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2003 era limitada. Um estudo pioneiro de Almeida [70] em
pacientes com
P. vivax
, demonstrou uma elevada frequência
de mutações no gene
pvdhfr
(codões 33L, 58R e 117N, as-
sociados à resistência à Pyr), com as respetivas frequências
de 48%, 76% e 82% mas não foram detetadas mutações no
pvdhps
(codões 383 e 553, associados à resistência à sulfado-
xina). Além disso, um terço dos pacientes possuía parasitas
com ambos os alelos mutantes 58R e 117N em simultâneo.
O estudo da resistência aos antimaláricos, além da monito-
rização epidemiológica tratada acima, inclui também a pes-
quisa dos mecanismos associados e de novos fármacos e tem
sido uma prioridade do IHMT especialmente desde a imple-
mentação do CMDT.
Antimaláricos e alvos terapêuticos
A digestão de hemoglobina no vacúolo digestivo do parasita
da malária é o alvo celular reconhecido das quinolinas, no-
meadamente da CQ.A hipótese mais fundamentada é de que a
CQ impeça a polimerização dos grupos heme (resultantes da
digestão da hemoglobina) em hemozoina, induzindo stresse
oxidativo a níveis letais.A estrutura e morfologia dos cristais
de hemozoina tem vindo a ser estudada no IHMT [84] com o
intuito de, em colaboração com a Faculdade de Farmácia de
Lisboa, desenvolver moléculas) capazes de se ligarem espe-
cificamente às faces dos cristais de hemozoina impedindo o
seu crescimento e nucleação.Várias destas moléculas foram
sintetizadas e testadas
in vitro
com resultados promissores
contra
P. falciparum
resistente a múltiplos fármacos [85;86].
Como parte dos sistemas de alívio de stress oxidativo, os
parasitas da malária possuem também todo um conjunto de
enzimas de resposta ao stress baseado no tripéptido glutatião
(GSH). Este é um importante antioxidante intracelular que é
oxidado em dissulfureto de glutatião (GSSG) durante a des-
toxificação de peróxidos e radicais livres de oxigénio. Os pa-
rasitas da malária têm um sistema redox baseado no glutatião
totalmente funcional. O aumento da transcrição dos genes
que codificam as enzimas de resposta ao stress oxidativo pa-
rece ser parte da 1ª linha de defesa à CQ de
P. falciparum
[87]
mas o mesmo não foi observado em
P. chabaudi chabaudi
[88].
Os transportadores transmembranares ABC como PfMRP1
e PfMRP2 [89] participam no transporte de antimaláricos
e conjugados de glutatião constituindo parte do sistema de
defesa do parasita aos antimaláricos.Várias mutações foram
identificadas nestes genes e implicadas em fenótipos de resis-
tência a antimaláricos.
A primaquina (PMQ) é o único fármaco disponível ativo
contra os hipnozoítos (formas latentes no fígado) de
P. vivax
e
P. ovale
causadoras de recaídas da doença e contra os game-
tócitos de todas as espécies, bloqueando assim a transmissão
aos mosquitos. No entanto, a PMQ apresenta uma semi-
vida curta (±6h) e hemotoxicidade elevada, causando tam-
bém anemia hemolítica em portadores de glicose6fosfato
desidrogenase (G6PD) deficiente devido à capacidade da
PMQ para induzir a oxidação da oxihemoglobina em me-
tahemoglobina.
Uma abordagem prática para combater a resistência do pa-
rasita é o desenvolvimento de análogos de antimaláricos já
existentes, devidamente adaptados, a fim de restaurar a sua
relevância na quimioterapia antimalárica. A fim de superar
estas limitações da PMQ, durante as últimas duas décadas o
IHMT, a Faculdade de Farmácia de Lisboa e a Universidade
do Porto em colaboração, têm vindo a sintetizar e testar no-
vas moléculas e derivados da PMQ.
Foram usadas diversas estratégias como: 1) adição de ami-
noácidos à PMQ de forma a reduzir a sua toxicidade e supri-
mir a metabolização; embora muitos derivados tenham apre-
sentado melhor índice de atividade/toxicidade continuaram
a ser rapidamente hidrolisados a PMQ por aminopeptidases
e endopeptidases; 2) incorporação de imidazolidinas em de-
rivados dipeptídicos de PMQ para proteger o resíduo
de aminoácido Nterminal dos péptidos da hidrólise; as imi-
dazoquinas resultantes apresentavam muito baixa citotoxi-
cidade contra linhas celulares humanas e uma boa atividade
de bloqueio de transmissão por eliminação dos gametócitos,
comparável à PMQ e aos derivados dipeptídicos [90]; estas
imidazoquinas apresentaram também atividade comparável à
da PMQ contra estádios eritrocitários de
P. falciparum
[91];
3) a adição de metaloceno à PMQ resultou na seleção de
um primaceno com um nível de atividade
in vitro
contra es-
quizontes hepáticos e de bloqueio de transmissão 45 vezes
maior do que a da PMQ [92].
A artemisinina (ART) e seus derivados são os antimaláricos
mais potentes e de ação mais rápida disponíveis, sendo esta
também a principal razão pela qual oAS está gradualmente a
substituir o quinino no tratamento da malária grave. Os de-
rivados da ART são ativos contra todos os estádios eritrocitá-
rios do parasita (incluindo a redução da produção de game-
tócitos) reduzindo até 10.000 vezes o numero de parasitas
por ciclo e proporcionando um alívio rápido dos sintomas.
Com a emergência de resistência aos ACTs, mais uma vez
no sudeste asiático, tornase imperativo encontrar alternati-
vas viáveis. Em 2003 foi proposta a ATPase dependente de
cálcio do retículo sarcoplasmático (PfATP6) codificada pelo
gene
pfatp6
como alvo molecular dos derivados da ART. Em
2007, Hunt e colaboradores (no IHMT) selecionaram pela
primeira vez linhas de
Plasmodium
resistentes à ART, usando
o modelo murino
P. chabaudi
[93]. A sequenciação total do
genoma dos clones resultantes permitiu identificar possí-
veis alvos na via metabólica da ubiquitina [94;95]. Com base
na inibição funcional da proteína PfATP6, esta foi proposta
como um alvo da ART. No entanto foi demonstrado por ex-
pressão heteróloga de PfATP6 em membranas de levedura
era insensível à ART. No entanto, as mutações no gene
pfatp6
anteriormente identificadas como estando associa-
das à resistência não se encontram nos clones de
P. chabaudi
resistentes [94]. Recentemente, um marcador molecular de
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