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estudo da frequência desses polimorfismos genéticos huma-
nos no arquipélago de CaboVerde. Foram estudados dois fa-
tores genéticos clássicos fortemente associados à resistência
contra as formas graves de malária: alelo HbS responsável
pelo traço falciforme (heterozigotia para a mutação no gene
HbS
β
globina, Hb
β
globina) e a prevalência de variantes de
G6PD (alelos Ae MED), [41]. A PK, codificada pelo gene
pklr
, foi associada com a resistência à doença em modelos
de roedores e em seres humanos. Os resultados mostraram
que as frequências alélicas dos polimorfismos examinados
estavam mais próximas das encontradas nas populações Eu-
ropeias do que nas africanas. Não foi encontrada associação
entre os fatores humanos analisados e a infeção, mas um re-
sultado é de grande interesse: um teste de desequilíbrio de
linkage
revelou uma associação do gene
pklr
apenas em indi-
víduos não infetados. Isto poderia significar uma região do
gene mais conservada selecionada em associação com pro-
teção contra a infeção e/ou doença. Devido a este resultado
esta linha de pesquisa foi continuada noutra área endémica
de malária - Moçambique.
Em Moçambique a malária é endémica em todo o país, espe-
cialmente em áreas onde o clima favorece a transmissão; esta
é perene com um pico após a temporada das chuvas. Mo-
çambique tem vindo a alcançar bons resultados no controlo
da malária. Cerca de 6,5 milhões de casos foram registados
em 2006, enquanto em 2014 apenas foram reportados cerca
de 3 milhões (2.941 mortes) como resultado de estratégias
de intervenção eficazes.
Durante os anos 50, Soeiro e colegas apresentaram des-
crições epidemiológicas muito detalhadas da situação da
malária nos diversos distritos do território moçambicano,
abordando aspetos como a distribuição dos casos, morbili-
dade, mortalidade e transmissão [8;9;76;77]. Nessa época,
a luta contra a malária em Moçambique era realizada pela
EAM - Estação Anti Malárica de Lourenço Marques (hoje
Maputo), criada em 1937. A EAM incluía três secções
entomologia, hematologia e trabalho de campo; operava
como um Centro de Supervisão e Coordenação de contro-
lo da malária em todo o território, em estreita colaboração
com os Municípios locais e Juntas, delegados de saúde e
estações menores de luta contra a malária espalhadas pelas
diferentes regiões, onde trabalhava pessoal especialmen-
te treinado. Um ênfase especial era colocado nas medidas
anti-vetor e estudos de comportamento do mesmo, tendo
sido realizadas tentativas de controlar a resistência aos in-
seticidas [78].
Entre abril e junho de 1984, houve oito casos de
P. falcipa-
rum
malária resistentes à CQ em expatriados que regressa-
ram de Moçambique. A resistência à terapêutica com AMQ
e Pyr também foi demonstrada em dois casos. Embora os
marcadores moleculares de resistência à CQ, sulfadoxina e
Pyr (SP) tenham sido de valor operacional limitado, porque
foram descritos após a resistência ter emergido e se ter dis-
seminado globalmente, eles ainda são úteis para monitorizar
os ACTs [51] e os níveis de resistência à SP [50], uma com-
binação ainda em uso para o tratamento preventivo intermi-
tente (IPT) na gravidez e recém-nascidos em Moçambique.
Na verdade, com base em marcadores moleculares, foi pos-
sível determinar que um único alelo do gene
pfcrt
originado
no sudeste asiático invadiu África (e Moçambique).
Quanto à relação parasitahospedeiro e ao estudo dos fato-
res humanos que podem estar associados à proteção contra a
malária, no seguimento dos resultados obtidos na população
de CaboVerde relativos ao gene
pklr
, prosseguiu-se o estudo
deste gene em duas populações subsarianas (Moçambique e
Angola) e fazendo uma análise combinada de vários tipos de
polimorfismos (
Short Tandem Repeats, STRs e Single Nucleotide
Polymorphisms, SNPs
) na região do gene
pklr
e regiões adjacen-
tes (cromossoma 1q21) para detetar eventuais sinais de sele-
ção exercida pela malária em grupos com diferentes desen-
laces clínicos de malária, tendo sido também utilizados dois
grupos portugueses para comparação, um controlo normal e
outro com deficiência diagnosticada de PK [29].
Esta análise revelou uma diferenciação significativa entre
os grupos africanos e portugueses e mais elevada do que
quando são utilizados marcadores neutrais.
Adicionalmente foi encontrado novamente um desequilíbrio
de
linkage
significativo na mesma região genómica que em
CaboVerde e apenas no grupo com malária não complicada.
No conjunto, estes resultados sugerem que a malária poderá
estar a atuar como uma pressão seletiva sobre esta região do
genoma humano.
No IHMT o estudo da diversidade de PK prosseguiu, esten-
dendo-se a outras populações da África subsariana – Angola,
Guiné Bissau, Guiné Equatorial e São Tomé e Príncipe [44].
A percentagem de indivíduos exibindo uma atividade de PK
reduzida foi de 4,1% em Maputo e a mutação não sinónima
G829A (Glu277Lys) no gene
pklr
, à data apenas identificada
em três indivíduos mundialmente, foi identificada em
frequência elevada frequência de heterozigóticos portado-
res estimada entre 2,6% e 6,7%. Não foi encontrada uma
associação significativa entre a atividade reduzida da PK ou
a frequência do alelo 829A e a infeção malárica ou o desen-
lace clínico; no entanto, esta variante foi mais frequente nos
indivíduos com malária não complicada. Uma distribuição
geográfica entre a malária e uma frequência elevada de defi-
ciência em PK parece ocorrer o que sugere que a malária
poderá ser uma força seletiva que faz aumentar a frequên-
cia desta variante 277Lys.
Em STP, as missões do IHMT para o estudo e prevenção de
endemias eram frequentes nos anos 50 [13;14]. Os resulta-
dos dessas missões eram relatadas ao governo de Lisboa e
constituíam as bases de tomada de decisão em matéria de
controlo da malária nas ilhas. Estas missões foram de suma
importância para manter a malária manejável até o fim do
domínio colonial em 1974.
Neste arquipélago, em 2002, a prevalência de resistência
in
vitro
à CQ era de 92%. O marcador molecular
pfcrt
mutação
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