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A n a i s d o I HM T

Introdução

O conceito “

One health

” reconhece a necessidade do trabalho

conjunto de veterinários, médicos e cientistas ambientais

dada a interface dinâmica entre pessoas, animais e ambiente.

Este conceito é cada vez mais importante para doenças zoo-

nóticas, tais como as doenças transmitidas por carraças que

dependem de animais como reservatório [1].As carraças são

artrópodes resilientes e constantes no meio ambiente com

um ciclo de vida complexo. Estes ectoparasitas hematófagos

têm um efeito directo negativo no hospedeiro vertebrado

enquanto se alimentam e mais importante actuam também

com vectores, bem como reservatórios, de diversos agentes

patogénicos [2].

As carraças

Rhipicephalus microplus

, anteriormente designa-

das

Boophilus microplus

são os ectoparasitas mais importantes

na produção de gado bovino uma vez que não só levam a

redução de peso, afectam a produção de leite e carne mas

também estão envolvidos na transmissão de babesiose bovi-

na (

Babesia bovis

e

B. bigemina

) e de anaplasmose (

Anaplasma

marginale

) [3, 4] que são as doenças transmitidas por carra-

ças (DTC´s) mais prevalentes e com maiores custos na área

de produção de gado [5].

A utilização de acaricidas químicos é uma das maiores com-

ponentes de entre os métodos de controlo actualmente uti-

lizados, no entanto a sua aplicação é, na maioria dos casos

incorrecta, o que provoca uma eficácia limitada em termos

de redução das infestações; para além deste factor negativo

a sua utilização promove não só a selecção de ixodídeos re-

sistentes, como está associada a contaminação ambiental e

contaminação do leite e carne [6, 7]. O desenvolvimento de

novos acaricidas com características melhoradas seria uma

perspectiva possível mas é um processo longo e dispendio-

so, reforçando a necessidade de alternativas. O desenvol-

vimento de vacinas anti carraça é uma alternativa com um

potencial significativo visto que poderá combinar antigénios

promovendo o combate tanto ao vector como ao agente pa-

togénico [6, 8]. O objectivo principal de uma vacina contra

artrópodes vectores é o controlo das infestações do vector

tendo como consequência a redução de prevalência de do-

ença transmitida por vector (DTV´s). O impacto das va-

cinas nas DTV´s pode ser confirmado por (a) redução da

população de vectores levando a uma menor exposição dos

hospedeiros susceptíveis a agentes patogénicos, (b) redução

da capacidade vectorial do artrópode e, preferencialmente,

(c) uma combinação destes últimos factores [9, 10]. Com

a excepção do antigénio BM86, direccionado contra

R. mi-

croplus

, que alcançou o desejado

status

de vacina comercial

[11-14], a identificação de antigénios eficazes continua a

ser a maior limitação no desenvolvimento de novas vacinas

[15]. Os avanços na caracterização de genomas de carraças

bem como o uso da bioinformática, RNA de interferência

(RNAi), mutagénese, transcriptómica, proteómica entre

outras tecnologias, permitiu avanço significativo na área de

identificação de potenciais antigénios, tendo nos últimos

anos aparecido um número considerável de nova informa-

ção [8, 16-23].

Recentemente foram identificados genes diferencialmente

expressos em carraças

Rhipicephalus

fêmeas infectadas por

B. bigemina

usando genómica funcional [18]. A proteína Cal-

reticulina (CRT) foi identificada como estando envolvida

no processo de transmissão de

B. bigemina

em carraças

Rhi-

picephalus

. A CRT é uma proteína muito conservada tendo

sido identificada em diversos organismos com a excepção

de leveduras e procariotas [24]. Em carraças CRT é uma

proteína que existe nas glândulas salivares e saliva sendo que

devido às suas funções anti coagulação e de complemento,

muito provavelmente é essencial na transmissão de agentes

patogénicos e no processo de alimentação. Assim a possibi-

lidade de usar esta proteína numa vacina contra carraças é

evidenciada [25]. De facto esta proteína foi já utilizada em

diversos estudos de imunização [26-28] com alguns resul-

tados positivos. No entanto em ensaios de imunização com

CRT recombinante em gado bovino, contra

R. microplus

, os

resultados não foram encorajadores devido á baixa capaci-

dade imunogénica desta proteína em bovinos [28].

A caracterização de potenciais antigénios protectores por

vacinação tem um custo muito elevado especialmente

quando direccionados a

R. microplus

. Esta carraça tem uma

elevada especificidade de hospedeiro [29] e sua produção

em laboratório tem muitos constrangimentos [30]. Assim a

necessidade da existência de bovinos é quase sempre obri-

gatoriedade aquando da condução de experiências labora-

toriais. Uma alternativa de baixo custo para testar novos

compostos é a directa inoculação nas carraças de drogas

ou anticorpos contra determinada proteína. Apesar de não

abolir totalmente o uso de bovinos reduz significativamente

a sua necessidade [31]. A alimentação artificial de carraças

é uma técnica amplamente utilizada para diferentes propó-

sitos [31-34], para além de mimetizar o processo natural

de alimentação tem a vantagem de ser possível manipular

a refeição de sangue. A técnica de alimentação artificial por

tubos capilares pode ser utilizada em estudos de imuniza-

ção/vacinação uma vez que anticorpos policlonais ou mo-

noclonais podem ser suplementados á refeição [31, 32] e

o seu efeito em parâmetros biológicos pode ser analisado

posteriormente. Este é um método aparentemente rápido,

simples e de baixo custo para caracterizar e seleccionar an-

tigénios que futuramente poderão integrar um estudo de

vacinação em bovinos.

No presente estudo grupos de carraças fêmeas adultas (

R.

microplus

parcialmente alimentadas) foram alimentadas com

sangue bovino suplementado de anticorpos policlonais anti

CRT e também com sangue bovino infectado com

B. bige-

mina

suplementado dos mesmos anticorpos. A técnica de

alimentação artificial por tubos capilares foi utilizada para

analisar o efeito de anticorpos policlonais em parâmetros

biológicos e na infecção por

B. bigemina

.