Table of Contents Table of Contents
Previous Page  113 / 138 Next Page
Information
Show Menu
Previous Page 113 / 138 Next Page
Page Background

113

A n a i s d o I HM T

rei D. Duarte, considera-a contagiosa, afirmando ser necessário

"…mandar afastar os gafos por ser doença contagiosa que de

um a outros se pega…"

- O "Tratado da Conservação da Saúde dos Povos", de 1756, de

António Ribeiro Sanches aconselha a necessidade de um local

bem arejado para instalar as leprosarias e afirma que o excesso

de calor favorecia o desenvolvimento da doença.

- Bernardino António Gomes dedicou vários estudos à lepra

em Portugal e trabalhou até no Hospital de S. Lázaro.Além de

uma outra obra sobre esse tema, escreveu em 1821 a "Carta aos

Médicos Portugueses sobre a elefantíase, noticiando um novo

remédio para a cura…", o uso interno do cloreto de sódio. Pro-

pôs também a concentração das leprosarias existentes no país

em apenas três, situadas em Lisboa, Porto e Coimbra.

- Pela mesma época, Francisco Xavier Pimenta aconselhou as

águas sulfurosas (de Belver) para o tratamento da lepra e An-

tónio José de Sousa Pinto, farmacêutico em Lisboa, defendeu

também os benefícios da hidrologia. Foi aliás diretor do Hospi-

tal de S. Lázaro, cerca de 1830.

Como já o referimos a lepra decresceu significativamente a par-

tir do século XVI, mas não se extinguiu ainda totalmente. Se

na Europa está hoje limitada a uma dezena de novos casos/ano,

por país e quase todos eles de importação, a doença continua

endémica em algumas partes da América do Sul, de África e

sobretudo na Ásia. Episódios epidémicos com

recrudescimentos são assinalados de tempos a

tempos e um dos mais importantes foi no Ha-

vai em 1860, onde a repressão mais uma vez

se abateu sobre os doentes, que foram isolados

à força e abandonados à sua sorte na ilha de

Molokai.Aí

, o padre belga Damien deVeuster

foi em seu auxílio, socorrendo-os e tratando-

-os, mas morrendo também ele pela doença,

em 1889.

Nessa data já o médico norueguês G.

H.Ar

-

mauer Hansen (1841-1912) tinha identifica-

do a

Mycobacterium Leprae

como o agente infecioso causador

da lepra. Fê-lo em 1874 e a 1ª Conferência Mundial sobre a

Lepra, em Berlim, em 1897, reconheceu-a finalmente como

uma doença infeciosa e traçou o modelo ideal para as leprosa-

rias modernas, baseadas numa medicina social.

Porém, a polémica sobre o caráter infecioso ou hereditário da

lepra estendeu-se ainda pelos primeiros anos do século XX. Foi

até objeto de uma acesa discussão no XV Congresso Interna-

cional de Medicina, que se realizou em Lisboa em 1906, onde

Hansen esteve presente e teve como principal opositor o turco

Zambaco Pacha que invocou, para a sua tese da hereditarieda-

de, nomes como Virchow (Berlim, 1897); Hutchinson (Paris,

1900);Delamarre (Paris,1902);Neumann (Viena,1903);Zefe-

rino Falcão (Lisboa, 1903); Behring (1903); Hallopeau (1904);

Raymond (Paris, 1905);Magalhães (Brasil);Kaposi (Viena), etc.

A controvérsia pode explicar-se devido aos mecanismos imuno-

lógicos, ambientais, culturais e de higiene, que estão associados

à doença e à sua inequívoca contagiosidade.A forma mais agres-

siva da doença, a forma mutilante, felizmente hoje bem mais

rara, parece contudo estar também relacionada com deficiências

imunitárias.

Hoje, a medicina pode curar a maioria dos doentes de lepra.

Em 1943, o americano Guy Faget usou uma sulfona (Promin)

para deter o desenvolvimento da doença que progredia muitas

vezes com deformidades da face, amputações de dedos e des-

truição da sensibilidade das mãos e pés. Com esta terapêutica

abria-se uma via importante para controlar a doença e em 1948

a OMS incluiu a lepra no seu programa de combate às doenças

infeciosas.

Decorrente do aumento da mobilidade populacional, que traz

à lembrança o período das cruzadas, reacenderam-se os temo-

res. Por 1973, soou um novo o alarme em face da resistência

do micro-organismo aos medicamentos disponíveis e perante

as sucessivas tentativas frustradas de uma prevenção primária

com imunoprofilaxia, incluindo a produção de vacinas, todas

infrutíferas. Porém, em 1960, Charles Shepard desenvolvera

no laboratório um modelo da

Micobacteria leprae

que permitiu

depois a Dick Rees e Mill Hill, compreenderemmelhor o me-

canismo de ação das sulfonas no combate à bactéria. Um novo

regime, com combinação de várias drogas, foi introduzido

após a declaração deAlmaAta, de 1978, quando se proclamou

a "Saúde para todos no ano 2000". Em 1982, chegava-se ao

regime terapêutico combinando a dapsona, a rifampicina e a

clofazimina e a 44ª Assembleia Mundial de Saúde, em 1991

lançou a expectativa de extinguir a lepra até ao ano 2000 (me-

nos 1 caso por 10.000 habitantes). Depois da varíola, poderia

ser a segunda doença a ser extinta, mas o objetivo não foi atin-

gido pese embora a prevalência da doença ter diminuiudo em

93%. Persistem bolsas geográficas com números significativos

de casos, onde a lepra permanece como um grave problema

de saúde pública, fundamentalmente na Índia, Brasil e Indo-

nésia, calculando-se atualmente a existência de uns 250 000

indivíduos afetad

5- Era formado por uma cerca murada, com uma capela dedicada a S. Lázaro e

rodeada pelas habitações dos gafos. Em frente da Igreja enterravam-se os leprosos

ali falecidos, num largo onde havia o Cruzeiro de S. Lázaro, hoje no MuseuArqueo-

lógico do Carmo.

Fig. 7:

G. H.

Armauer Hansen

(1841-1912)

Fig. 8:

Família de leprosos Portugal, Foto de A. Pimenta, 1906