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A n a i s d o I HM T
Rita Lobo e João Lourenço Monteiro refletem sobre
a
trajetória de Francisco Cambournac na Organização
Mundial de Saúde (1952-1964)
, contribuindo para escla-
recer alguns elementos menos conhecidos da biografia de
Cambournac, durante o período de permanência na Orga-
nização Mundial de Saúde, como representante do governo
português. Com base em bibliografia primária de arquivo,
os autores discutem os meandros da escolha de Cambou-
nac, como malariologista de referência internacional, para
o
Bureau
Regional africano da OMS, na interseção dos seus
interesses pessoais, do Instituto de Medicina Tropical, do
Estado português e dos seus congéneres naquela organi-
zação, nascida no âmbito da saúde global pós IIª Guerra
Mundial.
Ivone Manzali de Sá, com um artigo intitulado
Produtos
naturais e antimaláricos: a cooperação científica entre
Brasil e China na década de 1980
, apresenta-nos um es-
tudo sobre a cooperação científica internacional entre a Chi-
na e o Brasil que envolveu a circulação dos investigadores
da Fundação Oswaldo Cruz e de grupos de investigadores
chineses no âmbito da pesquisa de produtos naturais e anti-
maláricos durante a década de 1980, destacando-se as ações
desenvolvidas para a produção de um medicamento antima-
lárico a partir da
Artemisia annua
.
3.
Medicina tropical e ambiente
Diego Peral e FJ Suárez-Guzmán apresentam-nos uma
reflexão sobre os
Cuidados de Saúde contra a febre-
-amarela no sudoeste da Extremadura (Espanha) no
século XIX
centrando-se nas epidemias de febre-amarela,
em Espanha, nesse século, procuram analisar e discutir as
medidas de saúde pública utilizadas no sudoeste da Extre-
madura, recorrendo ao estudo dos arquivos municipais e
paroquiais de vários municípios, para concluírem que o
controle dos vetores (que historicamente acompanhou o
desenvolvimento das cidades) continua a preencher a agen-
da da medicina contemporânea.
Com o título
Para que os jovens médicos paraguaios
exercitem uma dupla missão, científica e patriótica: a
contribuição do naturalista e botânico Moisés Santia-
go Bertoni (La Civilización Guaraní, 1922-1927)
,
Eliane
Fleck apresenta-nos o posicionamento do naturalista suíço,
Moisés Santiago Bertoni (face aos conhecimentos de
Materia
Medica
deixados pelos jesuítas entre finais do séc. XIX e o
ínicio do século XX), com enfoque no ambiente natural e
humano dos indígenas guaranis na América do Sul (particu-
larmente Argentina e Paraguai) para deixar uma mensagem
muito clara ao médicos: por um lado o dever de valorizarem
a flora e a fauna nativa, como veículos de cura; por outro,
pela revalorização do indígena, como essência da identida-
de nacional, portadora de saberes e práticas da farmacopeia
americana.
Ainda no âmbito da história natural,Wellington Filho apre-
senta-nos
A natureza brasílica nas farmacopeias do Frei
João de Jesus Mari
a
,
com base no estudo das publicações
de Frei Jesus Maria,
Pharmacopea Dogmatica Medicochimica, e
Teórico-pratica
e
Historia Pharmaceutica das Plantas Exóticas,
que
seguindo a classificação lineana e os ideais de ilustração de
DomenicoVandelli, procura assumir uma posição, nem sem-
pre clara, entre a necessidade de encontrar uma forma obje-
tiva de inventariar a flora colonial portuguesa e as práticas de
cura tradicionais utilizadas pelos nativos, a partir das mesmas
espécies. Este posicionamento reflete também o percurso da
profissionalização dos boticários no século XVIII português,
no qual Frei João Maria se inscreve.
Em
Doenças endémicas e epidémicas em Lourenço Mar-
ques no início do século XX: processos de controlo versus
desenvolvimento urbano
, Ana Cristina Roque, partindo da
análise da documentação da Direção dos Serviços de Saúde
e da Direção de Obras Públicas, reflete sobre a eficácia e os
resultados das reformas dos serviços de saúde, designada-
mente no referente à assistência médica ao indígena, como
resultado do desenvolvimento urbano e da necessidade de
implantação do sistema colonial em Moçambique.
Planos integrados, lagos artificiais e medicina tropical
– o caso de Cahora Bassa nos anos 1960
-
1970
,
da autoria
de Ana Paula Silva, é um artigo que pretende suscitar algu-
mas questões de impacto ambiental na saúde da população
moçambicana durante a construção da albufeira da barragem
de Cahora Bassa, em Moçambique, realizado pelo governo
português nos anos 60-70 do século XX.
Possam estas contribuições ajudar a consolidar um grupo de
investigação em História da Medicina Tropical e assim con-
tribuir para a constituição de uma rede mais alargada de in-
vestigadores e interesses temáticos, capaz conferir a esta área
de investigação a sua identidade própria.