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mosquito agressivo e incómodo, com atividade de picada diurna.

Estudos efetuados logo no ano seguinte confirmaram a presença

de

Ae.aegypti

em várias municipalidades da cidade do Funchal (Al-

meida

et al

., 2007).

Na sequência da expansão e estabelecimento do

Ae.aegypti

na Ilha

daMadeira,Almeida e colaboradores (2007) alertarampara o fac-

to de que a sua presença poderia permitir a transmissão local de

inúmeros arbovírus, fazendo referência à situação epidemiológi-

ca que, nesse mesmo ano, se registara em Itália. Aqui, um surto

com mais de 300 casos notificados, envolveu infeções pelo vírus

Chikungunya (Rezza

et al

., 2007) em associação a uma população

em expansão de

Ae.albopictus

. Os últimos registos de uma epide-

mia causada pelo DENV na Europa continental datam do ano de

1927-1928, quando este vírus, veiculado por

Ae. aegypti

, afetou a

Grécia, tendo causado várias mortes (Louis, 2012). Desde então,

e até muito recentemente, a transmissão autóctone de DENV na

Europa encontrava-se limitada a duas notificações datadas do ano

de 2010, durante o qual foi registada transmissão esporádica do

DENV no sul de França e na região de Dubrovnik (Croácia), e

onde

Ae. albopictus

foi o vetor implicado (La Ruchet

et al

., 2010;

Gjenero-Margan

et al

., 2010).

Surpreendentemente, a 3 de Outubro de 2012 as autoridades de

saúde pública portuguesas reportaram a confirmação do diagnós-

tico de infeção pelo DENV emdois residentes na Ilha da Madeira,

os quais não referiram história recente de viagens para fora desta

região autónoma do território português. Ambos os indivíduos

apresentavam um quadro clínico febril não complicado, com

leucopenia, trombocitopenia e disfunção hepática (Comunicado

DGS 2012 3.10.2012). Neste surto, um total de 2182 casos de

Dengue foi reportado pelas autoridades portuguesas (http://

www.dgs.pt/?cn=683368347243AAAAAAAAAAAA)

, sem re-

gisto de qualquer fatalidade (ECDC18.03.2013).A análise de um

fragmento da sequência do genoma do DENV circulante revelou

tratar-se de DENV do serotipo 1 (DENV-1) com elevada seme-

lhança com estirpes virais circulantes na América latina (Alves

et

al

., 2013).

Aentrada doDENVno arquipélago daMadeira não foi umevento

inesperado, não sendo mais que o reflexo da expansão epidémica

deste vírus a nível global.Apesar de tudo, quando combinamos o

afluxo regular de turistas de todo o mundo ao arquipélago com as

dimensões desta epidemia, verificamos tratar-se de um potencial

problema de saúde pública.Ao todo foram confirmados laborato-

rialmente 43 casos de exportação do vírus através de turistas por-

tugueses (n=10), britânicos (n=14), alemães (n=10), franceses

(n=3), finlandeses (n=2), dinamarqueses (n=1), suecos (n=1),

espanhóis (n=1) e eslovenos (n=1) que visitaram a ilha da Madei-

ra durante o surto. (informação disponível emwww.promed.org

a 03.02.2012).

Até hoje, não há registo do estabelecimento de

Ae. aegypti

em

qualquer país da Europa Ocidental e mediterrânica. No entanto,

não só o risco de que tal aconteça não pode ser desconsiderado,

como o estabelecimento do DENV como um vírus endémico na

Madeira deverá ser avaliado cuidadosamente. Para além de um

impacto na saúde dos habitantes da ilha e das possíveis consequên-

cias no turismo local, tal facto poderia aumentar o risco da ex-

pansão do DENV, a curto-prazo, para a Europa Continental. A

possibilidade da doença se instalar de modo endémico na Madeira

está intimamente associada à possibilidade de ocorrer transmis-

são vertical do vírus entre fêmeas de mosquito infetadas e a sua

descendência.A transmissão vertical (também designada transo-

várica) do DENV por

Ae. aegypti

,

Ae. albopictus

e

Ae. scutelaris

(Ro-

sen

et al

., 1983; Mitchell & Miller, 1990; Shroyer, 1990) parece

ocorrer a baixa frequência no laboratório, se bem que os valores

reportados (1-4%) deverão corresponder a subestimativas, espe-

cialmente dependentes das abordagens experimentais utilizadas

para a sua deteção (Joshi

et al

., 2002;Günther

et al

., 2007).Na re-

alidade, são já vários os estudos onde se sugere que, naturalmente,

a transmissão vertical do DENV parece ocorrer frequentemente.

Nesta situação, a transmissão da vírus entre a fêmea infetada e a

sua descendência é importante para a manutenção do vírus entre

períodos epidémicos, especialmente se os hospedeiros vertebra-

dos não-imunes foremescassos, ou se as condições ambientais não

forem favoráveis à atividade vetorial (Joshi

et al

., 1996; Chye

et al

.

1997;Thenmozhi

et al

., 2000;Thenmozhi

et al

., 2007; Bina

et al

.,

2008; Le Goff

et al

., 2011;Mulyatno

et al

., 2012).

Por outro lado a inexistência de transmissão vertical na população

culícida da Madeira não garante que não ocorrerá um novo surto

epidémico na próxima época de maior densidade do vetor. Uma

nova introdução de DENV pode ocorrer, sendo que este pode ser

do serotipo 1 ou de qualquer outro dos restantes três serotipos.

Esta possibilidade é patente nos últimos casos de dengue regista-

dos na região, todos eles importados (

http://www.dgs.pt/?cn=

683368347243AAAAAAAAAAAA.).

Uma vez que não existe disponível uma vacina eficaz ou qualquer

tipo de terapêutica específica contra o DENV, o seu controlo de-

pende da redução das populações vetoriais, assim como da imple-

mentação de sistemas de vigilância que, atempadamente, permi-

tam a identificação de eventos epidémicos. Para tal, é desejável

que seja adquirido um conhecimento estreito relativo à dinâmica

viral quer no Homem quer nos mosquitos, durante e entre epi-

demias, numa tentativa de tornar claros os fatores que originam e

influenciam estas últimas.

Artigo Original

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