organização da resposta por parte dos sistemas de saúde, foram
fatores determinantes no ressurgir da tuberculose nas décadas
de 80-90 do século XX a nível global e em particular na CPLP.
Em paralelo, a pandemia doVírus da Imunodeficiência Adqui-
rida/Síndroma da Imunodeficiência Adquirida (VIH/SIDA) le-
vou ao aumento da prevalência de tuberculose a nível mundial
e em Portugal, bem como nos países da Africa sub-sahariana,
onde o IHMT/UNL desenvolvia trabalho de investigação apli-
cado.Tal alteração do panorama das doenças infecciosas a nível
Fig. 1
– Cronograma dos momentos e contribuições científicas mais relevantes da breve história da micobacteriologia no IHMT/UNL
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