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Artigo Original

programas de erradicação da malária, e a utilização extensiva

do DDT (diclorodifeniltricloroetano) como pesticida/insec-

ticida agrícola devem ter contribuído para o efeito.

A dispersão do

Ae.albopictus

nas últimas 3 décadas é, por mui-

tos, considerada a “terceira vaga” de dispersão de mosquitos

potencialmente causadores de doença mediada pelo Homem

[30].

A partir da sua área de dispersão natural, centrada na

Ásia oriental e no subcontinente indiano, esta espécie inva-

diu, em primeiro lugar, as ilhas do Pacífico, para depois se

distribuir pelos Velho e Novo Mundos [19], frequentemente

em associação com o comércio de pneus usados e plantas

ornamentais [31]. As introduções repetidas de

Ae. albopictus

na Europa começaram a ser registadas por volta da década

de 1970 e, neste momento, populações ativas deste vetor

podem ser encontradas na Albânia, Bósnia e Herzegovina,

Bulgária, Croácia, França, Grécia, Itália, Malta, Mónaco,

Montenegro, São Marino, Sérvia, Eslovénia, Espanha, Suíça

e na cidade do Vaticano [31]. Assim, à semelhança do que

acontece com

Ae. aegypti

, Portugal continental é considerado

um território de alto risco para a introdução desta espécie,

que muito recentemente foi detetada em novos territórios

espanhóis, nomeadamente na província de Andaluzia, emAl-

meria, Granada e Málaga [32].

Ainda que os motivos que terão dado suporte à recente

emergência do DENV pelo mundo sejam complexos e difí-

ceis de avaliar na sua totalidade, estes devem incluir altera-

ções na demografia humana, urbanização rápida, alterações

nas infraestruturas e políticas de saúde-pública, bem como

um aumento na resistência das populações vetoriais aos

inseticidas. Neste contexto, a Europa não tem escapado à

dispersão do DENV, ainda que o último surto ocorrido na

Europa continental tenha sido registado na Grécia há quase

9 décadas (1927-1928;

[33]

). Desde essa altura, apenas têm

sido reportados casos de transmissão esporádica de DENV,

tendo os mais recentes sido identificados em França (2010 e

2013) e na Croácia (2010). Em todas estas situações o vetor

implicado na transmissão foi

Ae.albopictus

[34,35,36].

No en-

tanto, 2012 foi palco de um surto de DENV de proporções

moderadas (2186 casos notificados), o qual teve lugar na Ilha

da Madeira e foi mediado não por

Ae. albopictus

mas sim por

Ae. aegipti

, presente no território desde 2005

[37].

Curiosa-

mente, e à semelhança do que aconteceu noutras regiões da

Europa,

Ae. aegypti

fora descrito no território de Portugal

continental até 1953

[38]

mas não foi detetado em nenhum

dos levantamentos entomológicos levados a cabo mais re-

centemente

[7,8] (Fig. 4).

Na sequência da deteção desta es-

pécie na região autónoma da Madeira, um novo projeto foi

de imediato implementado em colaboração com as autorida-

des de saúde locais (IASAUDE: Instituto de Administração

da Saúde e Assuntos Sociais). Este projeto marca o início de

uma série de trabalhos que traduzem o empenho do IHMT

no desenvolvimento desta área do conhecimento. O projeto

em causa tinha com objetivo primordial a avaliação do risco

de emergência de arboviroses veiculadas por

Ae. aegypti

nessa

região autónoma do território nacional. Curiosamente, tal

veio a suceder ainda durante o primeiro ano de execução

do projeto, com a declaração oficial de um surto de dengue

neste território em Outubro de 2012. Este surto, provocado

por vírus do serotipo 1 (DENV1), registou um total de 2186

casos prováveis sem, no entanto, a ocorrência de fatalida-

des. Tendo contribuído, inclusive, para a notificação oficial

da presença de

Ae. aegypti

no arquipélago da Madeira

[37]

o IHMT tem sido um parceiro privilegiado das autoridades

de saúde madeirenses no que diz respeito aos estudos de

doenças transmitidas por vetores, e desde o surto de DENV

em 2012 que esta colaboração se intensificou. Durante este

surto, o IHMT funcionou como conselheiro externo a ní-

vel local no que diz respeito à monitorização das populações

de mosquitos e seu controlo

[39]

bem como a nível central

quando alguns dos seus virologistas, médicos e entomologis-

tas integraram um painel de peritos, conselheiros da Dire-

ção Geral da Saúde (DGS). No rescaldo do referido surto, o

IHMT veio a ser convidado e integrar a plataforma da DGS

de entomologistas e peritos em Saúde Pública para o contro-

lo e prevenção das doenças transmitidas por vetores.

A atualidade

Mais recentemente, as atividades de investigação levadas a

cabo no IHMT no que aos arbovírus e às doenças por eles

causadas diz respeito, têm-se não só intensificado como es-

tendido muito para além dos iniciais estudos entomológicos.

Disso são prova os múltiplos trabalhos publicados versando

sobre o seu diagnóstico clínico e laboratorial

[40], a carate-

rização de vírus [41], a análise genética de vetores [42], e a

sua modelação espacial [43], bem como trabalhos em temá-

ticas de charneira como a das ciências sociais aplicadas ao

controlo vetorial [44,45]. Esta experiência tem permitido ao

IHMT manter-se ativo como Observador Global de Saúde

de que é prova a notificação precoce de DENV1 em Luanda

(Angola) março de 2013 [40] e a notificação da co-circulação

de DENV e CHIKV em Angola em 2014 [41]. Finalmen-

te, e enquanto instituição colaboradora da OMS-África, ao

IHMT foi ainda solicitado apoio técnico (primeiro trimestre

de 2014) para fazer face a um evento inesperado de saúde

pública, identificado como um surto de DENV no norte de

Moçambique. Para além da estrita atividade investigacional,

correntemente, o IHMT apoia atividades de monitorização

com o projeto MosquitoWeb (

http://mosquitoweb.ihmt.

unl.pt/) no âmbito dos programas de vigilância entomoló-

gica de base comunitária, e mantem a sua colaboração com

as autoridades da Região Autónoma da Madeira na vigilância

vetorial de

Ae. aegypti

e em estudos piloto (Fig. 5) que visam

desenvolver novas metodologias para o controlo desta espé-

cie nesse território [46].