78
Artigo de Revisão
vulnerabilidade que diferenciam e informam diferentes
dispositivos acionados nas práticas de saúde. Em par-
ticular, ressalta a ideia de o que tem efeito e funciona
para os sujeitos socialmente ‘incluídos’ pode não fazer o
mesmo sentido e ser desprovido de efectividade quando
em relação a grupos marcados pela exclusão e vulnera-
bilidade. Esse esforço de problematização exige pôr em
causa, por exemplo, dispositivos que tem por função
normatizar as práticas em saúde, como, por exemplo,
as ações de ‘controle de contatos’ dos casos índice de
tuberculose em pessoas em situação de rua e em becos
e vielas densamente povoados.
Problematizar a noção de ‘controle’ sobre sujeitos deve
repercutir em um esforço de ressignificação de práticas
nestes espaços. As noções de família e domicílio foram
repensadas perante desafios, como no caso dos sujeitos
em situação de rua, assim como em relação as extre-
mamente precárias condições de muitas moradias em
favelas.A vulnerabilidade, por si só, não necessariamen-
te legitima outras políticas de proteção social para es-
ses mesmos sujeitos por parte do Estado. Ao contrário,
como nos explica a autora, a vulnerabilidade produzida
num nexo marcado pela exposição a doenças infeccio-
sas tidas como evitáveis, evidencia como a saúde, es-
tando para além dos corpos, suas fronteiras, terapias e
formas de controlo, está em relação com as estruturas
de desigualdade e com políticas, sociais, económicas,
culturais e biomédicas, que produzem a precariedade
e vulnerabilização enquanto ontologia primeva da ne-
gligência. Fazer justiça ao fôlego empírico a analítico
que a obra de Roberta Gondim nos empresta, implica
repensar um paradigma de saúde coletiva em que esta
se configura como prática situada de luta política e en-
quanto uma gramática capaz de dar corpo a renovadas
aspirações por dignidade.
Bibliografia
1. Biehl, João. (2005)
Vita: life in a zone of social abandonment
. London, England.
University of California Press.
2. ________. (2007)Will to Live: AIDS Therapies and the Politics of Survival.
Princeton: Princeton University Press. 478p.
3. Dussel, Enrique. (1994).
“1492- El encubrimiento del outro: hacia a la origen
del mito de la modernidade”
. Colección Academia. Nº1. Faculdad de Humanidades y
Ciencias de la Educación. Plural Editores. La Paz.
4. Kleinman,Arthur (1992). “Pain and Resistance: the Delegitimation and Rele-
gitimation of LocalWorlds. “
in
Mary-Jo Good; Paul Brodwin; Byron Good;Arthur
Kleinman (orgs.),
Pain as Human Experience: An Anthropological Perspective.
Berkeley:
University of California Press.
5. Latour, Bruno. (1994).
Jamais Fomos Modernos: Ensaio de Antropologia Simétrica
.
Rio de Janeiro: Editora 34.
6. ________. (2010) [1999]
Em defesa da Sociedade. Curso no College de France
1975-1976.
2ª Edição. São Paulo: Martins Fontes.
7. Mol, Annemarie. (2002).
The body multiple – ontology in medical practice.
Durham and London: Duke University Press.
8. Nguyen, Vinh-Kim. (2010).
The Republic of Therapy – triage and sovereignty in
West Africa’s time of AIDS.
Durham and London: Duke University Press.
9. Nunes, J.A., et al., (2014) Taking part: Engaging knowledge on health in cli-
nical encounters.
Social Science & Medicine
. 123, 194-201.
10. Quijano,Anibal (2010).
Colonialidade do poder e classificação social
.
In: Santos, B.S;
Meneses, M.P. (Orgs.) Epistemologias do Sul. São Paulo: Cortez Editora. p. 84-130.
11. Santos, B.S.S. (2014).
Epistemologies of the South: Justice Against Epistemicide.
.
Boulder: Paradigm Publishers.
12. ________. (2008)
Nascimento da Biopolítica: curso dado no College de France
1978-1979.
São Paulo: Martins Fontes.
13. Oliveira, Roberta Gondim. (2016). Tese de Doutoramento:
Doenças, corpos e
territórios negligenciados - práticas de saúde sobre a tuberculose em espaços e pessoas vulnera-
bilizadas
. Universidade de Coimbra. Edição da autora: Coimbra.