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A n a i s d o I HM T
riologico, com particular ênfase na implementação de métodos
rápidos para o diagnóstico laboratorial deTB e M/XDR-TB.A
experiência portuguesa na articulação clínico-laboratorial no
contexto dos programas de luta contra a tuberculose e a par-
ticipação ativa da UEI de Micobactérias do IHMT/UNL nas
reuniões de trabalho consolidou o documento final que viria a
ser publicado sob o título “The Portuguese Presidency of the
European Union. Health Strategies in Europe. Parallel Session:
A European Strategy for Multidrug ResistantTuberculosis. Lis-
boa, 12-13 Julho 2007. Framework Action Plan to fightTuber-
culosis in the European Union. European Center for Diseases
Control. Estocolmo.” Fevereiro 2008 (
http://ecdc.europa.eu/pdf/080317_TB_Action_plan.pdf).
Na sequência desta reunião e da elaboração do documento re-
ferido anteriormente, os países da União Europeia iniciaram a
implementação em rotina de métodos moleculares para a rápi-
da deteção de MDR-TB, inspirando-se em parte na experiência
Portuguesa. Já em 2008, a Direção Geral da Saúde do Ministé-
rio da Saúde de Portugal reconheceu a importância desta abor-
dagem na luta contra a disseminação da tuberculose resistente
aos antibióticos no nosso país, tendo emitido a Circular Norma-
tiva Nº 12/DSCS/PNT, onde se preconiza que, no âmbito do
Programa Nacional de Luta Contra a Tuberculose e de acordo
com o objetivo programático de controlo daTuberculose Mul-
tirresistente, seja requisitado o teste de deteção molecular de
multirresistência diretamente na amostra clínica, sempre que
se suspeite de tuberculose multirresistente, sendo considerados
casos suspeitos todas as pessoas com tratamentos antitubercu-
lose anteriores, contactos com doentes de tuberculose multir-
resistente, ou populações de risco acrescido de multirresistên-
cia, nomeadamente profissionais de saúde, infetados peloVIH,
toxicodependentes, reclusos, imigrantes e residentes em áreas
de alta prevalência de tuberculose multirresistente. Certamente
contribuiu-se para que as taxas de 20 a 30% de MDR-TB que
se verificavam na região da Grande Lisboa na década de noventa
do século XX tenham diminuído para valores médios entre os 3
a 5% na primeira década deste século, resultados estes que não
teriam sido possíveis sem um empenho significativo da Direção
Geral de Saúde na reorganização da Luta Contra aTuberculose
em Portugal. Saliente-se o marco histórico da redução da taxa
de incidência nacional de tuberculose se situar, pela primeira vez
na nossa história, abaixo dos 20 casos por 100.00 habitantes em
2014 – taxa estimada de 18,7 [20].Tal coloca pela primeira vez
o nosso país no grupo dos países de baixa-média incidência, de
acordo com os critérios epidemiológicos da Organização Mun-
dial de Saúde [20,21]. Se em 2002 a Direção Geral da Saúde
reportava 41 casos novos de tuberculose por 100.00 habitantes,
com 12,7 % de casos de tuberculose multirresistente, em 2013
reportava 20.1 novos casos por 100.000 habitantes com cerca
de 0.87% casos de tuberculose multirresistente. Em 2014 final-
mente a taxa de incidência nacional estimada será de 18,7 casos
com 0.30% de casos de tuberculose multirresistente notificados
a nível nacional [21-23]. No entanto, apesar da redução signifi-
cativa na incidência de tuberculose nos últimos anos a nível na-
cional, Porto e Lisboa continuam longe da média nacional sen-
do as cidades com maior incidência de tuberculose do país. Em
2013, ocorreram 257 casos de tuberculose na cidade de Lisboa
(taxa de incidência de 49,4/100.000 habitantes) e 119 casos
na cidade do Porto (taxa de incidência de 52,9/100.000 ha-
bitantes), com taxas de multirresistência de 3 a 5% [21-23]. O
principal problema continua a ser a prevalência de tuberculose
multiresistente e, em particular, a tuberculose extensivamente
resistente.Dos casos de tuberculose multirresistente notificados
em 2013 (n=12), 42% corresponderam a tuberculose extensi-
vamente resistente (n=5), continuando a ser uma preocupação
nos grandes centro urbanos de Lisboa, Porto e também Setúbal
[22].A importância desta situação e sobretudo a necessidade de
se prevenir o seu agravamento, levou à aprovação do financia-
mento em Maio de 2009, pela Fundação Calouste Gulbenkian,
de um terceiro projeto intitulado “Diagnóstico e Epidemiologia
Molecular de M/XDR-TB na Grande Lisboa: a Deteção Preco-
ce na Prevenção da Emergência e Disseminação de Estirpes de
M. tuberculosis
Extensivamente Resistentes” sob a coordenação
do IHMT/UNL, tendo como parceiros o Centro Hospitalar de
Lisboa Central (Hospital Santa Maria) e o Centro Hospitalar de
Lisboa Ocidental (Hospital Egas Moniz). Este projeto permitiu
testar a utilização de diferentes metodologias na deteção pre-
coce de M/XDR-TB, confirmando-se o papel crucial dos mé-
todos moleculares no diagnóstico laboratorial atempado destas
infeções [24].
O estudo da diversidade genética das estirpes de
M. tuberculo-
sis
isoladas ao longo destes anos de estudo permitiu-nos ainda
observar que a maioria das estirpes multiresistentes que circu-
lam em Lisboa pertence a um grupo geneticamente relacionado
[11, 24-27]. Este grupo ou “cluster” de
M. tuberculosis
altamente
virulento, designado por Família Lisboa, foi inicialmente isola-
do e identificado no Laboratório de Micobactérias do IHMT/
UNL nos últimos anos da década de noventa e caracterizado por
epidemiologia molecular, com recurso à técnica IS6110-RFLP
e posteriormente porVNTR-MIRU, pela equipa da Dra Isabel
Portugal (Faculdade de Farmácia de Lisboa, FF/UL) com a qual
se colabora há vários anos [11,26]. Este “cluster” tem sido detec-
tado em todo o território nacional, com particular incidência
na área de Lisboa.Os dados moleculares recentemente colhidos
sugerem que este se estabeleceu na comunidade em Portugal,
sendo que a sua prevalência entre as estirpes de
M.tuberculosis
re-
sistentes em Portugal é de cerca de 90%, e que, destas estirpes,
cerca de 20 a 40% são extensivamente resistentes [22,26,27].
Assim, a Família Lisboa é hoje uma ameaça para o controle da
tuberculose em Portugal, uma vez que a sua prevalência nos úl-
timos anos sugere que estas estirpes possuem vantagens seleti-
vas sobre outras estirpes de diferentes origens, exibindo ainda
caraterísticas genéticas que as tornam mais predisponentes a
adquirir multirresistência, tal como recentemente evidenciado
pelo trabalho de um consórcio internacional de sequenciação do
genoma completo destas estirpes [27].
Em paralelo com os avanços da biologia molecular, a utilização
de sistemas automatizados de isolamento e cultura baseados em