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S114

Notas de Investigação

Introdução

Em regiões subsaarianas a mortalidade infantil é ainda

muito alta, apesar das reduções alcançadas durante a ini-

ciativa de desenvolvimento do Milénio (MDG). Entre

1990 e 2015, a mortalidade em crianças menores de

cinco anos foi reduzida em 52% (em comparação com

o objetivo de reduzi-la em dois terços) [1]. A pneumo-

nia permanece como a principal causa de mortalidade

entre crianças, assumindo, porém, particular relevância

em países em desenvolvimento [2].Várias iniciativas têm

sido propostas ultimamente, visando reduzir a mortali-

dade associada à doença. As orientações disponibilizadas

pela OMS no “Manejo Integrado para o Atendimento de

Doenças na Infância” e a introdução das vacinas contra

Streptococcus penuemoniae

e

Haemophilus influenzae

tipo b,

na maioria dos programas nacionais de imunização, são

exemplos bem-sucedidos [3] Porém, se a manutenção

dessas estratégias é de demasiada importância, a introdu-

ção de novas medidas preventivas faz-se também necessá-

ria, uma vez que existem outros microrganismos envol-

vidos na pneumonia pediátrica. Uma medida preventiva

complementar poderá surgir do estudo do microbioma

humano, ou seja, a totalidade dos microrganismos pre-

sentes no corpo humano.

No que se refere ao microbioma humano, há um cres-

cente interesse e evidências de associação entre deter-

minadas patologias e o microbioma. Alterações no mi-

crobioma intestinal foram associadas a várias condições

em adultos (obesidade, diabetes, doença inflamatória

intestinal) [4-6] e em crianças (desnutrição) [7]. De uma

forma geral, ter um microbioma mais diversificado está

associado a estados mais saudáveis [8,9]. Além disso, as

intervenções visando o microbioma intestinal tais como

a administração de probióticos têm sido estudadas para

avaliar a sua eficácia em patologias gastrintestinais, com

resultados promissores. O microbioma respiratória tem

recebido menos atenção sendo escassos os estudos em

crianças. O microbioma respiratório parece estar asso-

ciado com infecções do trato respiratório, e a administra-

ção de probióticos nasais está associada com diminuição

da virulência e prevalência de patogénicos na nasofaringe

[10,11]. Há também algumas evidências de associações

entre o microbioma intestinal e o microbioma respira-

tório [12,13]. Se estas associações foram confirmadas,

potencialmente abriria a porta para estratégias terapêuti-

cas e preventivas, visando um dos locais, mas com efeitos

benéficos para ambos os locais.

O objetivo principal desse projeto é caracterizar o mi-

crobioma respiratório associado a uma menor incidência

e gravidade de episódios de pneumonia, em crianças de

uma área semirrural de Angola. Esse projeto postula e

propõe caracterizar o microbioma do trato respiratório

superior implicado em proteção ao desenvolvimento de

pneumonia em crianças. Pretende-se dessa forma, elabo-

rar uma nova estratégia preventiva de modo a diminuir a

incidência de pneumonia em crianças, através da modifi-

cação do microbioma do trato respiratório.

Materiais e métodos

O local de estudo será o Centro de Investigação em

Saúde de Angola (CISA). O CISA está situado numa área

do continente africano onde, na proximidade, não existe

nenhum outro centro de investigação com características

semelhantes, localizados principalmente na África Orien-

tal ou Central. As instalações do CISA estão localizadas na

cidade do Caxito, a 60 km de Luanda, no centro urbano do

município do Dande, na Província do Bengo. Esta província

ocupa um largo território que rodeia a província da capital,

Luanda, com uma população, de acordo com o Recensea-

mento Geral da População de 2014, de 356 641 habitan-

tes, fazendo fronteira a norte com as províncias do Zaire e

do

Uíge.As

três comunas do Município do Dande: Caxito,

Mabubas e Úcua; foram definidas como a área de interven-

ção prioritária do Projeto CISA, tendo uma população de

aproximadamente 60 000 habitantes distribuídos por 69

bairros com características quer urbanas, quer rurais.Nessa

área, o CISA tem implementado um sistema de vigilância

demográfica que consiste em rondas anuais com coleta de

dados demográficos de todos os membros da comunidade,

o qual possibilita acompanhar os participantes com garan-

tias.Além disso, o CISA segue padrões de alta qualidade no

manejo dos dados colectados, com criptografia de identi-

ficadores e acesso aos bancos de dados somente a pessoal

autorizado entre outras medidas de proteção de dados.

Na área de estudo do CISA são registados aproximadamen-

te 800 nascimentos por ano. Um mínimo de 500 recém-

-nascidos serão recrutados seguindo os procedimentos

éticos necessários para formar a primeira coorte de recém-

-nascidos de Angola, e por extensão, de África Ocidental.

Amostras e dados clínico-epidemiológicos serão colecta-

dos, sucessivamente, ao longo de pelo menos dois anos,

possibilitando documentar a dinâmica de aquisição do mi-

crobioma nas crianças. Essa estratégia possibilitará a obten-

ção de informação valiosa quanto ao melhor momento para

implementar medidas preventivas. Finalmente, o micro-

bioma respiratório de 100 crianças que apresentaram pelo

menos um episódio de pneumonia ao longo do seguimento

será comparado com o microbioma respiratório de outras

100 crianças saudáveis, pareadas por sexo e idade.

As amostras respiratórias de eleição são os aspirados naso-

faríngeos. Este tipo de amostra permite não só caracterizar

as comunidades bacterianas do trato respiratório superior,

mas também os vírus respiratórios presentes. Uma vez co-

lhidas, as amostras serão mantidas a 4 °C e transportadas

ao laboratório do CISA para processamento, que inclui a