14
da malária os mecanismos de interação entre parasita e
mosquito captaram o interesse dos investigadores como
potencial ferramenta na luta contra a malária.
Dentro do mosquito os plasmódios têm de ultrapassar
muitas barreiras físicas, tais como a matriz peritrófica,
o epitélio do intestino médio, o hemocélio e as glându-
las salivares, a fim de completar o seu ciclo de vida, no
entanto, a base molecular que permite o estabelecimento
destas interações não é totalmente conhecida, apesar
de muitos trabalhos realizados nesta área. O IHMT tem
contribuído para o conhecimento desses mecanismos e
interações, esperando contribuir para o desenvolvimento
de ferramentas inovadoras para controlar a transmissão
da doença.
As formas parasitárias no vetor são extracelulares e por-
tanto estão expostas aos fatores imunes do vertebrado ab-
sorvidas em conjunto com a refeição sanguínea infetada
ou refeições subsequentes. Esta ação do sistema imune
do hospedeiro vertebrado tem sido explorada na busca
de candidatos para vacinas de bloqueio de transmissão.
Moléculas candidatas como Pfs48 / 45 e P25P28, foram
identificadas e pensa-se estarem relacionadas com a for-
mação de nanotúbulos que facilitam o contacto intercelu-
lar durante a fertilização. Estudos sobre a resposta imune
humana direcionada para os mosquitos e o seu efeito so-
bre a fisiologia do parasita e mortalidade têm sido desen-
volvidos no IHMT, mostrando que os anticorpos produ-
zidos contra o intestino médio do mosquito reduzem a
longevidade e fecundidade [103].
Vários alvos foram estudados a fim de quebrar a cadeia de
transmissão, particularmente no passo crítico da invasão
do epitélio pelo oocineto. Esta é uma área cada vez com
maior interesse científico que tem vindo a ser explorada
no IHMT, nomeadamente em relação à associação do cito-
cromo P450 e da tubulina A e B com a reduzida penetração
do epitélio de
A. gambiae
pelos oocinetos de
P. berghei
[104].
Além disso, foi demonstrado pela primeira vez que a in-
jeção de oligonucleótidos (ODN) contendo motivos CpG
tornava os mosquitos mais resistentes ao
Plasmodium
, tendo
sido isto associado com a atividade de enzimas transgluta-
minase [105]. Estes resultados abrem caminhos promisso-
res na busca de novos alvos para o controlo da transmissão
da malária. As microvilosidades do epitélio também têm
sido exploradas como um alvo para a interrupção da trans-
missão. A imunização com extratos de microvilosidades
resultou numa maior mortalidade dos mosquitos e dimi-
nuição da infeção por plasmódio [106].
Os mosquitos
Anopheles
são capazes de montar uma res-
posta imune eficaz contra a infeção pelo
Plasmodium
, a
qual é responsável por grandes perdas de parasitas du-
rante o desenvolvimento esporogónico no mosquito. Os
mosquitos parecem ser mais bemsucedidos a controlar a
infeção pelo
Plasmodium
do que os humanos. Em áreas hi-
perendémicas para malária onde a prevalência da malária
pode atingir até 91%, as taxas de infeção do mosquito são
de uma ordem de grandeza menor. No entanto, a imuni-
dade natural não é suficiente para suprimir totalmente
a infeção do mosquito. A ideia de modular a infeção no
mosquito como medida de controlo tem vindo a ser de-
senvolvida no IHMT usando fatores externos como a CQ
(Abrantes et al, 2005 108; Abrantes et al, 2008 108) e
ODN com CpG sintéticos para induzir respostas proteto-
ras em
Anopheles
contra
Plasmodium
[105].
Com as mudanças climáticas e aumento dos movimen-
tos populacionais, o risco de reintrodução da malária nos
países que anteriormente tinham malária torna-se uma
ideia mais plausível, donde a investigação sobre a possí-
vel suscetibilidade do mosquito
Anopheles atroparvus
, vetor
da malária em Portugal, a estirpes importadas de
P. falci-
parum
ser muito relevante. A tentativa de infetar
A. atro-
parvus
com
P. falciparum
de origem africana não foi bem
sucedida, o que sugere que as espécies locais de
Anophe-
les
são refratárias aquela espécie de
Plasmodium
[109]. No
entanto, mais recentemente, experiências realizadas sob
condições específicas de temperatura e refeição sanguínea
revelaram que existe de facto suscetibilidade de
A. atro-
parvus
para
P. falciparum
estirpe NF54, com prevalência de
infeção de até 13,5%.
A libertação dos esporozoítos dos oócitos para a hemolin-
fa leva a uma reorganização do epitélio do mosquito com
alteração da expressão de genes associados com citoes-
queleto como a tubulina [104], e produção de NO, desen-
cadeando uma resposta que envolve a ativação de vários
genes de resposta ao stress oxidativo [110]. Neste contex-
to, os citocromos P450 estão profundamente envolvidos
na resposta à infeção do mosquito pelo
Plasmodium
[104],
desempenhando um papel importante em diferentes fases
de desenvolvimento do parasita e envolvendo diferentes
tecidos do mosquito.
O ensino em saúde tropical foi a missão original do IHMT,
talvez por força das circunstâncias sociopolíticas (mas
muito claramente pela dedicação e entusiasmo dos que
nele trabalhavam), o combate à malária no continente e
nas ex-colónias rapidamente se tornou uma componente
major na sua atividade institucional. Pensamos ter conse-
guido evidenciar aqui o impacto mensurável que o IHMT
teve na investigação fundamental em malária nestes últi-
mos 50 anos, nomeadamente nas áreas interação parasita
hospedeiro, interação parasitavector e na resistência aos
antimaláricos.
Artigo Original