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A n a i s d o I HM T

o início. Parece que no começo de nossa história, chegava-se ao

campus, principalmente, de trem. Os pesquisadores encontravam-

-se na Praça da República para pegar o trem das 10h30m. Em

20 minutos chegavam na São Francisco Xavier. De lá, pegavam

a… linha da Leopoldina e em 10 minutos estavam no portão da

atual Leopoldo Bulhões. Na entrada, três cavalos esperavam os

cientistas mais graduados. Outra alternativa, era por via maríti-

ma com uma embarcação pertencente à Repartição Fiscalizadora

da Pesca, que ancorava num local bem atrás do prédio do Minis-

tério da Saúde, na Avenida Brasil.

Desses tortuosos caminhos, os pesquisadores encontravam aqui

no campus duas casas toscas - uma na colina entre o Hospi-

tal Evandro Chagas e o Pavilhão Rocha Lima, que fabricava a

vacina contra a peste. A outra, maior, ficava perto das atuais

edificações mouriscas.

Os pesquisadores comiam na varanda. Ao meio dia partiam para

o almoço. A mesa estava posta sobre meia porta que se apoiava

sobre duas barricas vazias e era coberta parcialmente de toalha

grosseira, havendo dois bancos de madeira de cada lado para os

convivas se sentarem.Todos se apressavam porque a comida não era

muito abundante: um clássico ensopado de galinha com batatas,

arroz, pão e para terminar algumas bananas e café ralo. Quem se

atrasava, só encontrava ossos e traços de arroz. Não havia jantar e

quem não trouxesse marmita, tinha que se contentar com as nume-

rosas frutas que podiam ser colhidas no campus...”

9

Diante da impossibilidade da Prefeitura em continuar

mantendo a nova instituição, ela foi transferida para a

Diretoria de Saúde Pública do Ministério da Justiça e

Negócios Interiores, e inaugurada oficialmente em 23 de

julho como Instituto Soroterápico Federal. O Presidente

da República dos Estados Federativos do Brasil é (Manuel

Ferraz de) Campos Sales. Em dezembro de 1902 o Barão

de Pedro Affonso renuncia ao posto de diretor adminis-

trativo e Oswaldo Cruz assume, aos 30 anos de idade, a

total coordenação do Instituto.

Pouco depois, a equipe inicial é desfalcada de dois compo-

nentes: Ismael da Rocha, chamado de volta para o labora-

tório do Exército, e Carré, que regressava à França com

problemas de saúde, segundo uns, ou com receio da febre

amarela, segundo outros. A dedicação e competência do

restante da equipe já era, entretanto, reconhecida, sendo

julgada necessária apenas a contratação de um estudante de

medicina, Antônio Cardoso Fontes, e de alguns auxiliares.

Primeiras contribuições tecnológicas

e produtos relevantes

Cerca de seis meses depois da fundação do Instituto, o

que Oswaldo Cruz conseguiu produzir, utilizando inicial-

mente o bacilo que isolara em Santos e aperfeiçoando os

métodos até então disponíveis, foi apenas uma vacina e

um soro, que seriam reconhecidos internacionalmente

como excelentes (por Émile Roux) e entre os mais efica-

zes então existentes (segundoW. Kolle e R. Otto, do Ins-

tituto de Doenças Infecciosas de Berlim - diretor Robert

Koch). O estado da arte foi exposto em extenso artigo no

Brazil-Medico em 1901, onde são detalhados “

os argumen-

tos e factos que orientaram o Instituto na escolha do processo que

adaptou

”, o método de fabricação, a técnica da vacinação,

as vantagens da vacina e os cuidados que deviam acompa-

nhar sua aplicação. É talvez a primeira conquista nacional

e internacional, voltada à saúde pública do Instituto de

Manguinhos.

Os cientistas de Manguinhos gostam de enfatizar que,

não obstante às justificativas e os motivos, mesmo, para a

criação do IOC, a primeira publicação do novo Instituto,

também no Brazil-Medico de 1901, nada tem a ver com a

produção de soros ou vacinas ou muito menos com a pes-

te. Ele intitulava-se “

Contribuição para o estudo dos culicídeos

do Rio de Janeiro, pelo Dr. Oswaldo Gonçalves Cruz (trabalho do

Instituto de Manguinhos)

”. Ele revela a vocação acadêmico-

-científica

10

do criador do Instituto e sua recusa à ideia de

uma instituição destinada exclusivamente à fabricação de

soros e vacinas. Menos de três anos antes (novembro de

1898) os italianos Amico Bignami, Giovanni Battista Gras-

1

Benchimol, Jaime Larry (Coord.). Manguinhos do sonho à vida: a ciência na

belle époque. Rio de Janeiro: Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz, 1990.

2

Lima, Nísia Trindade; Marchand, Marie-Hélène (Org.). Louis Pasteur & Os-

waldo Cruz. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz/Fundação BNP Paribas Brasil,

2005.

3

“Nenhum dos cinco remanescentes tinha a mínima experiência na produção

de vacina ou soro contra a peste. Apenas Oswaldo Cruz havia visitado a seção

de soros do Instituto Pasteur, mas seu interesse estava no preparo da antitoxina

diftérica. Os dados disponíveis na escassa literatura careciam de detalhes pre-

cisos, que permitissem seu preparo fora dos laboratórios produtores”.

4

Website do Instituto Oswaldo Cruz. Conteúdos da seção ‘História’, disponí-

vel em:

www.ioc.fiocruz.br

.

5

“Esse profissional existe e já está no Brasil. Trata-se do Doutor Oswaldo

Cruz”.

6

Daniel-Ribeiro, C.T. & Coura, J.R. (2000). Editorial. Propos à l’ occasion

du centenaire de l´Institut Oswaldo Cruz. Médecine Tropicale, 60 (1): 33-34.

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Apesar de ser conceito comum que os trabalhos começaram logo, sem ne-

nhuma comemoração, Ezequiel Dias afirma que não foi bem assim e que teria,

sim, havido uma pequena cerimônia, onde estavam presentes Cesário Alvim,

Prefeito do Rio, o Ministro do Interior, Epitácio Pessoa, e o professor Nuno de

Andrade, Diretor de Saúde Pública do Governo Campos Salles. Também es-

tavam presentes representantes da comunidade médica: Camilo Terni, Carlos

Seidl, Emílio Gomes e representantes da imprensa da época: Gazeta de Notí-

cias, O País, Cidade do Rio, Revista da Semana e a Tribuna. No dia seguinte a

Tribuna noticiava a criação do Instituto assim: “Inaugurado Laboratório com

todo rigor científico tendo-se despendido 40 contos de réis, entre cavalos, ins-

talações e material”.

8

Médico Paraense, renomado Parasitologista e especialista em Malacologia e

Ex-Vice-Presidente da Fiocruz.

9

Extraído do discurso de Cláudio Tadeu Daniel-Ribeiro, 21º Diretor do IOC,

na cerimônia de posse dos novos chefes de Departamento e de comemoração

dos 95 anos do Instituto Oswaldo Cruz em 25 de maio de 1995.

10

Avocação acadêmico-científica de Oswaldo G Cruz foi certamente moldada

ou reforçada por seu treinamento e experiência no Institut Pasteur em Paris,

que já manifestava, com competência e determinação, a mesma inclinação

para o desenvolvimento e condução simultâneos de estudos científicos mi-

crobiológicos e vacinais e a produção de imunorreagentes para a proteção da

população contra agravos causados por agentes infecciosos.